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Onda de protestos complica perspectivas de emergentes

Veículo: Valor Econômico
Seção: Notícias
 
Por Andrew Peaple | The Wall Street Journal
 
Será hora do investidor pular fora dos mercados emergentes?
 
Protestos nas ruas do Brasil e da Turquia, crise de liquidez no sistema financeiro da China, greves na África do Sul: tudo isso aponta para uma crescente tensão em nações em desenvolvimento. Some-se a isso sinais de que o banco central americano em breve poderia pisar no freio do programa de compra de títulos de dívida e o que se tem é um cenário bastante complicado para países que, na última década, responderam por cerca de 75% do crescimento econômico do planeta.
 
Em termos de desenvolvimento econômico e político, cada país desses tem uma situação particular. Em cada um, a revolta da população começou por coisas distintas: de tarifas de transporte coletivo no Brasil à ameaça de destruição de um parque na Turquia.
 
Desde a virada do século, no entanto, o investidor vem cada vez mais tratando os mercados emergentes como uma única categoria, coletivamente impulsionada por tendências favoráveis como a inserção da China no sistema mundial de comércio.
 
Conceitos como o do bloco Bric - a princípio, Brasil, Rússia, Índia e China; a África do Sul foi incluída mais tarde - consolidaram a tese de que países em desenvolvimento poderiam ser metidos num balaio só. Quem apostou nessa tese ganhou: o investimento nas bolsas, no câmbio e em títulos de dívida de mercados emergentes teve retornos de 19%, 6,8% e 11%, respectivamente, de 2003 a 2010, comparados com o ganho de 4,1% do índice de ações Standard & Poor's 500 no período, segundo a Goldman Sachs.
 
Mas os ventos a favor estão perdendo a força, expondo deficiências.
 
A atividade exportadora é um exemplo. A venda de bens para países desenvolvidos movidos a crédito ajudou países emergentes a reduzir o déficit na balança comercial e a aumentar o emprego, sobretudo antes da crise financeira mundial. Só que essa dinâmica hoje cessou. Uma leitura preliminar do nível de novos pedidos a exportadores, segundo o índice de gerentes de compras HSBC Markit para a China, caiu para 44 em junho (abaixo de 50 ele indica contração).
 
É claro que a economia europeia, moribunda, está abalando o comércio exterior. Mas mesmo a recuperação relativamente sustentada nos Estados Unidos vem se provando menos útil do que o esperado.
 
Como observou o estrategista do UBS Bhanu Baweja, o crescimento recente nos EUA se concentrou em indústrias como a da construção civil, a automobilística e a energética. São setores nos quais o país é relativamente autossuficiente ou depende mais de parceiros comerciais como a Alemanha. A demanda é menos robusta para bens como produtos elétricos, 11% de todas as exportações de mercados emergentes, ou vestuário, 4,2% do total. Isso enfraqueceu o elo normalmente forte entre o crescimento dos EUA e de mercados emergentes.
 
O papel duplo da China exacerbou os problemas de nações emergentes. Assim como outros países em desenvolvimento, a China se deu bem quando o movimento de exportações para economias desenvolvidas era forte. A expansão do investimento no país, por sua vez, fez o preço das commodities subir, o que contribuiu para nações exportadoras desses produtos, como o Brasil. E agora que o crescimento chinês está arrefecendo, Pequim quer reduzir a dependência da economia no investimento em ativos fixos.
 
A queda no crescimento alimenta a insatisfação popular. Na Turquia, o PIB cresceu 2,5% no ano passado, contra os 9,2% de 2010. No Brasil, o crescimento caiu de 7,5% para 0,9% no mesmo período. Na Rússia, que foi palco de protestos gigantescos no meio do ano passado, o crescimento caiu de 4,3% em 2010 e 2011 para 3,4% em 2012. O FMI acaba de rever a projeção de crescimento da Rússia para este ano de 3,4% para 2,5%.
 
A onda de protestos sugere que o governo desses países não fez o suficiente para resolver problemas estruturais durante a fase de vacas gordas. Nos últimos dez anos, todos os países do Bric caíram no índice de Percepção de Corrupção da ONG Transparência Internacional. E, embora a produtividade da mão de obra em países emergentes ainda cresça a um ritmo mais acelerado do a que de nações desenvolvidas, a diferença caiu nos últimos três anos. Seria, segundo o estrategista Baweja, do UBS, resultado da queda no ritmo de reformas econômicas.
 
Na questão da desigualdade, os dados são menos conclusivos. O coeficiente de Gini mede a desigualdade na distribuição da renda. No Brasil, o índice caiu para 0,51 em 2011 (em 2004, era de 0,55), segundo a Sedlac (Socio-Economic Database for Latin America and the Caribbean). Ou seja, o fosso entre ricos e pobres diminuiu. Mas ainda está bem acima da média de cerca de 0,3 dos membros da OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). O problema de países como o Brasil é que, quando a situação piora, essa discrepância fica mais evidente. Isso eleva o prêmio do risco político.
 
O retorno anualizado de bolsas de mercados emergentes já entrou em terreno negativo: de 2011 para cá, acumula queda de 6,3%. No caso do câmbio, a queda já soma 0,8%. O mercado de dívida segue relativamente forte, com alta de 7,3%. Seja como for, o S&P 500, que acumula alta de 12%, superou todos.
 
A alta no rendimento de obrigações do Tesouro americano só vai piorar as coisas, ao atrair mais dólares num momento em que países em desenvolvimento passaram a depender de financiamentos externos. A Turquia e a África do Sul parecem especialmente vulneráveis. A crise de liquidez na China resultou, em parte, de uma forte redução no ingresso de capital estrangeiro e da crescente preocupação com a inadimplência.
 
A volatilidade já vem causando estragos. Levou a Votorantim Cimentos a suspender uma oferta pública inicial de bilhões de dólares e a Rússia a cancelar dois leilões de títulos de dívida soberana. O movimento de aquisições de empresas de países do Bric já caiu 16% em 2013 em relação a 2012.

 



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