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Metade dos pedidos de barreiras contra bens importados não vira investigação

Veículo: Valor Economico

Seção: Brasil
 
Por Sergio Leo | De Brasília
 
 
Ruy Baron/Valor / Ruy Baron/Valor
Tatiana Prazeres: "Baixada a poeira, vê-se que há pleitos sem fundamento"
 
Quase metade dos pedidos da indústria brasileira para barreiras contra importados é rejeitada ou retirada pelos próprios empresários, antes mesmo de se transformarem em investigação no Ministério do Desenvolvimento, informou ao Valor a secretária de Comércio Exterior, Tatiana Prazeres.
 
A maioria dessas petições é arquivada após uma análise inicial, por não conseguir provar que as importações, mesmo em alta, foram a causa de problemas para seus competidores no Brasil, ou causaram dano à produção nacional. "É uma angústia da indústria que chega até nós. O empresário vê o mercado crescer e seu crescimento não acompanha a demanda", diz Tatiana.
 
Das 497 petições encaminhadas desde 2005 ao Ministério de Desenvolvimento, 210 já foram indeferidas ou retiradas pelos empresários, ao constatar que tinham poucas chances de obter barreiras contra os importados, em produtos como manufaturados de cobre. Foram abertas 250 investigações, e 34 estão em análise. Num indício de que o governo segue critérios técnicos para avaliação das barreiras comerciais contra a competição desleal, das 480 investigações abertas contra importados, desde 1988, 162, um terço do total, terminaram sem aplicação de medidas contra a concorrência estrangeira, 37 delas desde 2011.
 
"Quando chegamos à secretaria, havia quase uma histeria contra os chineses", lembrou a secretária. "Baixada a poeira, vê-se que há alguns pleitos sem fundamento. A indústria entendeu a linha de atuação do governo, nossos critérios e viu o esforço para arrumar a casa, contratar gente. " Desde 2011, foram criados 120 novos cargos de analistas de comércio exterior e o governo acelerou prazos para as investigações, ampliando ações como a repressão a falsas declarações de origem de produtos, usadas para fugir a sobretaxas em casos de dumping (venda a preços abaixo do normal).
 
Na recente reunião do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), com autoridades e representantes da indústria e de sindicatos no Ministério do Desenvolvimento, os empresários se concentraram em temas como a chamada facilitação de comércio, com remoção de obstáculos ao trânsito de mercadorias - burocracia nas fronteiras e dificuldades logísticas, de acesso a portos, por exemplo.
 
Uma das únicas demandas por defesa comercial foi levantada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que, com base em um estudo comprovando o forte apoio oficial chinês a seus exportadores, sugeriu maior esforço contra subsídios dados pela China a exportadores locais, potencial alvo de medidas compensatórias (sobretaxas) por parte dos concorrentes no Brasil.
 
Tatiana concorda com a necessidade de atuar contra os subsídios desleais e estimula os empresários a acionarem o ministério contra esse tipo de concorrência externa. Em 2011, o governo abriu, a pedido da indústria, cinco investigações de medidas compensatórias contra produtos estrangeiros acusados de subsídios proibidos pela Organização Mundial do Comércio (OMC), a primeira delas contra filmes PET importados da Índia.
 
Quatro dessas investigações resultaram em sobretaxas aplicadas a partir de 2012. Apenas uma foi rejeitada pelos técnicos. As empresas precisam, no entanto, equipar-se para mostrar que a concorrência tem afetado suas vendas no mercado interno.
 
Para o presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, cujo setor é protegido desde março de 2010 por uma sobretaxa antidumping de R$ 13,85 em cada par de calçado importado da China, o sistema de defesa comercial ainda exige aperfeiçoamentos, por não prever estratégias dos concorrentes estrangeiros contra as barreiras impostas a exportações desleais. "O governo está correto ao procurar operar de forma a não criar condições de contestação na OMC", diz. "Mas é preciso criar mecanismos de resposta mais eficazes para práticas como a falsa declaração de origem."
 
Klein discutiu na semana passada com o Departamento de Defesa Comercial (Decom), do Ministério do Desenvolvimento, mudanças na regulamentação de controle das importações, para determinação da real origem dos produtos. Calçados produzidos na China são transportados em partes para montagem no Vietnã ou Taiwan e então reexportados ao Brasil, fugindo da tarifa antidumping. A Abicalçados diz que houve "boa receptividade" do Decom à sugestão de alterar o modo de aferição, determinando a origem dos produtos de acordo com o país de onde se origina o cabedal, a parte superior, mais nobre, do calçado.
 
O diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel, argumenta que setores com produção muito dispersa enfrentam mais dificuldades em comprovar danos, mesmo quando dados agregados mostram aumento de importações e queda na produção. "É difícil comprovar, em nível microeconômico, a situação de queda de produção e surto de importações que mostram os dados macroeconômicos", diz.
 
A falta de competitividade criada com o real valorizado em relação ao dólar e as dificuldades logísticas exigem medidas mais "assertivas" de proteção contra a concorrência estrangeira, como fez o governo ao impor um maior Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) aos automóveis sem fabricação no país, diz Pimentel, que elogia, porém, o modelo "democrático, com consultas públicas a todos os interessados", usado para as medidas de defesa comercial.
 


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