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Para onde vai o câmbio?

Veículo: Opinião
Seção: Valor Econômico
 
Por Luiz Penno
 
Há dois anos, em 27-07-2011, o real atingia sua maior cotação frente ao dólar desde janeiro de 1999, com a taxa de câmbio a R$ 1,54 por dólar. A moeda forte influenciou o padrão de consumo do brasileiro, que passou a viajar mais ao exterior e a comprar produtos importados, como eletrônicos e veículos. Nosso governo também se acostumou com essa situação, e passou a promover a moeda apreciada como instrumento de combate à inflação por meio do estímulo à importação de bens e serviços a preços mais competitivos que os nacionais.
 
Nos últimos meses, entretanto, o real começou a dar sinais de enfraquecimento e a inflação, de descontrole. A luz amarela acendeu no governo e a reação foi rápida: o Ministério da Fazenda reduziu de 6% para 0% o IOF cobrado sobre as aplicações de estrangeiros em renda fixa no Brasil, e zerou o IOF das operações de compra e venda de dólar no mercado futuro. O Banco Central, por sua vez, atuou no mercado, vendendo dólares para ajudar a reduzir a pressão sobre o real.
 
Em face disto, cabe-nos fazer algumas perguntas: quão efetiva são essas medidas? A taxa de câmbio pode ser utilizada para combater a inflação? E, mais importante, para onde vai o nosso câmbio?
 
Embora exista uma série de teorias que procuram explicar qual é a taxa de câmbio de "equilíbrio", é impossível prevê-la com exatidão. Diariamente, essa taxa é determinada pelo equilíbrio entre oferta e demanda. Por exemplo, caso exista um fluxo muito grande de investidores estrangeiros interessados em investir no Brasil, eles precisam converter seus dólares em reais. Com isso, a procura por reais aumenta e nossa moeda se valoriza, como aconteceu em 2011.
 
Entretanto, no longo prazo, estudos indicam que o que determina o nível da taxa de câmbio é a manutenção da paridade do poder de compra entre as moedas. Utilizando o exemplo do Big Mac Index, criado pela revista "The Economist", podemos ilustrar sua lógica. Em 1994, um Big Mac custava R$ 2,42 no Brasil. Em 2013, o mesmo sanduíche custa R$ 10,25, um aumento de preço de 4,2 vezes no período. Qual a razão desse aumento? Ganância do McDonald's, buscando aumentar seu lucro a todo custo? Na verdade, ele reflete principalmente a inflação das matérias-primas e do custo da mão de obra no país. O salário mínimo passou de R$ 64,79 em julho de 1994 para R$ 678 hoje. E a arroba do boi gordo aumentou 4,4 vezes nestes últimos 20 anos.
 
Já nos Estados Unidos, um Big Mac custava US$ 2,32 em 1994. A inflação americana nesse período foi muito mais contida do que a nossa, e hoje um Big Mac é vendido por US$ 4,20. A relação de troca implícita no preço do Big Mac nos dois países era de R$ 1,04 R$/ US$ em 1994 (R$ 2,42 / US$ 2,32), e é de 2,44 R$ / US$ hoje (R$ 10,25 / US$ 4,20). Sua evolução nesse período reflete, apenas, a variação de preços de maneira desigual nos dois países. Não por acaso, em 1994 a taxa de câmbio era tal que um dólar valia um real, e atualmente está ao redor de R$ 2,25.
 
 
Mas será que essa relação não é válida apenas para o caso específico de um produto oferecido por uma multinacional? Ela seria verdade ao longo de um período de várias décadas, e para a economia como um todo?
 
Fizemos a análise da relação entre taxa de câmbio e inflação para uma série de moedas de países diferentes, cobrindo um período superior a 40 anos, e em todos os casos a relação se mostra bastante sólida. O caso do Brasil é o mais emblemático porque, desde 1960, tivemos 8 denominações de moeda diferentes (cruzeiro, cruzado, cruzeiro novo, etc), períodos de hiperinflação e cortamos 9 zeros da moeda. A taxa de câmbio nominal variou significativamente: 1 dólar comprava 12.985 Cruzeiros em fevereiro de 1986, e apenas 0,84 real em outubro de 1995.
 
Quando analisamos a taxa de câmbio histórica da moeda brasileira frente ao dólar, retirando o efeito da inflação ocorrida nos dois países, vemos que variação do câmbio é muito menor, e que oscila em torno de um ponto de equilíbrio.
 
Ou seja, no longo prazo, a taxa de câmbio é consequência da inflação, e não sua causa direta. Embora medidas que visem conter a desvalorização do real possam surtir algum efeito imediatista sobre o índice de preços, não são medidas estruturais e sustentáveis.
 
Por fim, o estudo indica, também, que nossa moeda ainda está valorizada frente ao dólar.
 
Obviamente, é impossível prever por quanto tempo o câmbio poderá ficar neste patamar, mas pode-se dizer que a tendência nos próximos anos seja de desvalorização. Ainda mais se a inflação no Brasil continuar em ritmo acelerado.
 
Luiz Penno é mestre em Economia e Finanças pela London School of Economics e sócio fundador da Advisia Investimentos

 



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