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Nas crises recentes, economia reagiu com bastante rapidez

Veículo: Valor Econômico

Seção: Economia

O grau de previsibilidade da economia brasileira raras vezes foi tão baixo e é isso que está fazendo o câmbio disparar e nutrindo previsões cada vez mais sombrias sobre recessão. O passado é uma bússola incerta, mas é referência importante, embora não decisiva. A corrida cambial, longe de ser um mal, é um corretivo importante, ainda que amargo. A alta da inflação é preocupante, porém mais pelo nível alto a partir do qual começou a subir. O nível dos juros, 12,75%, mostra que a economia tornou­se mais resistente. Em 1999, após a megadesvalorização, foram a 45%. Em 2002, sob o "fantasma" da vitória de Lula, o real chegou a R$ 3,9552 em 23 de outubro, antes do segundo turno, e bastou uma Selic de 25%. Hoje os pessimistas falam em pouco mais da metade dessa taxa para conter a corrida dos preços.

O que preocupa é a desarrumação geral da economia em relação aos choques passados. A megadesvalorização cambial de janeiro de 1999 foi um estelionato eleitoral, que veio corrigir valorização excessiva, mantida artificialmente. Seus efeitos nocivos, porém, foram bem menores que os esperados ou temidos. Já no segundo trimestre do ano o crescimento estava de volta e o PIB avançou 1%, com inflação de 8,94% e queda de 1,6 ponto do PIB nos investimentos (para 18,3%). O governo produziu superávit primário de 2,1% do PIB, o que ajudou a conter a fogueira dos preços.

A barbeiragem no setor elétrico provocou racionamento em 2001, que freou só por um ano a expansão, de 2,7% no ano seguinte. O consumo de energia caiu 10,1% no Sudeste e 7,5% no país. A inflação recuou para 7,67%, o superávit primário foi um dos maiores dos anos FHC, de 3,8% do PIB e, algo surpreendente, a taxa de investimentos se manteve em 19,4% do PIB. Em comum nas duas crises: gastos sob controle e queda do rendimento médio real.

Já a crise de 2002 foi basicamente de medo político ante o desconhecido ­ o PT no governo. O risco país triplicou (837 para 2.390 pontos básicos), a inflação levou o choque do câmbio e dos preços monitorados (que subiram 15% ante 12,5% do IPCA, mas o país não parou. Após a freada de arrumação de 2003, sob Lula, iniciou rota ascendente.

A maior crise financeira desde 1929, em 2008, passou pelo Brasil com a aparência inicial de "marola". O PIB mergulhou no último trimestre de 2008 (­3,5%), permaneceu retraído no seguinte (­0,9%) e a crise se encerrou no trimestre subsequente, com 2009 registrando ­0,3% de contração. O governo agiu rápido para deter o colapso do crédito, fez desonerações de impostos, reduziu o superávit consolidado do setor público de 3,7% para 2,06% do PIB e todos esses estímulos foram suficientes para relançar a economia. A surpresa foi que o câmbio mal se moveu ­ foi de R$ 2,17 por dólar em outubro, quando a crise se tornou virulenta para até R$ 2,39 e depois recuou.

O câmbio escondeu aí nova armadilha, pois a partir de 2009 os superávits comerciais minguaram e a indústria começou a definhar. A inflação caiu de 5,9% para 4,3% e a valorização do real serviu de âncora para segurar os preços. A taxa de investimentos foi a maior da década, de 20,6%. Em 2010, ano de eleições presidenciais, o PIB cresceu 7,6%com câmbio preso, estímulos monetários já nada contracíclicos e grandiosos planos de investimentos estatais. Começou aí o desarranjo atual.

A crise atual tem um pouco de cada uma das anteriores, mas é diferente. O governo teve déficit primário, o primeiro desde 1998, a dívida bruta subiu 10 pontos do PIB, para 63% em apenas 4 anos, e a inflação ficou perto do teto da meta por todo esse período. O rendimento médio real subiu mesmo após a crise de 2008, dando sustentação aos preços. A crise política, que em 2002 explodira antes das eleições, em 2014 explodiu estranhamente logo depois dela. Com a desarrumação econômica, o dólar foi buscar seu equilíbrio, apoiado no temor dos investidores externos. Em dez anos o real foi uma das moedas que menos se desvalorizaram. E as crises recentes, exceto a de 1999, ocorreram na presença de superávits comerciais, ao contrário da de agora.

Há enorme pessimismo sobre o PIB, mas os economistas erram muito suas projeções de crescimento. Como todas as peças do tabuleiro econômico estão fora do lugar, é possível um resultado muito feio. O Brasil não conhece uma recessão para valer há mais de uma década e o mau humor é realista. Mas previsões fatídicas podem, como no passado, não se realizar, se o governo fizer a coisa certa.



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