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Fazenda diz que retirou a 'fantasia' da estimativa de receita

Veículo: Valor Economico

Seção: Brasil 

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, acha que o Brasil se acostumou com maus hábitos na área fiscal, nos últimos anos. Passou a ser prática usual considerar nas estimativas de receitas e despesas medidas que não se realizam ou propostas que ainda não foram aprovadas pelo Congresso Nacional. O resultado é que o governo termina sendo obrigado a ajustar a meta fiscal ao longo do ano, o que contribui para desacreditar a política econômica. 

Meirelles quer romper com essa prática. Ele deseja trabalhar com uma meta fiscal realista, que não precise ser alterada ao longo do ano e que o mercado acredite ser possível alcançar. Para isso, ele orientou sua equipe a não incluir em suas estimativas de receita aquelas que decorram de medidas legislativas ainda não aprovadas ou que dependam de fatores de mercado alheios ao controle do governo. 

A estimativa de arrecadação de R$ 13,6 bilhões com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) para este ano, por exemplo, foi excluída. "Ninguém tem segurança de que a CPMF possa ser aprovada para ser cobrada ainda em 2016", explicou um integrante da nova equipe. "Então, essa receita foi excluída". É uma mudança metodológica que explica, em boa parte, o déficit primário recorde do governo federal de R$ 170,5 bilhões projetado para este ano. 

Na última projeção de receita apresentada pela equipe econômica da presidente afastada Dilma Rousseff constava, por exemplo, o valor de R$ 30,8 bilhões a ser obtido com a venda de ativos. "Não há nada em processo de venda que indique ser possível obter um valor dessa magnitude", informou o mesmo assessor. Por isso, o Ministério da Fazenda decidiu reduzir a previsão para R$ 2,9 bilhões, que é um valor próximo do que se obteve nos últimos anos. 

Outra receita retirada da nova previsão foi a que seria obtida com a abertura de capital da Caixa Seguridade e da resseguradora IRB. "Na situação atual do mercado, essas operações são viáveis mesmo?", questiona o assessor. "A que preço serão feitas?". O governo prefere agora adotar uma postura mais conservadora para não criar expectativas que não se confirmem. 

A equipe econômica anterior previa obter uma a receita de R$ 31 bilhões com concessões de serviços públicos neste ano. "Qual é a possibilidade realista de que isso venha a acontecer?", perguntou a fonte. "Algumas empresas estão, no momento, em dificuldades até de pagar a parcela das concessões de aeroportos já realizadas", lembrou. "Temos que tirar a fantasia das previsões". Assim, a estimativa de receita com concessões foi reduzida para R$ 23,7 bilhões. 

O uso de parâmetros macroeconômicos mais realistas, próximos daqueles com os quais o mercado trabalha, também explica a redução na estimativa deste ano para as receitas. Antes, o governo estimava uma queda de 3,1% da atividade econômica. Agora, prevê uma retração de 3,8%, praticamente a mesma que o mercado, de acordo como o boletim Focus, editado pelo Banco Central. A inflação estimada para 2016 foi reduzida de 7,4% para 7% e a taxa média de câmbio de R$ 4,2 por dólar para R$ 3,7 por dólar. 

A projeção da receita na lei orçamentária deste ano foi feita com base em um crescimento nominal superior a 16%, na comparação com a receita realizada em 2015. Um acréscimo real, portanto, superior a 5%. Com a mudança de parâmetros macroeconômicos e com a decisão de Meirelles de não considerar na estimativa as medidas que dependem de aprovação do Congresso, a previsão de receita para 2016 passou a apresentar uma queda real de 4% na comparação com a realizada no ano passado. Essa estimativa pode ser otimista, pois nos primeiros quatro meses, a queda real foi de 7,9%.

Houve uma redução de R$ 165 bilhões da nova estimativa da receita para este ano, na comparação com a arrecadação total que consta do Orçamento. Em termos líquidos (deduzidas as transferências constitucionais e legais para Estados e municípios), a equipe de Meirelles diminuiu em R$ 107,8 bilhões a estimativa de receita da União na comparação com o relatório do primeiro bimestre, divulgado no fim de março. Só a previsão de receita com o Imposto de Renda caiu R$ 27,6 bilhões e da Cofins, R$ 8,9 bilhões. 

As despesas obrigatórias previstas para este ano, por sua vez, foram elevadas em R$ 30 bilhões, na comparação com a estimativa feita no relatório do primeiro bimestre. Haverá aumento de R$ 6,8 bilhões com benefícios previdenciários, acréscimo de R$ 3,5 bilhões no pagamento de pessoal, R$ 2,8 bilhões com assistência social (LOAS e RMV) e mais R$ 1,95 bilhão de compensação aos Estados pela Lei Kandir, entre outras despesas. A equipe de Meirelles adotou para os gastos o mesmo critério utilizado para as receitas. Não considerou as medidas de redução da despesa que dependem de aprovação do Congresso. Assim, incluiu uma despesa de R$ 12 bilhões que não ocorreria se um projeto de lei alterando o pagamento de precatórios federais for aprovado. 

Além disso, o governo reservou R$ 9 bilhões para pagar as obras já concluídas e medidas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), R$ 3,5 bilhões para pagar dívidas em atraso de compras realizadas pelo Ministério da Defesa e R$ 3 bilhões para ações na área da Saúde. Reservou até R$ 19,9 bilhões para o gasto líquido com o custo da renegociação das dívidas dos Estados e reverteu um contingenciamento de R$ 21,2 bilhões que tinha sido feito em março, mas para ser eliminado quando a meta fiscal fosse revista. Com tudo isso, o déficit primário chegou a R$ 170,5 bilhões ou 2,75% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado. 

 



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