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Pesquisador prevê reação da atividade no 3º e 4º trimestres

Veículo: Valor Econômico

Apesar de a economia brasileira ter novamente se contraído no segundo trimestre deste ano, os números divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam uma trajetória de recuperação do PIB, segundo avaliação do economista Cláudio Considera, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).

"O terceiro trimestre já vai mostrar alguma reação e o quarto, também. Acho que vamos fechar o ano menos negativos do que em 2015 e apontando para uma evolução positiva em 2017", disse Considera, para quem o investimento (e não o consumo) vai puxar a recuperação da economia brasileira. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: A evolução do PIB no segundo trimestre foi uma surpresa?

Cláudio Considera: O número de -3,8% estava dentro do esperado. A estimativa do Monitor do PIB-FGV era de -3,5%. O número do PIB dessazonalizado [-0,6%, na comparação com o primeiro trimestre] é que está surpreendendo todo mundo. Mas o modelo de dessazonalização é muito instável e tem uma fórmula de cálculo em que, a cada trimestre, a história anterior é recontada. Então, no próximo trimestre nós podemos estar vendo uma melhora em relação a este. As estimativas vão nessa direção. Todo mundo estava esperando um número menos negativo no trimestre contra trimestre do ano anterior. E estão todos corretos.

Valor: Pode-se dizer que há sinais claros de melhora?

Considera: A economia está claramente melhorando. Essa situação na ponta [representada pelo PIB dessazonalizado] deve melhorar, porque é muito forte a redução do trimestre contra trimestre do ano anterior. Deu -3,8% no IBGE, quando estava -5,4% no número anterior. O terceiro trimestre já vai mostrar alguma reação e o quarto, também. Acho que vamos fechar o ano menos negativos do que em 2015 e apontando para uma evolução positiva em 2017.

Valor: No segundo trimestre, houve retração de 2% na atividade do setor agropecuário, em comparação com os três meses anteriores. A situação preocupa?

Considera: A agropecuária sempre surpreende todo mundo. A produção agropecuária é feita progressivamente ao longo do ano. O Levantamento Sistemático da Produção Agrícola, do IBGE, desde o primeiro mês estima qual vai ser a produção do ano. Em janeiro, o levantamento estima a produção até dezembro. Em fevereiro, essa estimativa muda. Ou porque foi melhor o plantio e a germinação das sementes. Ou porque foi pior. Não choveu ou choveu demais. Em março haverá outra estimativa, feita para o ano. E o IBGE distribui a produção ao longo dos meses. A produção agrícola é difícil de ser estimada mês a mês, o que importa é o estimado para o fim do ano. Se ela está melhor num trimestre e pior em outro, não quer dizer que o ano será ruim.

Valor: A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) aquém do esperado?

Considera: Ficou menos negativa neste trimestre do que estava sendo até então. A FBCF e a indústria estão reagindo bem. Na construção, por exemplo, a surpresa é mais para o lado positivo. A construção está surpreendentemente crescendo mais do que se esperava. E mesmo o processo de investimento e a produção de máquinas e equipamentos estão sendo bem razoáveis. A própria importação de máquinas e equipamentos está acontecendo de forma importante. Na importação de máquinas e equipamentos, pretensamente você está importando coisas que não são fabricadas domesticamente e que têm tecnologia mais avançada. Isso já está um pouco na suposição de todo mundo. E todo mundo acha, então, que importar máquinas é um sinal de que a indústria está se modernizando, aumentando sua capacidade de gerar mais produtos. Não acho que a Formação Bruta de Capital Fixo veio menor do que se esperava.

Valor: Qual sua expectativa para 2016?

Considera: [O PIB] vai ser menos negativo do que se esperava e menos negativo do que foi no ano passado. Mas não é crescimento ainda. A economia vai deslanchar na hora em que você, finalmente, mudar o governo, Temer assumir e deslanchar um programa de privatização, concessão, [restabelecendo] a confiança dos empresários para voltar a investir no país. Sem novos investimentos, sem a confiança dos empresários, você não vai recuperar a economia.

Valor: E o consumo, não pode impulsionar essa recuperação?

Considera: Não vai ser pelo lado do consumo. As famílias estão endividadas, as rendas caíram, você tem o desemprego. A massa de salários na economia para a aquisição de bens de consumo é menor. Então, não vai ser via consumo. Vai ser via investimento, que vai fazer com que haja mais emprego, mais salário e dessa forma você volta a consumir. O sinal vai ser a volta dos investimentos e isso eu acho que está acontecendo, mas ainda não na velocidade necessária.

Valor: Mas a taxa de investimento despencou no segundo trimestre.

Considera: Bastante. Estamos dedicando menos PIB para investimento do que se fazia no passado. Mas essa é uma queda que virou uma taxa muito baixa desde a década de 80 e continua baixa. Temos de voltar a investir algo em torno de 24% do PIB para que possamos voltar a ter crescimento. A taxa de investimento é algo importante de ser olhada, mas não vai se recuperar agora, neste instante, enquanto o próprio investimento não se recuperar. É isso que está acontecendo agora. A velocidade não é suficiente para a economia voltar a crescer. É necessário que a gente tenha uma confiança dos empresários sobre qual é a direção da política econômica. Ou seja: menos Estado, mais mercado e mais liberdade de mercado para que os empresários possam investir e saber se vão poder usufruir desse lucro de forma a aumentar o investimento das suas empresas.

Valor: De maneira geral, os indicadores que refletem a expectativa vêm melhorando...

Considera: Muito. Os indicadores da Fundação Getulio Vargas de grau de otimismo, tanto de empresários como de consumidores, estão melhorando. E é espantoso que essa confiança dos consumidores esteja aumentando, porque ainda temos um processo de aumento do desemprego que não se reverteu. O desemprego está ocorrendo agora no setor de serviços.

Valor: Qual sua expectativa com relação às contas externas?

Considera: O que se tem receio é de que haja uma entrada de recursos externos muito forte que volte a valorizar o real, afetando negativamente as exportações e aumentando as importações. A reação do setor externo tem sido via uma brutal redução das importações. Isso tem a ver com o câmbio, mas também com a desaceleração econômica. E as exportações estão melhorando por conta da desvalorização, a despeito de que o mundo não é um mundo demandante. A redução das importações está beneficiando a indústria na medida em que está havendo alguma substituição das importações. Isso não é claro, mas alguns grupos de produtos específicos têm tido essa reação porque está mais caro comprar no exterior. O setor externo está indo numa direção boa. O que tem de haver é cuidado para que não haja uma volta à valorização do real, como no passado.

Valor: Qual seria uma taxa de câmbio razoável para permitir a recuperação do país?

Considera: Uma taxa de R$ 3,20 [por dólar] é uma taxa razoável. Não precisa desvalorizar mais porque vai causar impacto inflacionário, mas se valorizar mais pode atrapalhar essa recuperação do setor externo.



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