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Haddad neutraliza oposição do sindicato que mais para a capital

 

Veículo: Valor Econômico
Seção: Política
 
Por Raphael Di Cunto | De São Paulo
 
Responsável por uma das maiores crises da gestão Marta Suplicy (PT) na Prefeitura de São Paulo ao realizar greves que pararam a cidade no começo da década passada, o sindicato dos motoristas e cobradores de ônibus está perto de eleger sua nova diretoria. A eleição, que nos últimos anos já causou quase 20 mortes em disputas de poder, ocorrerá em meio à licitação para concessão das linhas de ônibus, principal causa dos protestos do sindicalistas há dez anos.
 
Sindicato dos motoristas/Divulgação / Sindicato dos motoristas/Divulgação
Haddad reúne-se com sindicalistas que desgastaram governo Marta com greves que paralisaram a cidade
 
Para evitar o desgaste vivido por sua colega de legenda, que não conseguiu se reeleger, o prefeito Fernando Haddad age para aproximar-se do sindicato. Primeiro, apoiou a eleição de um diretor da entidade para vereador pelo PT. Na semana passada, em evento fora da agenda oficial, reuniu-se com sindicalistas e empresários e ajudou na negociação salarial, o que resultou em aumento de 10%, o maior desde que foi criado o Plano Real, em 1994, se descontada a inflação. O aumento ocorrerá junto ao reajuste da tarifa de ônibus.
 
Agora, articula para que a Central Única dos Trabalhadores (CUT), ligada ao PT, componha com uma das chapas na eleição do sindicato. Se isto prosperar, será a primeira vez na história que a central não disputará com candidato próprio. Atualmente ligado à Nova Central, o sindicato foi filiado à CUT nos anos 1990 e mudou para a Força Sindical em 2001, no início do governo Marta, quando começaram os conflitos por causa da licitação.
 
A eleição no sindicato, que ocorrerá até novembro, costuma ser tumultuada. A Polícia Civil investiga quase 20 mortes que teriam sido encomendadas por sindicalistas para eliminar rivais nas últimas duas décadas. Há também inquérito sobre a ligação de dirigentes com o Primeiro Comando da Capital (PCC). Em 2004, no auge da crise nos transportes, a eleição da categoria teve até debates transmitidos pela TV Globo.
 
Na época, Marta, que governou de 2001 a 2004, viveu em constante enfrentamento com os sindicalistas e empresários. Foi ameaçada de morte, passou a usar colete à prova de balas e acusou o sindicato de locaute - greve influenciada por empresários. A entidade diz que as paralisações eram justas: 15 mil trabalhadores teriam sido demitidos e ficaram sem receber com a troca das operadoras de ônibus.
 
"Os trabalhadores fizeram a campanha da Marta Suplicy, mas depois se sentiram apunhalados ", afirma o deputado estadual Alcides Amazonas (PCdoB), ex-secretário do sindicato e que foi vice-líder da ex-prefeita na Câmara Municipal durante a crise. Nos quatro anos de governo Marta foram mais de 200 greves - nove paralisações gerais, que prejudicaram cerca de 3 milhões de pessoas e mancharam a imagem da ex-prefeita, que tinha como marcas a melhoria dos ônibus e o Bilhete Único.
 
O embate levou ainda à queda do então secretário de Transportes, o hoje deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP). Ele foi acusado por um empresário de desviar dinheiro do sistema para pagar as empresas. Reagiu dizendo que a denúncia era uma artimanha do sindicato e dos empresários para impedir a licitação, mas deixou o governo logo depois da denúncia, que não teve prosseguimento na Justiça.
 
Em meio às brigas, Marta acusou o sindicato de locaute, desvio de dinheiro e dano ao patrimônio público. A denúncia levou à prisão de 17 sindicalistas que, dez anos depois, ainda não foram julgados. Grande parte deles está na cúpula da entidade até hoje, como presidente, Isao Hosogi. O secretário de Transportes também é o mesmo daquela época: Jilmar Tatto (PT), que substituiu Zarattini.
 
Tatto é um dos principais responsáveis pela aproximação. Foi pela corrente dele no partido, a PT de Lutas e Massas, que o diretor de esportes do sindicato, Valdemar Silva, concorreu a vereador e foi eleito. Segundo Vavá, isso fez com que o sindicato apoiasse Haddad desde o primeiro turno. "Antes não tinha essa aproximação com o PT. A ponte quem fez fui eu, com a minha candidatura", diz.
 
Em outra frente, a CUT nacional ordenou que a central não tenha chapa própria, apesar da pressão de parte da base. Nas duas últimas eleições, o candidato foi um petista ligada à família Tatto, João Delfino (PT), mas a tendência, segundo o Valor apurou, é fechar com o atual presidente desta vez. Em nota, Tatto negou a articulação e disse que o sindicato é independente.
 
Carlos Silvestri, assessor da presidência da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes da CUT, nega pressão da prefeitura e do PT e diz que a central achou mais vantajoso negociar desta vez porque "venceu nas outras e não levou". A atual diretoria do sindicato afirma, porém, que o candidato da CUT assinou a ata reconhecendo o resultado da eleição em 2008.
 
Segundo Silvestri, a central exige, para apoiar uma das chapas, que a categoria não seja usada para derrubar governo. "Não queremos que o sindicato atenda a interesses partidários, mas também não podemos aceitar que seja instrumento para desestabilizar governo, como já vimos acontecer em São Paulo", afirma.
 
Há um mês, em plenária na sede do sindicato para divulgar os planos da prefeitura, Tatto afirmou que o prefeito não aceitaria paralisações. "Para parar garagem tem que ser questão extrema, a gente não vai admitir greve", afirmou.
 
A declaração é usada pela oposição à diretoria do sindicato para reforçar o discurso de que o atual presidente tem um acordo com Haddad. "Os empresários e o secretário de Transportes querem a manutenção do presidente, que é mais maleável e já tem compromisso firmado de não fazer greve", afirma o secretário de Finanças, Valdevan dos Santos. Ele lançou-se candidato pela União Geral dos Trabalhadores (UGT), central ligada ao PSD do ex-prefeito Gilberto Kassab, e diz ter o apoio do vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB) - que nega.
 
Desde 2005 na presidência do sindicato, Isao Hosogi diz que a postura grevista foi deixada de lado em sua gestão, mesmo com a "falta de diálogo" da gestão Kassab, mas nega qualquer acordo. "Sou pessoa de conversa, até porque entendo que a população não pode pagar pelo capricho de algumas pessoas", afirma, dizendo que houve aumento real dos salários na maioria dos anos.
 
Para Vavá, o sindicato teve que encontrar outras formas de fazer suas reivindicações porque ficou com o nome manchado depois das prisões. Mas, diz, ainda tem força. "Esse sindicato tem controle da base. Se mandar começar mobilização, começa. Se mandar parar greve, para. Quem não quer ter um sindicato destes como aliado?"
 


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