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PIB aponta recessão inédita que se realimenta e desafia retomada

Veículo: Valor Econômico. 

Seção: Brasil 

O ano de 2015 não marcou apenas um encolhimento do PIB de 3,8%, magnitude que não era vista desde o início da década de 1990, mas mostrou que a dinâmica da atual recessão tem aspectos perversos que realimentam o enfraquecimento da atividade e tendem a tornar uma retomada mais lenta. Os números que o IBGE divulgou ontem mostram sequências e magnitudes de recuo inéditas em diversos componentes da economia. E as projeções colhidas pelo Valor Data mostram que a tendência é de que o quadro negativo persista em 2016, o que resultaria numa retração de mais de 7% no biênio, algo nunca visto nos dados conhecidos. O cenário levou o diretor de pesquisas para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, a dizer que o Brasil vai replicar em apenas dois anos a década perdida dos anos 80. 

Ao se arrastar por praticamente sete trimestres, o recuo na atividade e, principalmente, o brutal e recorde encolhimento dos investimentos, que chegou à casa dos dois dígitos ao cair 14,1%, promovem uma destruição de estoque de capital que deixa marcas profundas na cadeia produtiva. 

"Um número muito maior de empresas vai começar a quebrar em 2016", observa o economista do Ibre/FGV, Armando Castelar. Uma grande empresa, por exemplo, poderá ter condições de aguardar um longo período para voltar a investir nas suas atividades. No entanto, seus fornecedores podem ficar pelo meio do caminho em meio a um período tão longo sem encomendas. Este é apenas um exemplo da dificuldade de rearranjo produtivo que pode ser enfrentada e que tende a tornar mais lenta a retomada. 

Mesmo essa virada, contudo, ainda está num horizonte pouco visível. Só o resultado de 2015 deixa uma herança estatística negativa de cerca de 2,5% para este ano. Uma conjunção nefasta de fatores levou a um quadro tão complexo para atividade econômica, o que o ex­ministro Delfim Netto chamou de "tempestade perfeita".

Ao ajuste natural que estava previsto para o ciclo econômico que o país atravessava, baseado antes no consumo das famílias, somaram­se o cenário político adverso e as consequências da Operação Lava­Jato. Nas contas de duas consultorias, este último efeito retirou cerca de 2 pontos percentuais do PIB em 2015. E em 2016, o impacto poderia ser de mais 1 ponto. Já as questões políticas impedem que a confiança seja retomada e que os planos de investimento avancem. "O que 2015 ensinou é o poder destruidor de não se fazer nada", diz Castelar. 

O cenário político também dificultou o ajuste proposto no ano passado, outro fator que complica 2016. Em 2015, o consumo do governo caiu 1% enquanto o das famílias teve uma inédita retração de 4%. Para alguns economistas, as Por Camilla Veras Motta, Sergio Lamucci, Flavia Lima, Tainara Machado, Arícia Martins, Estevão Taiar, Robson Sales e Alessandra Saraiva | De São Paulo e do Rio Ramos, do Goldman: década perdida pode ser replicada em dois anos Brasil Últimas Lidas Comentadas Compartilhadas Resolução revoga uso do volume morto do Sistema Cantareira 13h16 Atividade do varejo cresce em fevereiro, aponta Serasa 13h00 Mulheres são mais pontuais no pagamento e menos endividadas 11h55 PT propõe aumentar abatimento da meta fiscal para até R$ 100 bilhões  11h48 Ver todas as notícias Vídeos PIB per capita deve cair até 2017 03/03/2016      Indicadores Brasil Variação em % Indicador fev jan dez 12 m* IPCA 1,27 0,96 10,71 IGP­M 1,29 1,14 0,49 12,08 IGP­10 1,55 0,69 0,81 12,05 Prod. Industrial** 0,4 ­0,5 ­9,0 IBC­BR** ­0,52 ­4,11 Veja as tabelas completas no ValorData Fontes: IBGE, FGV e BC. Elaboração Valor Data. * Acumulado até o último mês indicado ** Dessazonalizado Edição Impressa limitações do ajuste no setor público impuseram uma conta mais pesada ao setor privado e por isso as mudanças são urgentes. "O mercado está mais preocupado com a força e coesão de eventual coalizão governista em torno das reformas do que com nomes específicos que vão conduzir esse processo", avalia Mário Mesquita, ex­diretor do BC e economista do banco Brasil Plural. 

Outro aspecto é que a sensação de bem­estar da população está se deteriorando e o quadro tende a piorar. O mercado de trabalho e a renda começaram a sentir os efeitos da crise de maneira mais clara em meados do último semestre e o pior momento, acreditam os especialistas, ainda está por vir. A renda per capita, no entanto, já acusa o golpe e encolheu, no biênio 2014­2015, 5,4%, bem mais que os 3,7% do PIB. Para este ano, a previsão é que a tendência se repita.

Esse enredo, no entanto, em algum momento deve servir ao menos para conter a inflação, o que pode ajudar a política monetária do BC. "Vamos acabar tendo essa desinflação, vai acontecer talvez mais lentamente do que muita gente gostaria, mas vai acontecer", diz Mesquita. Vale lembrar que os serviços recuaram 2,7% em 2015 ­ primeira queda na série do IBGE iniciada em 1996 ­ e, mesmo assim, a inflação se mostrou resistente. 

As boas notícias continuam restritas ao agronegócio e ao setor externo: os únicos dois componentes positivos no PIB de 2015 devem continuar bem este ano. Os primeiros dados de 2016 já mostram que a ajuda das contas externas pode ser ainda mais robusta que o inicialmente projetado. Mas, infelizmente, não o suficiente para puxar o PIB para cima no ano. 



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