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Economia não reage como o esperado, dizem especialistas

Veículo: Estadão
Seção: Economia

Não fosse o agronegócio, que supera as melhores expectativas, não haveria muito o que comemorar na economia neste início de ano, segundo os economistas. O setor de serviços segue caindo, o varejo não reage e a indústria esboça recuperação abaixo do esperado. As últimas semanas ainda foram marcadas pelo governo revisando, para pior, as contas públicas. Anunciou um contingenciamento de R$ 42 bilhões para manter o rombo de R$ 139 bilhões neste ano. Também elevou a previsão de déficit em 2018, de R$ 79 bilhões para R$ 129 bilhões. 

O economista Nelson Marconi reuniu dados de indústria, varejo e serviços, retirou as oscilações ao longo do tempo (os chamados efeitos sazonais) e concluiu: “Não dá nem para dizer que há recuperação, mas uma estabilização num patamar baixo: estamos andando de lado no fundo do poço e, olhando para a frente, não há nada no cenário que mude isso”, diz ele.

Na verdade, na semana passada, o cenário mudou um pouco, mas para pior. O Placar da Previdência do Estadão mostrou que a reforma previdenciária, carro-chefe do ajuste fiscal, hoje não seria aprovada no Congresso. “O mercado viu que há um ‘gap’ entre a expectativa e a realidade política: o humor piorou e a vamos ter de ir corrigindo as projeções”, diz Evandro Buccini, economista-chefe da gestora de recursos Rio Bravo. 

Para Mônica de Bolle, economista e pesquisadora do Instituto Peterson de Economia Internacional e colunista do Estado, o Brasil vai crescer zero em 2017, sinal claro de que o País carece de ajustes de curto prazo. “O governo nunca fez ajuste de curto prazo, pelo contrário, até gastou mais e cobriu com o dinheiro da repatriação: o problema fiscal continua ali”, diz.

Para Mônica, o governo não poderia ter dado reajustes salariais aos servidores e já deveria ter cortado todas as desonerações. “Houve erro de cálculo e Fernando Henrique Cardoso tem uma frase para definir isso: ‘Todo mundo entra no governo achando que é dono do seu destino’, mas não é assim na prática”, diz ela. 

Agronegócio. No espectro de projeções, na ponta otimista está a MB Associados, empresa de análise econômica, que projeta 1% de crescimento em 2017, com altas em todos os trimestres. “Estamos, sim, no topo das projeções, no lado mais otimista”, diz José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e sócio da MB.

A MB leva em consideração um setor estratégico que chama a atenção de todos os analistas neste início de ano: o agronegócio. “Os sinais da recuperação, claramente, não estão nos números que já saíram dos centros urbanos, mas na safra agrícola e em suas consequências”, diz Mendonça de Barros. 

Segundo o economista, os dados já disponíveis mostram que a safra será muito maior do que se previu e ainda terá uma produtividade excepcional. “Seus efeitos positivos estão acontecendo no interior e se misturam a bons resultados já divulgados de alguns setores, como o químico e o de máquinas e equipamentos, e vai aparecer na balança comercial de março, pois as exportação agrícolas podem crescer até 20%, mesmo com o problema da carne”, diz ele. 

Mendonça de Barros tem também uma lista de evidências de melhoras que já teriam ocorrido em março, mas que ainda não foram oficialmente retratadas nos dados: recuperação na venda de carros, redução no estoque de imóveis, recuperação no setor de supermercados e indicações claras de descompressão de crédito, com a redução do endividamento das famílias e das empresas. 

Inflação. O andar vagaroso da economia no início de ano não surpreende Alberto Ramos, diretor do Grupo de Pesquisas Econômicas para América Latina do banco americano Goldman Sachs. “Os números do primeiro trimestre estão vindo fracos, mas não dá para dizer que é uma decepção porque estão em linha com a nossa visão de que a retomada será bem lenta”, diz.

Na avaliação dele, o Brasil precisa aproveitar o momento para avançar em outro terreno: reduzir a inflação. “Muita gente vem perguntando qual é o risco de a inflação do Brasil ficar abaixo da meta, oras, a meta é alta, o País está em recessão há três anos, vive um choque positivo de preço nos alimentos e o desemprego foi a 13%: por favor, entreguem uma inflação abaixo da meta, pois 3,5% é muito melhor que 4,5%”, diz Ramos.

Sinais mistos. Para se ter uma ideia da gravidade da situação da economia brasileira, avaliar o nível de “recuperação” implica fazer um a discussão sobre pontos porcentuais. Os economistas Paulo Coutinho e Leonardo Fonseca, do banco de investimento Credit Suisse, por exemplo, preveem que o Produtor Interno Bruto (PIB) pode crescer 0,3% no primeiro trimestre de 2017. 

“Os sinais de recuperação são mistos”, diz Coutinho. A produção e a venda de veículos reagiram e a agricultura surpreende com previsões consecutivas de alta. No extremo oposto estão o fraco desempenho do varejo e a retração renitente dos serviços, mais forte do que se imaginava. O alívio para as famílias vem da queda da inflação, avalia Fonseca, pois, por tabela, ela eleva o poder de compra.



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