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Culpar licenciamento 'virou lenda', diz especialista

Tornou-se hábito culpar a legislação ambiental e o rito do licenciamento para qualquer falha no processo de uma obra - da falta de recursos financeiros a estudos de impacto ambiental mal feitos ou pesquisa deficiente sobre a situação legal do terreno. "Virou lenda", resume o advogado Fabio Feldmann, que foi responsável pelo capítulo dedicado ao meio ambiente da Constituição e é reconhecido pela sua contribuição à legislação ambiental brasileira.

Durante seminário realizado ontem em São Paulo pelo Ministério do Turismo e pelos jornais "O Globo" e Valor, Vinicius Lummertz, ministro do Turismo, disse que o modelo atual de licenciamento ambiental trava investimentos porque os prazos são extensos e afugentam o investidor (leia acima). O licenciamento ambiental lento seria um dos motivos do tímido crescimento do setor este ano, estimado em apenas 3%, segundo a pasta. 

"Fazer avaliação ambiental é praticamente universal hoje. O que chamamos de Estudo de Impacto Ambiental é algo que surgiu nos Estados Unidos na década de 70 e hoje é adotado em todos os países", diz Feldmann, lembrando que há inúmeros empreendimentos na costa americana sendo discutidos no Judiciário dos EUA. "Qualquer investidor que vá fazer um empreendimento com significativo impacto ambiental tem que fazer uma avaliação. Isso não é uma trava brasileira", rebate.

Os prazos do processo, continua, dependem do empreendimento. Feldmann defende a ideia de que representantes do Ministério Público estadual e federal acompanhem os processos desde o início e em todas as etapas, para evitar judicialização posterior.

"Vários estudos e a própria prática de órgãos ambientais apontam que eventuais demoras no licenciamento são geradas pela deficiência dos estudos técnicos apresentados pelos empreendedores e pela absoluta falta de estrutura, recursos humanos e financeiros dos órgãos", diz Maurício Guetta, advogado do Instituto Socioambiental (ISA) e especialista no tema. "Corrigindo isso muitos problemas se resolveriam. Mas parece que não há vontade política."

"Temos que ter um processo rigoroso, não podemos abrir mão disso. Não quer dizer que não vamos ter investimentos, resorts, turismo, agricultura, energia", diz o engenheiro agrônomo Luis Fernando Guedes Pinto, gerente do Imaflora. Ele lembra que burocracia e ineficiência são realidades do Estado brasileiro. "O problema é que usa-se este argumento para pedir menor rigor da lei", continua. "Ter leis com menos rigor e menos qualidade significa não proteger interesses da sociedade." 

Guedes Pinto assinala outra contradição deste raciocínio. "Um processo ambiental bem feito olha no longo prazo. O que adianta ter o litoral cheio de investimentos de turismo lançando esgotos ou detonando a floresta? Em 20 anos ninguém vai querer mais ir para lá. O turismo depende da natureza." 

"Muitos empreendedores compram áreas sem pesquisar sua situação legal. Compram áreas com manguezais e depois querem aterrá-los, e aí reclamam da legislação", diz uma fonte. "Às vezes o empreendedor tem até interesse que o projeto demore porque precisa de tempo para conseguir recursos e aí faz estudos de impacto incompletos", diz outra fonte. 

A maioria dos empreendimentos turísticos é licenciada pelos órgãos estaduais. Na costa, esbarram em legislações restritivas como a Lei da Mata Atlântica (que é muito exigente porque restou pouco do bioma), o Código Florestal ou a lei de ocupação da zona costeira. Empreendimentos turísticos podem ter grande impacto no consumo de água ou gestão de lixo.

Veículo: Valor Econômico

Seção: Empresas



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