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Mercado erra muito na inflação

Veículo: Folha 

Seção: Coluna do Vinicius Torres Freire

AS PREVISÕES de inflação dos economistas do dito mercado estavam muito erradas nos últimos seis meses. Um erro de quase o dobro, para cima.

Melhor assim, embora tais erros não saiam de graça. Mais importante, melhor assim porque é possível que os salários voltem a superar a inflação de modo duradouro. Em dezembro, a média nacional dos salários subiu 0,5% acima do IPCA. Pouco, mas inédito desde agosto de 2015.

Desemprego e, em medida muito menor, inflação esperada mais baixa podem conter a alta dos salários nominais, que ganha ritmo desde meados de 2016. Ainda assim, o salário médio agora parece ter mais chances de vencer a inflação nessa corrida.

Quanto aos erros, deixando de lado teorias e o espírito de porco de tripudiar, cabem algumas perguntas práticas sobre as surpresas positivas na inflação.

Quais os motivos principais da baixa inesperada? Vai durar? As expectativas de inflação, que orientam a política de juros do Banco Central, estão ou ainda estarão infladas?

A inflação acumulada no semestre encerrado em janeiro caiu para o nível mais baixo desde 1999. A inflação de alimentos e bebidas baixou de modo drástico. Nos últimos seis meses, foi de apenas 0,2% (ante 6,8% em janeiro de 2016). Nos últimos 12 meses, de 6,6% (ante 12,9% em janeiro do ano passado).

O peso da inflação da comida e bebida na inflação geral (contribuição) foi o menor pelo menos desde 2008 (no acumulado semestral). O tempo melhorou, as colheitas aumentaram e a safra 2016/2017 será excelente, como tanto se ouve dizer.

No entanto, mesmo tirando o IPCA de comida e bebida da conta, o resto da inflação também foi dos menores em quase década.

Quanto da inflação em baixa se deveu à recessão e quanto a um choque positivo (mais comida), por exemplo, é um problema para artigo ou dissertação acadêmicos. Ainda assim, resta uma questão muito prática, se não grave, dados o tamanho da recessão e a altura estratosférica das taxas de juros. Considere-se um exemplo quase casual do problema.

No começo do segundo semestre de 2016, economistas previam que a inflação acumulada de agosto a este janeiro passado seria de algo mais que 3%. É a mediana das estimativas de economistas de consultorias e bancos, uma centena deles, ouvidos semanalmente pelo Banco Central. A inflação de fato foi de 1,65%.

Os economistas previam que ocorreria essa baixa mais pronunciada do IPCA, durando até meados deste ano. O IPCA então voltaria a subir, fechando o ano muito perto da meta de 4,5%. Mas a baixa tem sido ainda maior. Quanto dessa surpresa é provisória, quanto é efeito mais intenso do que o esperado da recessão horrenda?

Quanto à inflação deste ano, o Banco Central não tem muito o que fazer. No entanto, há agora uma dúvida no mínimo muito razoável sobre o ajuste da mira dos juros para a meta de inflação de 2018.

Para fazer piada com o jargão e algumas crenças exageradas, as expectativas de inflação estão "ancoradas" (confia-se que devam convergir para a meta, em prazo razoável), mas talvez tenham ancorado no raso. Pode ser que o IPCA desça mais fundo, baixe mais do que o previsto. Está acontecendo. Por ora, de modo impressionante. 



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