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Investimento e incerteza

Veículo: Estadão
Seção: Opnião

O governo terá de ser mais ágil e mais eficiente, na política de infraestrutura, se quiser fazer do investimento um fator importante para a reativação econômica neste ano e no próximo. A liderança do setor público é especialmente importante, neste momento. Pelo menos dois obstáculos dificultam o envolvimento do empresário privado em projetos de expansão da capacidade produtiva. A maior parte das companhias, principalmente do setor industrial, continua funcionando com ampla capacidade ociosa. Sem expectativa mais firme de ampliação dos negócios num prazo razoável, dificilmente os dirigentes de empresas comprometerão capital em máquinas, equipamentos e instalações. O outro fator é a insegurança, vinculada principalmente a fatores políticos. Um cenário mais claro facilitaria as decisões. Nem tudo depende do presidente Michel Temer e de sua equipe, mas o pessoal do Executivo e seus aliados poderiam, com certeza, fazer mais do que têm feito para facilitar as aplicações em capital fixo.

Por enquanto, os indicadores são pouco claros, apesar de alguns sinais de melhora da atividade industrial. O investimento voltou a recuar em janeiro, segundo o indicador de formação bruta de capital fixo preparado por técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Esse indicador ficou 3% abaixo do nível de dezembro. Em relação a janeiro de 2016, a queda foi de 4,9%. No caso de crescimento nulo em fevereiro e março, o primeiro trimestre será encerrado com queda de 1,9% em relação aos três meses finais de 2016.

Pelo menos um componente do indicador do Ipea, a construção civil, avançou em janeiro, com ganho de 0,6% em relação a dezembro. O outro componente, o consumo aparente de bens de capital (máquinas e equipamentos), caiu 6,6%, depois de uma alta de 2,6% no mês anterior. Para construir esse item, somam-se a produção nacional e a importação de máquinas e equipamentos e subtrai-se a exportação.

Critérios diferentes são usados na construção das séries do Ipea e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o Ipea, a produção interna de bens de capital foi em janeiro 6,6% menor que em dezembro. Segundo o último relatório do IBGE, a queda foi de 4,1%. A mesma fonte, no entanto, apresentou um dado animador nesse levantamento: a produção de janeiro foi 3,3% maior que a de um ano antes. Essa comparação foi positiva para todos os grandes grupos de produtos – bens de capital, intermediários e de consumo, tanto duráveis quanto não duráveis. A indústria geral, de acordo com esse conjunto de números, produziu 1,4% mais que em janeiro de 2016.

Se esses dados apontarem uma tendência, a retomada do investimento poderá ganhar impulso nos próximos meses. O esforço inicial será, provavelmente, para reposição de bens de capital desgastados ou muito desatualizados. Depois virá o investimento destinado propriamente à expansão de capacidade – se a demanda de consumo se firmar. Por enquanto, a inflação em queda – com menor corrosão do orçamento familiar – é o principal fator favorável aos gastos domésticos.

No lado positivo inclui-se também a última sondagem de investimentos da Fundação Getúlio Vargas (FGV). O indicador da intenção de investimentos da indústria subiu neste trimestre e atingiu pela primeira vez em dois anos o nível 100, saindo da área negativa para a linha de indiferença. Pode parecer pouco, mas é uma alteração muito promissora, depois de uma longa retração do gasto destinado à expansão, ou mesmo à manutenção, da capacidade produtiva.

O relatório do Ipea, no entanto, reacende o alerta. Não está claro, apesar dos dados positivos, se os sinais de reativação antecipam um firme avanço nos próximos meses, com espaço para retomada do investimento. Mais que isso: só com o consumo, isto é, sem a contribuição do investimento, a recuperação será provavelmente muito lenta. Sem dinheiro para gastar, o governo poderá contribuir, no entanto, apressando as concessões e mobilizando capital privado para projetos de infraestrutura.



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