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Contra a Black Friday

Veículo: Moda Ética

Seção: Notícias

Para começar, a Black Friday de 2015 começou na sexta-feira passada, 20/11, com a Grey Friday. Depois, como de costume, começou a ser anunciada que começaria na quinta-feira (a única sexta que começa na quinta), com o seguinte pretexto de alguns e-commerces: “olha a gente está começando na quinta para que você possa escolher seus produtos e navegar com calma”.

Black Friday. Também se pode começar a acampar na madrugada de quarta-feira para adquirir as melhores ofertas dos grandes magazines.

E se não der tempo de aproveitar nem quinta, nem sexta, não tem problema, pois a Black Friday costuma ir até domingo – ao menos nos grandes supermercados.

A verdade é que ninguém precisa dessa data – só o comércio. Aliás, o Espetáculo do Comércio, que cria estratégias para encantar ainda mais os seres humanos com o mundo artificial das promoções e produtos.

Mas, até quando essa sociedade de consumo de coisas? Já tem algum tempo na Pós-Modernidade que a gente começou a consumir mais serviços, a alugar mais as coisas, a emprestar mais… Certos grupos de consumidores estão “overloaded” de coisas. Esses grupos de pessoas podem comprar sim, mas não querem, aliás, não queremos. Não queremos porque não faz sentido acumular produtos, nem arcar com suas consequências de manutenção e problemas, muito menos faz sentido comprar coisas que em breve estarão obsoletas – como MODA, CARRO, TECNOLOGIA.

É um comportamento antiquado. É cafona. E sem percepção política do contexto mundial em que vivemos, no qual cerca de 2,4 bilhões de pessoas vivem com menos de 2 dólares por dia (segundo a ONU). Até quando só pensar no indivíduo, no capricho pessoal – e não fazer algo pelo nosso próximo, pelo coletivo?

Black Friday é a única época do ano em que os consumistas se sentem como pessoas normais.

Bem, eu dou meu exemplo. Tenho alguns recursos (tempo, trabalho, dinheiro, valores, conhecimento). E tenho uma percepção: é minha obrigação repartir meus recursos em prol do coletivo – porque o governo não vai fazer isso (as políticas públicas são ineficientes), as indústrias não vão fazer isso (elas estão orientadas em perceber lucro como acúmulo de dinheiro, estão velhas na sua orientação), a mídia não vai fazer isso (é alimentada de publicidade das grandes empresas), o comércio não vai fazer isso (está orientado a criar mecanismos de venda) e, por aí, segue a defesa dos interesses particulares.

Ou seja, se não for cada sujeito – lúcido nesse mundo excludente – a tomar uma iniciativa de frear o consumo de coisas pré-obsoletas, e passar a repartir seus recursos com sua rede – qual instância na sociedade vai fazer isso? Nenhuma. Empresas que se dizem pró-negócios sociais ainda estão na transição da velha ordem pra uma nova que elas, embora deslumbrem, não conseguem ainda (por conjuntura estrutural) defenderem seus objetivos de “lucro” como “criação de valor”, além do acúmulo de capital. Bem, mas esse é um outro ponto para ser explorado melhor em outra oportunidade. Vamos nos ater ao consumo consciente, ao consumo no contexto de um mundo de pessoas que vivem na miséria. 

Então se posicionar contra a Black Friday – sim, terminantemente contra o consumo bobo de produtos pela sua mera oportunidade promocional – é uma postura inicial de dizer o seguinte:

não, eu não quero;
não, eu não preciso;
não, eu não desejo;
não, eu economizo mais dinheiro é não comprando;
não, eu já tenho – e o que eu tenho, vou fazer durar;
não, eu vou pegar emprestado;
não, isso daí eu posso alugar;
não, eu não quero ter meu comportamento conduzido por abordagens de “oportunidade imperdível”, de “amor às compras”, de “é agora ou nunca” – porque eu tenho o meu tempo, e eu sigo a minha ideologia, e eu tenho a minha opinião, e eu compro a hora que eu quiser, se eu quiser;
não, porque me causa mal estar ver as pessoas dormirem em fila na rua pra entrar em um magazine, ou acordadas em frente ao computador até meia-noite pra iniciar seus cliques em produtos;
não, porque eu não gosto do comportamento de bando. Todo bando tende a ser um bando bobo, de alienados;
não, mas se eu comprar, eu vou comprar em conjunto com mais pessoas, para que o produto seja nosso, e não somente meu.

Vamos boicotar a data. Simples. A postura tem que ser mais firme, tem que ter atitude. E tem que ter bom humor. Como diria o escritor D. H. Lawrence, em versos de seu poema “Uma revolução saudável”:

Vamos fazer uma revolução por prazer.

Chega dessa obrigação de consumir pra se manter no sistema, de ter que encontrar a oportunidade perfeita – que o sistema te dá! Rá! – pra você consumir. Chega desse prazer bobo de passear em um centro de compras (shopping, e-commerce, hiperpermercado). Passear durante meses, ou semanas, ou horas em busca de uma oferta de alguma marca – porque não se consegue criar melhores condições de trabalho, nem melhores promoções para a própria vida profissional. Quando foi que nos tornamos tão ridículos e antiquados? Quando foi que nos permitimos ser tão conduzidos e tão coniventes? Quando foi que passamos a amar tanto o nosso mundo artificial? (E é um amor que não é recíproco, equilibrado e generoso de ambas as parte. Esse amor ao mundo artificial é fetichista no sentido marxista mesmo, e é sadomasoquista – isto é, quanto mais você serve a esse mundo artificial, mais ele te possui e te prende, te algema no prazer que só satisfaz à matéria e à servidão ao material). Rá!

E pra concluir, segue abaixo vários memes clássicos questionando a Black Friday. E fica uns versos do nosso samba “Cabide”, trazendo-os para o nosso contexto de questionar a atitude, com um pouco de sensualidade, leveza e graça:

Vou arrancar sua saia e pôr no meu cabide só pra pendurar
Quero ver se você tem atitude e se vai encarar



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