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Sindicato busca força no passado para manter futuro da Ford

Os líderes metalúrgicos do ABC recorreram ao passado, ontem, para tentar dar mais intensidade ao protesto contra o fechamento da Ford em São Bernardo do Campo (SP). Dirigentes sindicais das décadas de 80, 90 e início dos anos 2000 se revezaram nos discursos durante assembleia na porta da fábrica, no início da manhã. Os operários decidiram só retomar o trabalho depois do dia 7, data marcada para uma reunião entre os sindicalistas brasileiros e representantes da direção mundial da companhia, em Dearborn, Michigan.

Unidos sob chuva, que ficou mais intensa às 7h, horário de entrada do único turno, sindicalistas se espremiam em cima do carro de som. Prometeram empenho para reverter a decisão da montadora, que há uma semana anunciou o fim da produção de caminhões e do automóvel Fiesta, o que significa o fim das atividades daquela fábrica.

Sindicalistas e trabalhadores rezaram um Pai Nosso e mais de um orador colocou a decisão da Ford na lista de tragédias que assolaram o país desde o início do ano, citando o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, e o incêndio que matou jogadores no alojamento do Flamengo, no Rio.

Saudoso, o ex-prefeito de São Bernardo do Campo e ex-ministro do Trabalho, Luiz Marinho, lembrou da bem-sucedida viagem que fez aos Estados Unidos, há 20 anos, para pedir à direção mundial da Ford a suspensão das 2,8 mil demissões que a direção local havia anunciado, por telegrama, na véspera do Natal de 1998. Alguns trabalham na fábrica até hoje.

As lembranças de Marinho deram esperança aos trabalhadores. O número de empregos salvos naquela ocasião - que na época equivalia a cerca de 40% do efetivo da fábrica - é a exata quantidade de todos os funcionários diretos que agora correm o risco de perder o emprego, além de outros 1,5 mil que trabalham em empresas terceirizadas dentro da montadora.

O deputado federal Vicente Paulo da Silva (PT) aproveitou o microfone para condenar a reforma previdenciária e Marinho, que disputou a última eleição ao governo de São Paulo, criticou a postura do governador, João Doria (PSDB), que, segundo ele, comportou-se como "corretor imobiliário" ao propor ajuda para vender a fábrica da Ford. À tarde, Doria anunciou que já tem dois interessados em adquirir o imóvel.

Grande parte dos trabalhadores vestia a camisa do uniforme, azul, e vários foram acompanhados da família. "Isso aqui é o nosso sustento", disse Ricardo de Barros, que levou a esposa, Renata, que está desempregada, e o filho, Rafael, de dez anos. Barros começou a trabalhar na Ford um ano antes de Rafael nascer.

Um orador citou poema do alemão Bertolt Brecht e vários outros apontaram a gestão do presidente da Ford América do Sul, Lyle Watters, como responsável pelo fracasso de eventuais planos para atrair o investimento que a fábrica precisava para não fechar as portas.

A ausência de Luiz Inácio Lula da Silva foi destacada nos discursos dos que disseram ter plena certeza de que seu antigo líder ali estaria, ontem, se não estivesse preso em Curitiba.

Por volta das 9h, os trabalhadores saíram em passeata, da fábrica, localizada no bairro de Rudge Ramos, até o Paço Municipal, no centro da cidade. Inicialmente, a caminhada seria pela via Anchieta, rodovia que liga a capital ao litoral. Mas os organizadores optaram por seguir pelos bairros onde há concentração de lojas, padarias e outros serviços.

Três caminhões de som se misturaram às fileiras dos trabalhadores, que levavam capas de chuva e cartazes distribuídos pelo sindicato. Nos discursos nos carros de som, os sindicalistas apontaram o impacto da decisão da Ford no comércio e todo o entorno. Ao passar por um posto, houve até quem calculasse e anunciasse, ao microfone, o número de litros de combustível vendidos no bairro só por conta da Ford.

Duas horas depois, a chuva cedeu lugar ao sol e ao calor. A passeata foi se dispersando e muitos desistiram, pelo caminho, antes de chegar ao fim do trajeto, de mais de sete quilômetros.

Segundo os dirigentes do movimento, a partir de hoje os empregados farão manifestações internas na fábrica. Amanhã eles voltarão a reunir-se no sindicato. A entidade também iniciou uma campanha, por meio das redes sociais, para que as pessoas deixem de comprar carros da Ford.

Veículo: Valor Econômico

Seção: Empresas



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