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Inflação pesa no bolso e ameaça comprometer resultado trimestral

 

Veículo: Valor Economico
Seção: Empresas
 
Por Natalia Viri e Daniela Meibak | De São Paulo
 
A inflação, que se refletiu nos custos e arranhou a rentabilidade das companhias abertas no ano passado, pode comprometer as vendas de empresas de bens de consumo. Os balanços do primeiro trimestre divulgados até sexta-feira indicam que a capacidade de repasse de preços sem uma contrapartida em redução de volumes pode estar se esgotando.
 
O recado mais claro veio das empresas de alimentos e bebidas, itens em que o avanço dos preços foi mais pronunciado.
 
As vendas de cerveja da Ambev caíram 8,2%, frustrando as projeções mais pessimistas. No caso da fabricante de alimentos BRF - dona das marcas Sadia e Perdigão -, o aumento de 4,2% nas receitas no mercado interno foi garantido apenas pelo avanço dos preços, que subiram em média 12,6%.
 
Em teleconferência sobre os resultados, o presidente da BRF, José Antônio do Prado Fay, disse que está bastante preocupado com a resistência da inflação de alimentos e seu impacto sobre a demanda. "Existe sensibilidade do consumidor na questão dos preços", ressaltou.
 
O presidente da Ambev, João Castro Neves, também afirmou que o começo do ano foi mais desafiador que o esperado e citou a inflação de alimentos como uma das responsáveis pela queda nos volumes, ao lado do Carnaval antecipado, do clima ruim e do crescimento menor da renda do brasileiro. O executivo descartou novos aumentos de preços ao longo do ano e afirmou que a empresa pretende focar em rentabilidade, com venda de produtos de maior valor agregado.
 
Além do nível de preços já elevado, a conjuntura econômica como um todo dificulta o repasse de preços, afirma Mariana Oliveira, analista da Tendências Consultoria. "Boa parte da renda do brasileiro está comprometida com o pagamento de dívidas e a inadimplência segue elevada. O empresário só consegue repassar preços quando há alguma folga no orçamento, e esse não é o caso", afirma. A analista lembra que a inflação de alimentos teve uma dispara no começo do ano e que foi uma das principais responsáveis pelo forte avanço do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no período.
 
De acordo com cálculos da Tendências, os preços de itens não duráveis ficaram 4% acima do nível de preços geral da economia em janeiro e a inflação do setor ficou 1,1 ponto percentual acima do IPCA no período. Em fevereiro, o preços de alimentos, bebidas e itens de supermercado subiram 0,7 ponto percentual mais que a inflação média do mês.
 
 
As vendas de lojas abertas há mais de um ano da operação alimentar do grupo Pão de Açúcar, por exemplo, subiram 6,4% no primeiro trimestre frente ao mesmo período de 2012, praticamente empatando com a inflação no período.
 
O cenário de preços altos trouxe impactos para o bolso do consumidor, que já mudou alguns hábitos. "As pessoas que estavam começando a pegar produtos de valor mais agregado, que geram margem maior para as empresas, acabaram trocando por itens mais baratos. Já conseguimos ver isso no desempenho das empresas", afirma Gabriel Ribeiro, analista da Um Investimentos.
 
O impacto da inflação na demanda do varejo, no entanto, pode ser sentido além do setor de supermercados e alimentos. A fabricante de produtos de limpeza, higiene pessoal e medicamentos Hypermarcas sinalizou que os varejistas estão mais conservadores neste ano, evitando formar grandes estoques para gerir de forma mais cautelosa seu capital de giro. "Se o cenário macroeconômico persistir muito incerto, há propensão de os clientes continuarem avessos ao risco", afirmou o presidente da companhia, Claudio Bergamo, a investidores.
 
O desempenho da fabricante de cosméticos Natura também deixou a desejar. As receitas no Brasil subiram apenas 2,1% no primeiro trimestre frente ao mesmo período de 2012, bastante abaixo da taxa de 8,3% verificada um ano antes. Túlio Queiroz, diretor financeiro da Guararapes, dona da rede de varejo têxtil Riachuelo, afirmou na teleconferência sobre os resultados que a inflação é o principal risco macroeconômico para o setor de vestuário neste ano. Segundo o executivo, desde o início do segundo semestre do ano passado, o ambiente inflacionário teve impacto negativo no consumo de moda.
 
No mercado, os analistas se dividem quanto às perspectivas para o setor. O banco HSBC é um dos mais otimistas e mudou a composição da sua carteira recomendada, incluindo varejistas têxteis como Renner e Marisa, à espera de uma trégua da inflação. Luiz Stulhberger, gestor do renomado Fundo Verde, do Credit Suisse Hedging-Griffo, vai na contramão. Em sua carta aos cotistas deste mês, ele afirma que não acredita em um abrandamento da inflação e ressalta que o mercado tem sido muito "leniente" quanto a esse risco.
 
O chefe de análise do BB Investimentos, Nataniel Cezimbra, afirma que ainda é cedo para afirmar se a tendência de vendas mais enxutas deve se manter neste ano. Mas ressalta que a capacidade dos gestores em pilotar as empresas no cenário mais adverso vai ser colocada à prova pelos investidores. "O foco vai ser na margem. As empresas não vão se estocar e vão ter muito menos investimento em expansão para garantir rentabilidade", afirma. (Colaboraram Adriana Meyge, Fernando Torres e Marina Falcão)

 



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