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A mediocridade do crescimento de 95 a 2016

Veículo: Valor

Por Antonio Delfim Netto

Os números preliminares do Comitê de Datação dos Ciclos Econômicos (Codace) da Fundação Getulio Vargas, sugerem que a grande recessão que vivemos teve início no segundo trimestre de 2014 e terminou no quarto trimestre de 2016. Durou 11 trimestres. Produziu uma queda acumulada do PIB da ordem de 9%. Tratou-se de um ciclo absolutamente autóctone, produzido por uma política econômica voluntarista a partir de 2012, como se vê na tabela 1 abaixo. Como é evidente, a comparação do comportamento de uma economia tem que ser referenciada à conjuntura real da economia mundial em que ela esteve inserida. No período registramos uma taxa de crescimento 15 vezes menor do que a de nossos companheiros (emergentes + em desenvolvimento) e 5 vezes menor do que as economias avançadas.

Mais trágica foi a "variabilidade": 61 vezes maior do que a dos emergentes e 40 vezes maior do que as economias avançadas. Se chamarmos o retrato de caótico não estaremos exagerando. O que surpreende é assistir ao espetáculo da oposição no Congresso. Cega pela paixão ideológica, recusa a aritmética em favor da "lógica do grito" e atribui tal tragédia à administração de Temer. Ela deixará sua marca registrada no resultado da mais pobre e irresponsável CPI já feita no Congresso, onde se "provou" que a Previdência é "superavitária"!

Como se saíram os governos FHC e Lula na mesma perspectiva? Comecemos pela administração de FHC, de 1995 a 2002. A tabela abaixo, a revela.

Vê-se que a coisa não foi muito melhor do estrito ponto de vista do crescimento, que é o que interessa no longo prazo, porque é a condição necessária (ainda que não suficiente), para aumentar a inclusão social. Nosso crescimento foi cerca de metade dos emergentes e sua volatilidade 2,5 maior. É preciso alguma boa vontade para ver nisso uma grande virtude. Noutras dimensões (na inflação e numa certa ordem fiscal) há o que dizer sobre ela. A administração Lula (2003-2010) está retratada na tabela 3 abaixo.

Vê-se que, em matéria de crescimento econômico, a situação efetivamente melhorou. É certo que Lula se beneficiou: 1) da organização produzida por FHC (até a saída do ministro Palocci a política econômica foi a mesma); e 2) da rápida melhoria das relações de troca que ele soube aplicar em medidas de inclusão social. Quando comparado com a evolução das outras economias o resultado empalidece. O quadro geral dos últimos 20 anos é desolador No governo Lula, o Brasil cresceu a uma taxa anual 70% maior do que no governo FHC, mas, se comparada com o crescimento dos emergentes, a situação se inverte: crescemos 40% a menos com mais que o dobro da variabilidade! Isso continua a garantir-lhe uma sólida aprovação por parte do eleitorado que recebeu os benefícios. Não há nada de surpreendente nisso, uma vez que o eleitor não percebe que nas mesmas circunstâncias uma política econômica mais adequada talvez pudesse ter melhorado muito mais a sua situação.

O quadro geral dos últimos 20 anos é desolador. O Plano Real e a melhoria institucional promovida por FHC foram bemsucedidos no controle da inflação, mas a taxa de crescimento do PIB (que no longo prazo é o que importa à sociedade) ficou muito aquém da dos outros emergentes, como se vê no quadro 4 abaixo. Crescemos a uma taxa 50% menor do que os outros emergentes, com uma volatilidade 3,5 vezes maior! No período, o Brasil cresceu apenas 46% do crescimento dos emergentes. Duas décadas de resultados tão medíocres estão a exigir uma profunda reflexão sobre as políticas econômica e social e sugerem a formulação de um sério projeto do que queremos ser em 2040. Se não acertarmos na eleição de 2018, talvez nunca mais nos livremos da armadilha em que fomos metidos.

Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras E-mail: ideias.consult@uol.com.br



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