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Ajuste na balança comercial ainda é de baixa qualidade

Veículo: Valor Econômico

Seção: Economia

As chances de um superávit na balança comercial neste ano aumentaram com a divulgação, na semana passada, de estatísticas que mostram um saldo positivo de US$ 2,3 bilhões em junho. Não deixa de ser um sinal encorajador, depois de uma gradual deterioração nas trocas do Brasil com os demais países, observada desde meados de 2011.

Mas o resultado ainda parece acanhado diante dos vultuosos compromissos do país em conta corrente projetados para o ano. O ajuste na balança comercial também preocupa pela sua baixa qualidade. É excessivamente apoiado na exportação de produtos básicos, em vez de bens industriais de maior valor agregado. E foi obtido com a ajuda da contenção das importações de bens de capitais, um sinal de debilidade dos investimentos.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic) evitou fazer projeções para a balança comercial neste ano, mas indicou que a perspectiva é que feche no azul. No primeiro semestre, houve um déficit de US$ 2,490 bilhões, próximo do apurado em igual período de 2013. A previsão do Banco Central é um superávit de US$ 5 bilhões em 2014, ou quase o dobro do resultado do ano passado. Mas uma fração dos quase US$ 30 bilhões apurados em 2011.

Apesar da melhora, o saldo comercial esperado para 2014 cobre apenas 6% do déficit na conta de serviço e rendas também projetado pelo Banco Central, de US$ 87,5 bilhões em 2014. O déficit em conta corrente previsto para o ano é de US$ 80 bilhões. Seu financiamento deixa o país dependente de capitais de baixa qualidade, mesmo levando em conta a perspectiva de forte ingressos de investimentos estrangeiros diretos.

Reportagem publicada pelo Valor na semana passada mostra que a concentração das exportações brasileiras em produtos básicos atingiu o seu ponto mais alto em três décadas. Bens como minério de ferro e soja responderam por 50,8% dos embarques totais no primeiro semestre. É a primeira vez desde 1980 que representam mais da metade das vendas externas do país. Essa proporção já foi de 25% em 2002, quando as cotações das "commodities" encontravam-se deprimidas, e foi de 47,5% das exportações no primeiro semestre. Em contrapartida, os produtos manufaturados reduziram sua participação nas exportações para o menor nível também desde 1980, e hoje equivalem a 34,4% das vendas totais.

O governo atribui a queda das exportações dos bens industrializados à lenta recuperação da economia global, que certamente é um das causas, mas não a única. Estudos do Banco Central mostram que as exportações brasileiras são mais sensíveis à demanda externa do que à taxa de câmbio. É fato, porém, que houve perda de competitividade industrial porque os custos de produção encareceram nos últimos anos, puxados por uma política econômica que levou a reajustes salariais acima dos ganhos de produtividade.

Havia a expectativa de que a desvalorização do real ocorrida desde meados de 2013 pudesse dar maior competitividade à indústria nacional, já que em última instância representa uma redução real dos salários domésticos. É possível que boa parte desse efeito ainda esteja por ocorrer, mas será necessário baixar os altos níveis de inflação para conter a corrosão da depreciação nominal do câmbio.

Analistas econômicos ouvidos pelo Valor afirmaram que o ajuste na balança comercial reflete sobretudo o esfriamento da demanda interna, que segura as importações. Esse fator fica patente nas projeções do Banco Central para 2014, que contemplam aumento de apenas 0,2% nos desembarques, comparado com 2013, e alta de 1,2% nas exportações.

No segundo trimestre, as importações foram 3,7% inferiores ao mesmo período de 2013. O destaque negativo no período é a queda de 7,5% nas importações de máquinas e equipamentos, um indicador antecendente dos investimentos na economia. Importações de bens de consumo recuaram 4%

O reequilíbrio da balança comercial depende da contenção da demanda doméstica em favor da externa. Seria desejável poupar os investimentos e segurar o consumo das famílias e, sobretudo, do governo. Os sinais mais recentes, no entanto, são de que os gastos públicos seguem crescendo, com repercussões negativas sobre a inflação e as contas externas do país.

 



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