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Eleição e economia fraca pesam nos resultados do 3º trimestre
Veículo: Valor Econômico
Seção: Economia
Os resultados das companhias brasileiras de capital aberto no terceiro trimestre, que começaram a ser divulgados ontem com a operadora de viagens CVC, virão com a marca do cenário político conturbado e do baixo crescimento econômico.
O maior impacto será o dólar, já que a disputa presidencial mexeu com o mercado financeiro e levou a moeda a R$ 2,45 no último dia do trimestre - data que é usada para a conversão em reais no balanço das dívidas em moeda estrangeira.
De acordo com as estimativas do BTG Pactual, o lucro líquido de 121 empresas do universo de cobertura do banco deve cair quase 10% no terceiro trimestre na comparação com o mesmo período do ano anterior. A queda no resultado se dará apesar do aumento esperado para a receita líquida, de 6,2%.
O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) deve ficar praticamente estável, segundo relatório divulgado pelo banco a investidores. O levantamento considera resultados de Petrobras, Vale e Embraer em moeda americana, com a conversão feita pelo Valor com o dólar médio de cada período.
Os números são uma mostra do impacto que o dólar deve ter nos balanços. Com a atividade econômica ainda fraca, uma pressão extra sobre os números deve vir da variação cambial sobre a dívida das companhias em moeda americana.
A cotação de fim de trimestre foi 10% maior que a o terceiro trimestre de 2013. Quando se compara o câmbio de setembro com o do segundo trimestre, a valorização fica em 11,4%.
"Poderemos ver ganhos operacionais em algumas empresas ao olharmos caso a caso, mas sem otimismo diante do panorama macroeconômico. A atividade econômica ficou dentro do esperado e não temos expectativa de melhora", diz o analista Ricardo Kim, da XP Investimentos.
A influência positiva do dólar nas receitas das exportadoras não será contabilizada totalmente agora. Isso porque o dólar médio do período não teve uma alta tão acentuada quanto o do fim de trimestre. Assim, as maiores produtoras mundiais de celulose branqueada de eucalipto, Fibria e Suzano, por exemplo, podem ter efeitos negativos no balanço. No segundo trimestre, a Fibria tinha 95% da dívida bruta total denominada em dólar e a Suzano, 54%, com ajustes de derivativos.
A expectativa dos analistas é que o ganho de receita com exportações não será suficiente para cobrir o aumento da dívida neste momento. O grande impacto positivo virá nos próximos trimestre, se a moeda americana se mantiver alta. O BTG estima prejuízo de R$ 739 milhões para a Fibria no período (ante lucro de R$ 57 milhões no ano anterior); perda líquida de R$ 68 milhões para a Suzano (contra lucro de R$ 43 milhões um ano antes); e lucro de R$ 25 milhões para a Klabin (ante ganho de R$ 197 milhões em 2013).
Empresas de alimentos, como BRF, JBS, Minerva e Marfrig, também estão expostas ao dólar e devem registrar um impacto negativo do câmbio na dívida.
A mineradora Vale será duplamente prejudicada no terceiro trimestre. Além de ter grande parte da dívida denominada em dólar, a empresa está altamente exposta à cotação do minério de ferro, que caiu muito nos últimos meses. Na comparação com o período de julho a setembro do ano passado, a desvalorização é de 32%, passando de US$ 133 a US$ 91 por tonelada, considerando o preço médio do minério com teor de 62% de ferro.
"O preço do minério de ferro no período foi bem menor e isso, com certeza, vai afetar o desempenho da Vale, mesmo que tenha aumento no volume [comercializado]. O que pode acontecer é a empresa apresentar alguma surpresa como melhora de eficiência com corte de custos", avalia Kim, da XP Investimentos.
A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) também é prejudicada pela queda no preço do minério de ferro. No início deste mês, a agência de classificação de risco Standard & Poor's (S&P) cortou a nota de crédito da companhia de "BBB-" para "BB+", o que significa que agora ela passou a ser considerada um investimento especulativo. A perspectiva foi mantida em negativa.
O principal motivo citado foi a redução nos preços do minério. Ela sofre ainda com o segmento de siderurgia, que não deve vir tão positivo devido à fraca atividade interna. O mesmo acontece com a Usiminas.
A Gerdau, por outro lado, está menos exposta a essa situação. A empresa possui ativos importantes fora do Brasil, nos Estados Unidos e na Europa, e tem boa parte do faturamento em moedas estrangeiras.
A Petrobras também entra na lista das prejudicadas com o cenário. Segundo a análise do HSBC, a exposição cambial não se restringe à disparidade entre os preços internacionais dos combustíveis e o praticado pela empresa no país no trimestre, implicando perdas ou ganhos no segmento de refino. Abrange o endividamento, que tem cerca de 80% do valor denominado em dólar.
"Acreditamos que, paralelamente a um aumento nos preços [dos combustíveis], que corrigiria eventuais perdas no curto e médio prazos, uma alteração nos fundamentos da política de preços no longo prazo produziria uma mudança mais importante na percepção dos investidores", dizem os analistas Luiz Carvalho e Filipe Gouveia, do HSBC.
Para reduzir os impactos da variação cambial, porém, a Petrobras anunciou em julho do ano passado a adoção da chamada "contabilidade de 'hedge'". A medida permite que a correção de parte da dívida em moeda americana seja diferida no patrimônio líquido e não afete o lucro de forma imediata. A petroquímica Braskem tem exposição líquida ao dólar e, por isso, também adotou essa forma de proteção.
As companhias mais diretamente ligadas à atividade interna devem continuar a refletir o ritmo cambaleante da economia. De acordo com a equipe de análise do Santander, empresas de rodovias mostrarão resultados muito fracos no terceiro trimestre, como consequência da queda no tráfego entre julho e setembro. Um dos principais exemplos, segundo os especialistas Pedro Balcão Reis e Bruno Amorim, é a EcoRodovias, que atua num ambiente de competição acirrada no Ponto de Santos (SP). "Vemos claro risco de baixa nos resultado da empresa."
No segmento de varejo, a prévia operacional do Pão de Açúcar mostrou aumento das vendas, mas em ritmo abaixo da inflação. A receita líquida total subiu 10,9% no trimestre, mas, desconsiderados os números da Cdiscount (unidade francesa de comércio on-line) que foram incorporados nos meses de agosto e setembro, o avanço cai para 5,7%. E as vendas "mesmas lojas" (existentes há pelo menos um ano) subiram apenas 3%. Na opinião do UBS, a empresa mostrou desaceleração mais acentuada do que o esperado, devido às dificuldades macroeconômicas.
Para as varejistas de vestuário, o HSBC espera ver sinais de um ambiente mais difícil de consumo, com baixo crescimento das vendas mesmas lojas e indicações de um aumento nos encargos de dívidas de liquidação duvidosa nos segmentos de crédito. Um outro efeito negativo, de acordo com o banco, seria uma erosão na margem bruta, em função do aumento nas remarcações em toda a indústria, apesar de acreditar que, por ora, isso está limitado em grande parte à Marisa.
"Esperamos que a Renner novamente demonstre uma forte operação, mas prevemos Ebitda negativo no segmento de varejo da Marisa. É provável que a Guararapes mostre pouco ou nenhum crescimento das vendas mesmas lojas, apesar de esperarmos um enfraquecimento ainda maior na Hering ", afirmam Richard Cathcart e Stewart Ragar, do HSBC, em relatório.
Para o banco, o mercado provavelmente se concentrará nos resultados do quarto trimestre para decidir se a administração da Hering realizou uma reestruturação sustentável".
No setor de bebidas, a expectativa dos analistas para Ambev, também é de desempenho fraco. Isso por conta do recuo no mercado consumidor brasileiro após o salto nas vendas com a Copa do Mundo de futebol, realizada entre meados de junho e julho.
O Credit Suisse espera crescimento de cerca de 5% para a receita da Ambev no terceiro trimestre e de 2,6% para o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês). "Achamos que os resultados podem desapontar o mercado", afirmam os analistas Antonio Gonzalez e Tobias Stingelin, em relatório.
Também sensível aos fundamentos internos, o setor de educação vai bem, como mostram os números operacionais já divulgados sobre o terceiro trimestre. Para a Kroton, a base de alunos de graduação subiu 13% nos três meses. A Estácio ficou melhor - alta de 30,7% na comparação com o ano passado.
O avanço acima do previsto deve garantir incremento nos resultados das empresas, segundo o BTG Pactual. Em relação à Estácio, o banco afirma que o menor ritmo de expansão no ensino presencial foi compensado pelo crescimento orgânico na captação de alunos para o ensino a distância.
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