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Experiência global mostra foco na inflação

Veículo: Valor

Seção: Economia

A independência formal do Banco Central entrou na agenda do vice-presidente, Michel Temer, incluindo outros objetivos para a autoridade monetária além do controle da inflação, provavelmente o pleno emprego e a estabilidade financeira. A ideia não é exatamente nova, pois existe uma proposta de emenda constitucional do PMDB em tramitação no Senado, que tem a simpatia do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Seu principal autor é o senador Romero Jucá (PMDB-RR), homem de confiança de Temer que está cotado para ser ministro do Planejamento. Levantamento da experiência internacional mostra que, em geral, os bancos centrais dos países desenvolvidos têm mais de um objetivo, mas eles costumam eleger um como principal. Quando isso ocorre, o controle da inflação costuma ganhar primazia.

A lógica é evitar conflitos que surgem quando o BC se defronta com objetivos concorrentes. O combate a uma inflação muito alta, como ocorre hoje no Brasil, exige uma dose de desemprego pelo menos temporária, deixando o objetivo do pleno emprego em segundo plano. Exceto nas discussões mais teóricas sobre temas como o uso de juros para esvaziar bolhas financeiras, economistas não costumam identificar conflitos em bancos centrais que têm os objetivos de controlar a inflação e manter a estabilidade financeira. Haveria instrumentos para perseguir ambos os objetivos. Nesse caso, a taxa de juro e outros instrumentos de política monetária seriam voltados apenas para controlar a inflação. Medidas regulatórias, como as chamadas macroprudenciais, cuidariam da saúde do sistema financeiro. O caso mais lembrado de BC com vários objetivos é o Federal Reserve (Fed), dos Estados Unidos.

A lei que criou a instituição atribui a ele a função de buscar "o máximo emprego, estabilidade de preços e juros de longo prazos moderados". Lá, porém, funciona a chamada independência de objetivos. O Fed decide qual objetivo priorizar a cada momento. Na prática, a escolha tem sido manter a inflação baixa e estável. Desde a crise de 2008, porém, o desemprego nos Estados Unidos tem sido muito alto, e a inflação, muito baixa. Isso permite que o Fed mire ambos os objetivos.

O Tratado de Maastricht, que levou à criação da zona do euro, estabelece como principal objetivo do Banco Central Europeu (BCE) o controle da inflação. Mas diz que, sem prejuízo da estabilidade de preços, o BCE deve apoiar a política econômica da União Europeia. Ou seja, ao contrário do Fed, o BCE tem seu objetivo central definido num tratado. O BCE tem independência apenas para estabelecer a meta (inflação menor que 2%) e para usar instrumentos monetários para cumprila. No Japão, a lei do seu banco central diz que a política monetária tem "como objetivo atingir a estabilidade de preços, dessa forma contribuindo para o sólido desenvolvimento da economia nacional". Ou seja, a própria lei indica que o controle da inflação é o objetivo principal.

Algo parecido ocorre no Banco da Inglaterra, que tem como mandato a estabilidade de preços. Subordinado a isso, apoia a política econômica do governo, incluindo crescimento e emprego. Na Inglaterra, o BC tem apenas a chamada autonomia de instrumentos, ou seja, pode livremente subir ou baixar os juros para atingir uma meta de inflação que é fixada pelo governo.

Esse é um modelo parecido com o vigente no Brasil, exceto pelo fato de que, aqui, o BC não é independente. No Brasil, a independência do BC é muitas vezes tratada como algo diferente de autonomia, mas em outros países as duas palavras são usadas sem distinção. Por aqui, autonomia soa como um termo mais suave, que indica que o BC tem que prestar contas e não é um ser independente e senhor absoluto de seus atos. Mas BCs com esses superpoderes são raros ou não existem, já que a regra é o BC prestar contas.

Autoridades dos governos Lula e Dilma usaram muito o termo "autonomia operacional"para indicar uma situação em que o BC teria independência de fato para manejar os juros, e não em lei. O mercado sempre duvidou dessa independência informal.



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