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Insatisfeito, Paraguai vive fase de 'desmercosulização'

Veículo: Valor Econômico
Seção: Brasil
 
Por Daniel Rittner | De Montevidéu
 
Os países do Mercosul devem fazer hoje, em reunião de cúpula dos presidentes que ocorre em Montevidéu, um gesto de estímulo à reincorporação do Paraguai ao bloco. A volta, no entanto, deve esbarrar agora na resistência das autoridades paraguaias.
 
"Existe a melhor disposição de todos os sócios do Mercosul", disse ontem o ministro das Relações Exteriores do Uruguai, Luis Almagro, anfitrião da cúpula, sobre a intenção de abrir as portas para o retorno do país vizinho.
 
O problema é, concretamente, como fazer isso. Desde junho do ano passado, quando o impeachment do então presidente Fernando Lugo foi classificado como "golpe de Estado" pelos membros do Mercosul, o Paraguai foi suspenso do bloco e banido de todas as suas reuniões. Não houve sanções econômicas ou comerciais, mas a ausência permitiu a entrada em definitivo da Venezuela no grupo - que, até então, estava pendente de um aval do Senado paraguaio.
 
A posse do presidente Horacio Cartes, que venceu eleições consideradas democráticas e transparentes pelo Mercosul, foi marcada para o dia 15 de agosto e deverá limpar o caminho à readmissão do país. "A expectativa é que o Paraguai possa se somar aos demais membros do Mercosul nas próximas reuniões", afirmou o chanceler brasileiro, Antônio Patriota, após um dia de intensas reuniões sobre o assunto.
 
Conforme fontes paraguaias, porém, Cartes é pressionado por aliados e pela maioria da opinião pública a rejeitar o convite de reincorporação nas atuais circunstâncias. O próprio presidente eleito rechaça que essa volta seja oficializada justamente durante a presidência temporária da Venezuela no Mercosul. Por isso, chegou a se movimentar nos bastidores para que o Paraguai assumisse a presidência rotativa do bloco a partir de 15 de agosto - como deveria ter ocorrido, em circunstâncias normais, no primeiro semestre.
 
Enquanto isso, o compromisso informal de Cartes era aprovar no Senado paraguaio a entrada da Venezuela no Mercosul, como se nada tivesse acontecido desde a queda de Lugo. Sem essas condições, os paraguaios sustentam que será muito difícil superar as resistências internas e retornar ao bloco. A tendência, dizem fontes do país vizinho, é que o governo Cartes aposte em um processo de "desmercosulização" - aproximando-se dos países que compõem a Aliança do Pacífico (México, Chile e Colômbia), nova rival do Mercosul na região.
 
Cartes teria demonstrado essa disposição em duas primeiras viagens ao exterior como vencedor das eleições presidenciais de abril. Foram visitas a Bruxelas e a Madri, nas quais o governo brasileiro foi apontado como principal responsável, ao lado da Venezuela, pelo endurecimento do Mercosul com o Paraguai.
 
Patriota deixou claro que a hipótese de evitar uma presidência venezuelana do bloco no segundo semestre não é considerada. "A transferência para a Venezuela é uma realidade", repetiu o chanceler um par de vezes, para demonstrar que o Mercosul está irredutível em passar o bastão a Caracas. Questionado sobre as supostas condições impostas por Cartes para o regresso, Patriota preferiu não comentar informações tidas como extra-oficiais. "Deixemos às próprias autoridades paraguaias que se manifestem."
 
Enquanto mantém o desfalque paraguaio, o Mercosul ganhou duas adesões de "membros associados", que precisam assumir o compromisso de livre comércio com os países do bloco para ganhar o direito de participar de seus fóruns políticos. Suriname e a Guiana tornam-se, hoje, os dois últimos países sul-americanos a entrar no bloco como associados.
 
Eles não compartilham, no entanto, uma tarifa de importação a produtos de fora do Mercosul - principal responsabilidade dos sócios plenos na chamada união aduaneira - e nem a obrigação de negociar em conjunto seus acordos comerciais. "Antes do fim desta década, teremos um espaço de livre comércio na América do Sul", disse Patriota, ressaltando que o cronograma de liberalização entre os países que ainda cobram tarifas entre si pode ser acelerado.


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