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Inflação alta afeta vendas do comércio

 

Veículo: Valor Econômico
Seção: Brasil
 
Por Juliana Elias e Lucinda Pinto | De São Paulo
 
Com preços em alta, as famílias já começam a comprar menos. É o que aponta a Pesquisa Mensal do Comércio, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o levantamento, o volume de produtos vendidos em fevereiro pelo comércio restrito, que não considera cadeia automotiva e materiais de construção, caiu 0,4% em relação a janeiro, na série com ajuste sazonal, e recuou 0,2% na comparação com fevereiro de 2012. Por outro lado, a receita nominal cresceu 0,6% sobre janeiro e foi 7,6% superior a fevereiro de 2012.
 
"O varejo vinha crescendo mês a mês, e agora estancou. Isso acontece porque a inflação está muito alta", diz Fábio Ramos, analista da Quest Investimentos.
 
O impacto da inflação foi mais forte no segmento de hipermercados e supermercados, que inclui produtos alimentícios, bebidas e fumo, com queda de 2,1% em volume ante fevereiro de 2012, a maior nesse tipo de comparação desde novembro de 2003. Por outro lado, a receita do segmento cresceu 9,3% no mesmo período. Na prática, isso significa que os consumidores desembolsaram mais, mas levaram menos produtos para casa.
 
É no grupo alimentos que a inflação está mais alta - 13,48% em 12 meses no IPCA, o índice oficial de preços, até março -, bem acima da inflação geral, que ficou em 6,59% no período, rompendo pela primeira vez desde 2011 o limite da meta estipulada pelo governo, uma banda que tolera de 2,5% a 6,5% ao ano.
 
Fernanda Della Rosa, economista da FecomercioSP, entidade que reúne as empresas do setor no Estado de São Paulo, aponta ainda para o fato de que a inflação alta, além de corroer diretamente o poder de compra, também dificulta o pagamento de dívidas acumuladas, o que tem feito o nível de endividamento subir. "Com produtos de necessidade básica mais caros, caso dos alimentos, sobra menos dinheiro para que as pessoas paguem suas dívidas", diz. "O número de famílias endividadas está estável, e em um patamar razoável, mas a porcentagem da renda de comprometida com dívidas subiu."
 
Segundo pesquisa mensal da FecomercioSP, 52% das famílias da cidade de São Paulo possuíam algum tipo de dívida em março, praticamente o mesmo nível de 52,3% registrado um ano antes. Já a parcela daqueles que, dentre os endividados, estão com mais de 50% do orçamento comprometido sobe mês a mês. Saiu de 14,8% em junho, o piso do ano passado, para 21,8% em março. "Foi justamente o período em que a inflação começou a aumentar", diz Fernanda. Em junho de 2012, o IPCA em 12 meses era de 4,92%, também o piso do ano. O resultado é uma renda cada vez mais corroída tanto por dívidas quanto pela inflação, e cada vez menos renda disponível para a compra de outros bens.
 
A menor renda disponível após as despesas com alimentos, pode explicar a queda em três dos outros sete grupos pesquisados pelo IBGE, além dos supermercados: na comparação de fevereiro de 2013 contra fevereiro de 2012, o volume de vendas caiu em combustíveis e lubrificantes (-2,1%), móveis e eletrodomésticos (-1,0%) e de tecidos, vestuário e calçados (-1,1%).
 
Jankiel Santos, economista-chefe do Banco Espírito Santo (BES), lembra ainda que os preços dos alimentos não são os únicos a pressionar no varejo. "Não adianta dizer que a culpa é apenas dos alimentos, ou de um produto ou outro, como o tomate. A alta é generalizada e atinge tanto os produtos que dependem apenas de renda quanto os que dependem de crédito", disse. Levantamento feito pelo banco mostra que, até janeiro, a inflação acumulada em 12 meses dos produtos ligados à renda, grupo majoritariamente formado pelos alimentos, é de 12,5%, enquanto a daqueles que dependem mais de crédito, como eletrodomésticos e eletroeletrônicos, é de 4,3%.
 
Entre os fatores para isso, está principalmente o câmbio, que, após um processo de valorização no ano passado, puxou também o preço de bens de consumo e outros importados, como os eletrônicos, para cima. "O preço de computadores, que costumava cair 10% ao ano com o avanço da tecnologia, não cai mais de 2% agora, por conta do câmbio alto", disse Ramos, da Quest. "É o comportamento desse tipo de produto que antes segurava a inflação do varejo, e que agora também não está mais ajudando."
 
A Quest também olhou para a inflação do varejo e concluiu que chegou a 7,8% nos 12 meses encerrados em fevereiro, acima dos 6,3% do IPCA. A conta considera alimentos, eletrônicos e outros bens.
 
Para Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg & Associados, os resultados do varejo em fevereiro bastante abaixo do esperado pelo mercado - a estimativa apurada pelo Valor Data era de alta de 1,6% ante janeiro - reforça o alerta de que o Banco Central deve aumentar a Selic, a taxa básica de juros. "A questão da inflação já começou a prejudicar o volume de vendas e essa queda mostra uma atividade com dificuldade de reação", disse. A Rosenberg prevê que o BC aumente a Selic em 0,25 ponto percentual na quarta-feira, e, no total, eleve a taxa dos atuais 7,25% para 8,5% este ano.


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