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Crise não abala avanços no mercado de trabalho, diz brasilianista

Veículo: Folha de São Paulo 

Seção: Poder 

O professor de ciência política Ben Ross Schneider, diretor do Programa de Estudos do Brasil do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), defende que os avanços conquistados pelo país ao longo das últimas três décadas não se perdem completamente com a atual crise.

Schneider é organizador do recém-lançado "New Order and Progress: Development and Democracy in Brazil" (Nova ordem e progresso: Desenvolvimento e Democracia no Brasil), livro que reúne trabalhos de pesquisadores brasileiros e estrangeiros. Leia a entrevista a seguir.

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Folha - Seu livro fala em ordem e progresso em meio a uma forte crise. Como ele se relaciona ao atual momento?

Ben Ross Schneider - O livro surge como uma resposta a uma série de obras publicadas a respeito do "boom" do Brasil, sobre o "Brasil decolando" –o que se tornou uma lembrança distante. A ideia era fazer uma análise histórica, de longo prazo e comparativa, para entender a trajetória do país, mostrando transformações que vão além das partes mais visíveis em termos de economia.

Queríamos olhar por baixo do capô e entender o motor que estava fazendo a política e a economia do Brasil funcionarem. Isso nos levou a ver uma menor discriminação no mercado de trabalho, um crescimento da classe média, um maior desenvolvimento em outros Estados do país. São mudanças de longo prazo que vão ser retomadas após o fim da atual crise. Precisamos ver essas mudanças além de dados sobre crescimento ou recessão.

Há espaço para otimismo?

Sim. O livro foi finalizado antes de o Brasil se afundar na crise. Estávamos em 2014 e víamos apenas o começo dela. As razões para otimismo vêm da análise das instituições brasileiras. A ideia de que as instituições da democracia no Brasil estão funcionando muito bem mesmo em meio à crise.

Pessoas ligadas ao governo reclamam de uma suposta partidarização do Judiciário. O que o sr. acha disso?

Acredito que todo o processo vá ser revisto e avaliado pelo Supremo Tribunal Federal, que é o padrão de como o Judiciário deve funcionar. Se há excessos por uma corte menor, há uma avaliação de uma corte mais alta. Esse processo é o que deve existir.

A mídia também está sendo criticada como sendo partidária. O que o sr. acha?

Não posso avaliar o alinhamento político da imprensa como um todo, mas acho que a mídia tem feito um bom trabalho em denunciar casos de corrupção. Esse trabalho é muito importante.

O PMDB abandonou a coalizão do governo. Isso afeta o funcionamento da democracia?

O Brasil tem esse sistema informal de presidencialismo de coalizão, que em muitos aspectos parece um sistema parlamentar, em que o presidente, como um premiê, forma uma coalizão no Legislativo que permite que ele governe com a maioria do Congresso. A saída do PMDB torna difícil, senão impossível, formar uma coalizão. O problema é que o país não tem um mecanismo como o voto de desconfiança que há no parlamentarismo para mudar o primeiro-ministro.

O fato de o presidente governar com uma minoria não é incomum, mas torna ainda mais difícil o enfrentamento da crise.

Partidários do governo dizem que tirar Dilma significa trazer de volta ao poder uma minoria de ricos. O sr. já estudou a força política de elites burocráticas no Brasil. Acha que essas pessoas saíram do poder em algum momento?

As elites burocráticas e empresariais tiveram muita influência em todo o período democrático. Quem quer que seja presidente no próximo ano vai ter de reduzir o deficit fiscal, reduzir inflação e impor custos econômicos a todos os grupos sociais. Não sei se podemos dizer que vai ser um governo de esquerda ou de direita, mas muitas das medidas econômicas necessárias vão ser dolorosas para todas as classes sociais.

O que deu errado no desenvolvimentismo do Brasil?

Para entender os sucessos e fracassos do desenvolvimentismo brasileiro é preciso desagregar, pois ele significa diferentes programas, agências de governo, empresas estatais. Algumas funcionam, outras não. A Embraer é um caso de sucesso, enquanto a produção de aço nos anos 1980 não deu muito certo. Algumas áreas avançam mais de que outras. Pensar um projeto para apoiar todas as indústrias não é uma forma correta no caso do Brasil, onde a dispersão do apoio foi o que fez alguns casos terem mais impacto do que outros. 



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