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Crise faz prefeitos reduzirem investimento

Veículo: Valor Economico 

Seção: Política 

A um mês do início da campanha eleitoral, a maior parte dos municípios enfrenta um quadro de baixa arrecadação e queda de receitas. Em vez de canteiros de obras e inaugurações, prefeitos revisam planos, cortam investimentos e buscam alternativas para pagar despesas obrigatórias e evitar a inadimplência. O Rio de Janeiro é o ponto fora da curva: graças aos Jogos Olímpicos, aplicou R$ 1,09 bilhão no primeiro quadrimestre deste ano, acima dos R$ 722,59 milhões investidos no mesmo período de 2015. Em relação aos R$ 2,15 bilhões aplicados por 21 capitais, o Rio corresponde a 50,7% do total. O legado de obras da Olimpíada pode beneficiar a candidatura do deputado federal Pedro Paulo (PMDB), aliado do prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB). Os investimentos liquidados cresceram 5,3% na comparação do primeiro quadrimestre de 2015 e 2016 graças ao Rio. Sem a cidade, conforme relatórios de execução orçamentária divulgados pelo Tesouro Nacional, os aportes totais cairiam de um ano para o outro de R$ 1,32 bilhão para R$ 1,05 bilhão, puxados principalmente por São Paulo. 

"Os estádios e o legado olímpico são bastante expressivos no ciclo de investimentos da Prefeitura do Rio no ano passado e neste ano", diz Marco Aurélio Santos Cardoso, secretário de Fazenda da cidade. Segundo ele, as obras relacionadas à Olimpíada representam praticamente a totalidade dos investimentos do município em 2015 e 2016. Dessas obras, os estádios estão sendo construídos com transferência da União e por meio de Parcerias Público­Privadas (PPP), enquanto que as obras de legado são financiadas tanto por repasses federais quanto por operações de crédito e recursos do Tesouro municipal.

Em situação inversa, a capital paulista, onde o prefeito Fernando Haddad (PT) busca a reeleição, os investimentos caíram de R$ 538,1 milhões no primeiro quadrimestre do ano passado para R$ 362,1 milhões no mesmo período deste ano, pelo critério do liquidado. "Em 2016 deveríamos fazer muitas realizações em termos de investimentos porque estamos fechando um ciclo de governo, mas a nossa preocupação é manter a saúde financeira", diz o secretário de Finanças de São Paulo, Rogério Ceron de Oliveira, reconhecendo que os investimentos ficarão em segundo plano nesta reta final do primeiro mandato de Haddad. 

Segundo Oliveira, o município passa por uma queda de receitas e por isso tem contido os gastos, o que afetou os investimentos. O secretário lembra que a arrecadação sofreu queda real de 6% no primeiro quadrimestre. "Temos a expectativa de que o segundo semestre não seja tão ruim quanto o primeiro, mas creio que não conseguiremos fugir de uma queda real de receitas de 5%", estima ele. Além do impacto da arrecadação econômica sobre tributos como ITBI, cobrado na venda de imóveis, e o ISS, sobre serviços, a prefeitura também tem sofrido queda de receitas com repasses do governo estadual e do governo federal. 

"Os repasses federais foram praticamente suspensos". O impacto da retração econômica na receita do município, calcula o secretário, deve chegar a R$ 3 bilhões este ano. No ano passado, foi de R$ 1,5 bilhão. A ideia na contenção de investimentos, diz o secretário paulistano, é manter as obras que estão em andamento e deixar de iniciar novos programas. Os que ficaram no papel, diz ele, são relacionados principalmente à mobilidade urbana, considerada uma das principais bandeiras da gestão petista na capital paulista. No total, 12 das 21 capitais brasileiras com dados disponíveis reduziram os investimentos entre janeiro e abril deste na comparação com a mesma época do ano passado, enquanto oito ampliaram os aportes. Teresina, no Piauí, investiu praticamente o mesmo valor nos dois anos. A desaceleração no ritmo permitiu a algumas prefeituras realocar os recursos para outras áreas e assim compensar a queda de arrecadação. Os gastos com pessoal em relação à recente corrente líquida, por exemplo, aumentaram em 13 das 21 capitais pesquisadas na comparação dos relatórios encerrados em abril. 

A dificuldade em administrar as finanças municipais tem influenciado o quadro eleitoral. O prefeito de Florianópolis, Cesar de Souza Júnior (PSD), desistiu de concorrer à reeleição. Aos correligionários, tem dito que precisa se concentrar na gestão, já que há perspectiva de que a recessão possa se agravar no segundo semestre e por isso não poderia dispender tempo com a campanha. A capital catarinense já ultrapassou o limite máximo, de 54%, da LRF, com 57,4% da RCL, conforme dados do Tesouro Nacional até abril. Com a desistência de Souza Júnior, 21 dos 22 prefeitos de capitais concorrerão à reeleição neste ano. Os investimentos também estão em queda na capital catarinense na comparação entre os quatro primeiros meses deste ano e o mesmo período de 2015. De lá para cá, os aportes recuaram de R$ 21,8 milhões para R$ 19,8 milhões. 

Recife é outra capital cujo investimento também recuou ao passar de R$ 95,9 milhões para R$ 55,3 milhões. O secretário de Finanças da capital pernambucana, Ricardo Dantas, diz que a crise econômica afetou a capacidade de investimento do município. Além disso, lembrou que a cidade, por conta da lei eleitoral e da paralisação do país com o impeachment de Dilma Rousseff, ficou impedida de receber um empréstimo de US$ 220 milhões do Banco Mundial (Bird) que era esperado pela prefeitura desde 2013. Em agosto de 2015 a União suspendeu todas as operações de crédito, retomando as análises apenas no fim do ano. O repasse, contudo, ainda não foi liberado. 

"Entregamos duas grandes obras no início de 2016 com aportes que foram feitos no ano passado. Isso também ajuda a explicar a queda dos investimentos de um ano para o outro", disse Dantas ao citar a Via Mangue, pista expressa que ligará a zona sul ao centro do Recife, que envolveu gastos de R$ 23 milhões, e o Hospital da Mulher, ao custo de cerca de R$ 22 milhões. Segundo o secretário, a prefeitura deve encerrar o ano com R$ 220 milhões de investimentos, abaixo dos R$ 330 milhões investidos em 2015. A falta de recursos impedirá o prefeito recifense, Geraldo Júlio (PSB), que também tenta a reeleição, de concluir a reforma de escolas e entregar as 20 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) prometidas durante a campanha eleitoral de 2012. Sua gestão concluiu até o momento 10 unidades. Em setembro está prevista a entrega de mais uma. "Mesmo com a crise e toda adversidade, chegaremos ao fim do ano com R$ 1,5 bilhão de aportes num universo de quatro anos, o dobro da gestão anterior", afirmou Dantas em relação à administração de João Costa (PT), que governou a capital pernambucana entre 2008 e 2012. 

Na contramão da maioria das capitais, a prefeitura de Salvador também ampliou os aportes na cidade, que cresceram de R$ 23,1 milhões para R$ 54 milhões. O secretário da Fazenda, Paulo Souto, diz que o município tem conseguido atravessar o momento de crise econômica com relativa tranquilidade devido aos ajustes fiscais promovido pelo prefeito ACM Neto (DEM) ao longo dos últimos quatro anos. Neste ano, argumentou Souto, a gestão decidiu contingenciar R$ 1,5 bilhão do orçamento de R$ 6,6 bilhões diante do quadro de incerteza na economia nacional e mundial. 

"Estamos cumprindo com todos os nossos compromissos. Nenhum projeto que iniciamos parou ou desacelerou, apesar da queda da arrecadação", afirmou Souto. ACM Neto tem aproveitado o período de pré­campanha para participar das inaugurações. Na semana passada, entregou a Avenida 2 de Julho, nova via de ligação entre os bairros de Cajazeiras, Águas Claras e Valéria com a BR­324. Com investimentos de R$ 60 milhões, a obra é considerada uma das maiores de Salvador em termos de mobilidade urbana. 

Apesar da melhora no início de 2016, o secretário estima que os investimentos totais neste ano devem totalizar cerca de R$ 20 milhões acima dos R$ 334 milhões investidos em 2015. Segundo ele, 95% desses recursos são da própria prefeitura. "Por isso defendemos que o governo federal compense aqueles municípios que fizeram sua parte, com um ajuste fiscal forte, e aprove a contratação das operações de crédito, além de garantir a preferências a essas cidades nas transferências federais. Temos projetos para isso", disse. Souto ressaltou que as principais transferências a Salvador tiveram uma queda neste ano, em termos nominais, de 10%, enquanto a receita tributária caiu em torno de 4,5%. 



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