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A influência da alta de juros nos EUA sobre o Brasil em 2016

Veículo: Estadão

Seção: Blogs Fábio Alves

O início do aperto monetário nos Estados Unidos, que deve acontecer em dezembro, se o Federal Reserve (Fed) quiser manter intacta a sua credibilidade após recente sinalização, será, de fato, um elemento crucial a ser levado em conta na política monetária do Brasil em 2016.

Desde o início do “tapering”, processo de redução dos estímulos monetários injetados para reavivar a economia americana, o início da alta de juros foi várias vezes reprecificado pelo mercado em razão da hesitação do Fed em começar o aperto, temendo abortar a incipiente recuperação da atividade econômica dos EUA.

Agora, não mais. Já após a reunião do Fomc (Comitê Federal de Mercado Aberto) de outubro, quando Janet Yellen, presidente do Fed, mandou um recado bem mais “hawkish” (inclinado ao aperto monetário), os investidores e analistas passaram a aceitar que o “lift-off” (início do aperto) ocorrerá em dezembro.

Mas foi a surpreendente criação de vagas de empregos em outubro – 271 mil ante a expectativa de 183 mil – que sedimentou as apostas de alta de juros para o encontro do Fomc no próximo mês.

Logo após a divulgação do número de criação de vagas, as apostas de elevação nos juros nos EUA em dezembro saltaram de 58% (momentos antes da publicação desse indicador) para 70%, de acordo com o CME Group.

Mesmo com as repetidas garantias de Yellen de que o aperto monetário será um processo bem gradual, a alta do dólar frente às outras moedas internacionais, inclusive o real, será inevitável.

No Brasil, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, já usou uma imagem de um aspirador de pó para descrever o efeito sobre a liquidez internacional diante do aperto monetário nos EUA, com os investidores sacando recursos aplicados em vários países e migrando de volta para os ativos denominados em dólares, como os títulos do Tesouro americano.

“Aperto de liquidez em moeda forte tende a depreciar a moeda nacional. Este movimento tende a ter elevada persistência, o que deve aumentar a pressão por repasse de um maior choque cambial à inflação”, explicou a esta coluna um renomado economista brasileiro. “A ata do Copom destaca que se as pressões vindas de preços de ativos forem persistentes, isto poderá demandar um aperto de política monetária. Este será o desafio.”

Aliás, o efeito da alta do dólar poderá ser ainda amplificado se o Banco Central Europeu (BCE) decidir realizar nova redução na taxa de juros sobre depósitos, que já está em terreno negativo, em -0,20%.

E para onde o dólar irá frente ao real após a primeira alta de juros pelo Fed, na reunião do Fomc de 15 e 16 de dezembro?

Certamente para acima de R$ 4,00, como projetam para o fim deste ano os analistas ouvidos na mais recente pesquisa Focus e também o BC nos seus últimos documentos de comunicação.

A elevação dos juros pelo Fed elimina de vez a chance de o BC cortar juros em 2016?

Na última pesquisa Focus, os analistas estão projetando uma taxa Selic a 13,25% ao fim do próximo ano, ou seja, 1 ponto porcentual de redução. Mas a trajetória ao longo do ano poderá ser diferente.

“As expectativas de inflação apontam para uma inflação acima do teto da meta em 2016. Em caso de novo choque cambial, elas tendem a se consolidar nesta região. Se o BC quiser trazê-las de volta para dentro do intervalo de metas, o mais provável é que tenha de subir, não cair, as taxas de juros”, argumentou o renomado economista. “Caso o BC consiga reancorá-las, aí sim, a Selic poderia cair. Então podemos até ter queda em 2016, mas o mais provável é que a Selic tenha de subir antes.”

Aliás, o início do aperto monetário nos EUA provavelmente resultará não somente em menor liquidez em dólar, mas também em maior prêmio de risco demandado dos países emergentes. Isto deve se transferir para a parte mais longa da curva de juros no Brasil.

De qualquer forma, quão crível é o objetivo do BC de trazer a inflação para a meta de 4,5% em 2017? E subir os juros será suficiente?

“Caso o governo consiga sinalizar um reancoramento fiscal robusto, é possível que a ampla capacidade ociosa torne factível esse objetivo. Mas parece pouco provável”, disse o economista acima. “Já sem o reancoramento fiscal, o cenário de 4,5% em 2017 não fica sequer plausível.”

Ou seja, elevar a taxa Selic antes de cortá-la pode até parecer uma condição necessária, mas definitivamente não é suficiente para se atingir esse objetivo. O fiscal tem que fazer a sua parte.

 



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