Notícias

Câmbio, crescimento e competitividade

Veículo: Valor Econômico
Seção: Opinião
 
Por Rodrigo R. Loures e José L. Oreiro
 
A economia brasileira tem apresentado um desempenho decepcionante em termos de crescimento econômico nos últimos 30 meses. Depois de um crescimento chinês em 2010, quando o PIB apresentou uma alta de 7,5%, o crescimento foi se desacelerando para 2,7% em 2011 e 0,9% em 2012. As projeções para 2013 apontam para um crescimento do PIB inferior a 2%. Mantido esse ritmo de crescimento, o Brasil será eternamente um país do terceiro mundo.
 
Por que a economia brasileira não consegue engatar um ritmo mais acelerado de crescimento? Qual é o entrave ao desenvolvimento do Brasil?
 
O desempenho medíocre de nossa economia deve-se ao processo de desindustrialização vivenciado desde meados de 1970, mas que se acentuou mais recentemente, atingindo o seu clímax! Após ter alcançado um pico de quase 22% do PIB em meados da década de 1970, a indústria de transformação iniciou um lento processo de perda de importância no PIB, o qual se acentua a partir de 2003, atingindo um patamar pouco superior a 13% do PIB em 2012.
 
Esse processo de perda de importância relativa da indústria de transformação está na raiz da desaceleração do crescimento que a economia brasileira vivenciou nos anos 80 e 90 com respeito ao período 1950-1980; bem como explica porque - passado o período de bonança na economia mundial (2004-2008), no qual a economia brasileira consegue acelerar seu crescimento para uma média próxima de 4% ao ano - voltamos a ter um desempenho econômico medíocre a partir de 2011.
 
Por que a economia brasileira está se desindustrializando? A razão fundamental desse fenômeno é a perda de competitividade externa causada pela tendência à sobrevalorização crônica da taxa real de câmbio ocorrida no Brasil desde 1994, a qual resulta das entradas maciças de capitais especulativos - para aproveitar o enorme diferencial entre a taxa de juros interna e externa - e da doença holandesa. De fato, quando olhamos para os dados da taxa real efetiva de câmbio verificamos que no período 2003-2010 ocorreu uma apreciação real de mais de 33%! A desvalorização do câmbio nominal ocorrida em meados de 2012 não foi suficiente para corrigir esse problema, pelo contrário, alguns economistas argumentam que para a taxa real de câmbio voltar ao nível prevalecente em janeiro de 2007 o dólar deveria estar sendo cotado hoje a R$ 3,20.
 
A sobrevalorização crônica da taxa real de câmbio é a causa fundamental da baixa taxa de investimento como proporção do PIB que se verifica no Brasil nos últimos 20 anos. Com efeito, a sobrevalorização cambial limita as oportunidades de investimento lucrativo que os empresários podem realizar numa economia globalizada e, sujeita, portanto, à concorrência internacional, principalmente da China. O desestímulo ao investimento que é resultado da sobrevalorização crônica da taxa de câmbio tem como contrapartida um progressivo envelhecimento do parque industrial brasileiro, o que, por sua vez, levou à estagnação do ritmo de crescimento da produtividade do trabalho. A partir de meados da década passada, a produtividade do trabalho passou a crescer a um ritmo inferior ao dos salários reais, induzindo um rápido aumento do custo unitário do trabalho e, dessa forma, a uma acentuada perda de competitividade da indústria de transformação.
 
Andrey Rudakov/Bloomberg / Andrey Rudakov/Bloomberg
A estagnação da produtividade do trabalho na indústria tem feito com que, em certos círculos, discuta-se a tese de que para a indústria recuperar a sua competitividade é necessário, não uma desvalorização cambial, mas um "choque de produtividade". Para tanto, seria necessário um "choque de abertura comercial" onde o governo reduziria unilateralmente as alíquotas de importação para estimular a indústria a se tornar mais produtiva. É o velho diagnóstico de que a indústria é pouco competitiva porque inova pouco, e inova pouco porque está isolada da concorrência externa em função da proteção comercial.
 
Esse raciocínio é um grande absurdo, uma vez que a brutal apreciação da taxa real de câmbio nos últimos 10 anos atuou, de fato, como um "choque de liberalização comercial" sobre a indústria brasileira. Não é por outra razão que o coeficiente de penetração das importações - que mede o percentual do consumo doméstico que é atendido por importações - mais que dobrou no período 2004-2012.
 
É claro que é necessário estimular a inovação na indústria brasileira de transformação, mas deve-se ter em conta que os resultados de políticas de estímulo à inovação só serão obtidos num prazo de 5 a 10 anos. Até lá é possível, se o quadro atual não mudar, que sobre muito pouco ou quase nada do parque industrial brasileiro, que terá se transformado numa gigantesca maquiladora ou, pior, num grande entreposto de produtos importados.
 
A única forma de recuperar a competitividade da indústria brasileira a curto-prazo é por intermédio de uma desvalorização de, pelo menos, 30% da taxa nominal de câmbio. Está claro que, para que isso seja feito de forma responsável e com o menor impacto possível sobre a taxa de inflação, é necessário um maior rigor nas contas do governo, acabando-se definitivamente com os expedientes pouco ortodoxos de "maquiagem" das contas públicas usados recentemente. Mais do que isso, o governo precisa contribuir para o esforço de desenvolvimento da indústria e da economia brasileira por intermédio de um aumento da poupança pública.


Compartilhe:

<< Voltar

Nós usamos cookies em nosso site para oferecer a melhor experiência possível. Ao continuar a navegar no site, você concorda com esse uso. Para mais informações sobre como usamos cookies, veja nossa Política de Cookies.

Continuar