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BC prevê mal a inflação de dois anos adiante

Veículo: Valor Econômico

Seção: Economia

O Banco Central vem repetindo que espera que a inflação caia dos atuais 6,37% para 5%, perto do centro da meta, dentro de dois anos, desde que os juros básicos da economia sejam mantidos nos atuais 11% ao ano por algum tempo. Quais são as chances de a inflação realmente recuar e de o próprio Banco Central manter inalteradas as condições monetárias da economia?

A julgar pelo passado, são relativamente pequenas. O Banco Central não tem sido muito eficiente nas suas previsões em horizontes tão longos. Desde que passou a divulgar projeções para a inflação dois anos à frente, em dezembro de 2007, errou mais do que acertou (veja gráfico abaixo). Em média, a inflação ficou 1,2 ponto percentual acima do previsto. É muita coisa. Se o erro médio se repetir, significa que, em junho de 2016, a inflação estará mais próxima do teto da meta, de 6,5%, do que do centro, de 4,5%. O levantamento é feito com base nas projeções do BC segundo o cenário de mercado. Ou seja, já considera os movimentos futuros de política monetária sinalizados pelo próprio BC ao mercado.

Parece haver uma lei governando as projeções do Banco Central: a inflação prevista nos seus modelos econômicos tende a convergir para a vizinhança, senão o centro, da meta num horizonte de dois anos. A inflação média projetada foi de 4,6%. A realidade dos dados, porém, é mais dura. A inflação ficou sistematicamente acima disso. A alta média de preços apurada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi de 5,8%.

Projeção de queda da inflação até 2016 está sujeita a erros

Se os juros realmente ficarem estáveis em 11% ao ano por muito tempo, como sinaliza o Banco Central, será algo inédito. Na história do regime de metas de inflação, adotado em 1999, os juros foram mantidos estáveis pelo Banco Central por períodos de, no máximo, seis meses. Em 2012, a instituição disse explicitamente que manteria a taxa básica, então em 7,25% ao ano, inalterada por um período prolongado de tempo. Durou apenas cinco meses. Pelo passado, são grandes as chances de os juros voltarem a subir até novembro.

O Banco Central parece estar ciente das limitações tanto da acurácia de suas projeções de inflação quanto da indicação de manter os juros estáveis. Vem lembrando que as suas projeções de inflação não são pontuais, mas sim têm intervalos de probabilidade. E já alertou que, nos próximos dois anos, o valor central projetado para a inflação tende a convergir para o centro da meta, de 4,5%, mas suas projeções mostram que ela não chega exatamente lá. O cenário melhorou e parece caminhar na direção correta, mas o BC segue atento. Anteontem, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, reafirmou o que é, no momento, a sua mensagem central: "A política monetária deve se manter vigilante para mitigar riscos". Ou seja, o BC não pretende ficar parado, se o seu cenário de queda da inflação se desmoronar. Vai subir a taxa básica, se necessário.

Com todas as ressalvas que abrem uma porta para eventualmente mudar de ideia, na essência o Banco Central está assumindo um compromisso sobre os seus passos futuros de política monetária. Muitos vão encontrar semelhanças com o "forward guidance", instrumento usado por bancos centrais de países desenvolvidos, como o dos Estados Unidos, para manter uma baixa inclinação da curva de juros futuros. A preocupação se justifica, porque os bancos centrais têm controle direto apenas sobre os juros de curtíssimo prazo, mas são os juros mais longos, definidos pelo mercado, que têm influência sobre a atividade econômica e a inflação.

 

 

Ao contrário das economias avançadas, no Brasil a principal preocupação parece ser uma queda prematura dos juros futuros negociados em mercado antes de completado o trabalho de desinflação.

A principal crítica ao "forward guidance" é que o instrumento não funciona, porque o mercado financeiro não acredita piamente nos cenários traçados pelas autoridades monetárias. Isso seria admitir que os banqueiros centrais têm uma certa clarividência. Não é bem assim. Em agosto do ano passado, o Bank of England anunciou que não subiria os juros até que o desemprego caísse abaixo de 7%, algo que parecia totalmente fora do horizonte. Seis meses depois, o desemprego furou o piso, e o Bank of England teve que rever seu compromisso.

No Brasil, o mercado financeiro já debate quando o BC irá baixar os juros, diante dos dados que indicam debilidade da economia. Nas últimas semanas, comprimiu os prêmios embutidos na curva de juros futuros que remuneravam o risco de uma eventual elevação dos juros em 2015. Ontem, o IBGE anunciou uma queda de 0,6% na produção industrial de maio, o terceiro recuo mensal seguido. Indicadores de confiança de empresários e de serviços divulgados anteontem mostram continuidade da tendência de deterioração das expectativas. A aposta é que o BC vai colocar em segundo plano o seu objetivo de colocar a inflação na meta para proteger a atividade econômica. Se estiverem corretos, em 2016 a inflação certamente vai superar os 5% hoje projetados pelo BC.

 



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