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Incertezas sobre nova política econômica impedem a retomada dos investimentos

 

Veículo: Valor Econômico

Seção: Economia

 
Aline Massuca/ValorBotelho, do Ibre-FGV: "Retomada dos investimentos requer primeiro uma sinalização do caminho da política econômica"

 

O cenário difícil para o setor industrial brasileiro só irá se reverter quando houver diminuição das incertezas, na opinião de Vinícius Botelho, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), e de Fernando Ferrari Filho, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Passadas as eleições, ainda existe uma série de indefinições, principalmente sobre o caminho da política econômica a ser adotada pelo novo governo de Dilma Rousseff. Para que isso fique mais claro, é necessário o anúncio dos novos nomes que irão compor a equipe econômica a partir de 2015 e as reformas que serão levadas adiante.

"Se o [Guido] Mantega não continua, quem entra na Fazenda? Será um desenvolvimentista ou não? No Banco Central, entra alguém mais leniente com a taxa de juros ou não?. Isso de certa forma sinaliza os rumos da política econômica", disse Ferrari Filho. Botelho concorda: "O cenário de recuperação que seria caracterizado pela retomada dos investimentos requer primeiro uma sinalização do caminho exato da política econômica, como, por exemplo, o nome do ministro da Fazenda".

Para os dois economistas, os dados de produção de setembro indicam que a indústria está estacionada. Botelho diz que a queda de setembro de 0,2% frente a agosto representa praticamente uma estagnação tanto da indústria extrativa quanto da indústria de transformação, dando continuidade a uma queda de mais longo prazo.

"A indústria de transformação está parando em um patamar bastante baixo", disse Botelho. A produção da indústria de transformação acumula nos últimos 12 meses recuo de 2,9%. E a indústria extrativa, segundo ele, embora persista com crescimento de 3,5% nos últimos 12 meses, no mês de setembro contra agosto apresentou contração de 0,2%. "A indústria extrativa, que é o setor que está tendo neste ano o melhor desempenho, teve um revés grande por conta da queda dos preços do minério de ferro e do petróleo", explicou Botelho. Por conta disso, diz que mesmo o aumento de produção no ano não tem um significado tão positivo.

De acordo com Botelho, o país passa por um processo de "reequilíbrio entre oferta e demanda", basicamente com a demanda contraindo fortemente neste começo de ano. "A gente está encontrando um novo equilíbrio, uma nova quantidade produzida pela indústria de transformação, que está se firmando em um número entre 3% a 4% menor em relação ao patamar do ano passado. Ou seja, é um cenário de desaceleração muito forte", disse Botelho.

"Não há nenhum número confortável. Isso mostra que a indústria está realmente ladeira abaixo", disse Ferrari, sobre os números mais de longo prazo da produção industrial. Para ele, os motivos para esse quadro vão desde taxas de juros e de câmbio não competitivas, passam por um mercado internacional com uma recuperação que é "lenta, assimétrica e volátil", e também pesa negativamente a expectativa que esse quadro só vai se alterar quando um conjunto de reformas mais estruturais ocorrerem no Brasil. Ele citou como exemplo a reforma tributária e mudanças na regulamentação do trabalho.

Na opinião de Ferrari, sabendo que em 2015 vai ser um ano de ajuste fiscal, a equipe do novo governo precisa deixar claro qual vai ser a "linha" de condução do câmbio. "Vai ter que ter uma determinada linha, não poderá ficar nessa volatilidade e perder competitividade", disse. "Vai ter um aumento gradual dos juros, que vai até onde?".

Para Botelho, o recente aumento dos juros também deve gerar algum tipo de desaquecimento na atividade econômica no curto prazo, mas ele entende que isso faz parte da coordenação de expectativas do regime de metas e poderá trazer um resultado positivo para a economia no fim de 2015. "Mas isso depende da duração desse ciclo de aumento dos juros, da sua intensidade, quão rápido a inflação responderá e qual vai ser o tamanho do reajuste dos preços administrados que vai ser escolhido no ano que vem para ajustar as contas", destacou.

Botelho afirma ainda que a economia precisa ganhar "transparência e previsibilidade" para que volte a ter base para o crescimento, citando a necessidade de "comprometimento com o regime de metas de inflação e clareza nas estatísticas fiscais, sob risco de haver perda do 'investment grade', classificação dada pelas agências internacionais de risco, o que pioraria o cenário para o setor.

Independentemente dos nomes da nova equipe econômica, Botelho acredita, no entanto, que o cenário difícil pode continuar no médio prazo por outras razões, como "riscos substanciais" associados à escassez de energia elétrica e de água, que pode prejudicar o desempenho da indústria em 2015.

Para Ferrari, uma questão importante para os empresários no médio prazo é saber para onde vai o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "Se o BNDES não oferecer mais juros subsidiados, não tiver mais capacidade de alavancagem, isso será muito ruim para a indústria. O setor industrial pode até aceitar uma política de elevação da taxa de juros, que supostamente controle o processo inflacionário, mas tem que ter a sinalização de que o BNDES vai continuar ofertando crédito a taxas subsidiadas".



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