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Debate sobre rumo do preço do petróleo lota auditórios

 

Veículo: Valor Econômico

Seção: Economia

Uma das maiores inquietações no primeiro dia de debates do Fórum Econômico Mundial, em Davos, foi o rumo das commodities. As sessões que abordavam os preços do petróleo tinham auditórios lotados e filas na porta. O presidente do Itaú, Roberto Setúbal, resolveu entrar na discussão e fez um diagnóstico preliminar de que a queda nas cotações pode ser "parcialmente definitiva".

"O crescimento da demanda na China não vai apoiar os preços de commodities como no passado", afirmou Setúbal, um dos seis copresidentes do fórum neste ano, referindo-se não só ao petróleo, mas apontando também impactos para o minério de ferro e a soja. Para ele, é "amplamente percebido como estrutural e permanente" a desaceleração chinesa. "A maturação de investimentos na indústria de recursos naturais adiciona ainda mais pressão. Ainda é muito cedo para conclusões definitivas, mas acredito que a queda dos preços das commodities, até agora, é parcialmente definitiva", disse.

Executivos das maiores petrolíferas do mundo bateram ponto em Davos e também falaram de incertezas no setor. "A minha expectativa é de preços baixos em 2015", comentou o presidente da multinacional francesa Total, Patrick Pouyanné, depois de ter anunciado um plano de reduzir em 10% os investimentos planejados para o ano. Ele também mencionou a possibilidade de acelerar a venda de ativos como forma de fazer caixa para enfrentar a queda de 60% das cotações desde junho.

Pouyanné foi categórico, porém, ao excluir sua maior aposta no Brasil da lista de ativos que serão oferecidos no mercado. "De jeito nenhum!", disse ao Valor, quando foi perguntado se a participação de 20% no campo de Libra faz parte do plano de venda.

"Claro que faz sentido continuar trabalhando lá. Precisamos de muita energia no longo prazo", enfatizou o executivo francês. A Total está no consórcio vencedor do primeiro leilão do pré-sal, que tem a Petrobras como sócia majoritária (40%), além de participações da anglo-holandesa Shell (20%) e das chinesas CNPC e CNOOC (10% cada uma).

Segundo ele, há um declínio de 5% ao ano na produção dos campos em atividade no mundo e metade dos barris deixará de ser produzida até 2030, gerando a necessidade de novos investimentos. Mesmo no caso do óleo e do gás de xisto, onde a extração normalmente precisa de preços acima de US$ 70. A exploração de fontes não convencionais é intensiva em capital, mas flexível e com capacidade de resposta bastante rápida, podendo ser retomada em curto prazo. "E não devemos subestimar os ganhos de eficiência que podem aparecer."

O secretário-geral da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), Abdallah Salem El-Badri, prevê a recuperação das cotações. "Eu lhes digo que o preço vai se recuperar e nós vamos voltar para o normal muito em breve", afirmou, sem falar em valores, diante de uma plateia ávida por uma análise do cartel.

O presidente da italiana Eni, Claudio Descalzi, teme que a redução dos investimentos se traduza em problemas de desabastecimento no futuro e provoque aumentos "agudos" do petróleo daqui a quatro ou cinco anos.

O banqueiro André Esteves, dono do BTG Pactual, acredita que o mundo é uma coleção de riscos, incluindo a crise que derrubou o preço do petróleo no mercado global. Do ponto de vista financeiro, ele defendeu que uma "normalização" da política monetária das economias ocidentais, com aumento de juros, pode ajudar a minimizar riscos globais e aprimorar fundamentos econômicos. "Estamos há cinco anos seguidos com taxas zeradas nos Estados Unidos, várias economias estão com taxa negativa. Um movimento em direção à normalização das políticas monetárias [elevação de juros], sem entrar em aperto monetário, seria uma boa recomendação."

Quem tratou de humanizar a questão foi a diretora-executiva da ONG Oxfam, Winnie Byanyima, que, em vez de apontar tendências de preços, insistiu na necessidade de aproveitar o contexto atual para uma reflexão mais ampla. Milhões de pessoas no mundo emergente, segundo ela, saíram da pobreza por causa do "boom" das commodities. Ao mesmo tempo, em muitos países, Byanyima lembrou que a renda foi capturada por uma "pequena elite" e houve aumento da desigualdade.

"Talvez seja uma oportunidade para que esses países reavaliem [o modelo] de tributação e como usam as receitas provenientes de seus recursos naturais", ressaltou a diretora da Oxfam. Apesar das discussões ricas e entusiasmadas, um observador brasileiro notou que o "espírito de Davos" não tem sido capaz de trazer previsões confiáveis nessa matéria. Em janeiro do ano passado, ninguém - simplesmente ninguém - aventava a hipótese de tamanha queda nos preços das commodities, quando o barril ainda estava acima de US$ 100.



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