Notícias

Indústria segura importações, mas déficit ainda cresce

Veículo: Valor Econômico
Seção: Brasil

O déficit da balança comercial da indústria de transformação continuou a crescer neste ano, apesar do fraco desempenho do setor. A deterioração neste ano, porém, é resultado da queda de exportação. Até o ano passado, a elevação do déficit acontecia porque as importações cresciam em ritmo mais acelerado que o das vendas ao exterior.

Levantamento do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) mostra que o déficit da indústria de transformação se aprofundou, saindo de US$ 37,7 bilhões de janeiro a setembro de 2011 para US$ 41,5 bilhões nos mesmos meses deste ano. A redução dos embarques foi o que mais contribuiu para a maior deterioração do saldo comercial do segmento. O levantamento do Iedi, elaborado pelo economista Daniel Keller, mostra que de janeiro a setembro os embarques da indústria de transformação tiveram queda de 3,7% em relação a igual período de 2011. A importação se manteve estável, com crescimento de 0,1%.

"Trata-se de uma mudança, porque o que provocava o déficit até o ano passado era a intensa elevação das importações", diz Julio Gomes de Almeida, professor da Universidade de Campinas (Unicamp). Dados do Iedi mostram que a importação da indústria de transformação cresceu a cada ano desde 2004. A única queda no período foi em 2009, quando a crise financeira global afetou a demanda doméstica e o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil caiu 0,3%.

Ao levantar dados da indústria segmentada de acordo com o fator de produção preponderante, o estudo do Iedi mostra que a queda da importação aconteceu principalmente na indústria de agroalimentos, com redução de 9,7% de janeiro a setembro deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado. Outros dois setores - intensivos em recursos minerais e em recursos energéticos - tiveram quedas menores de 2,6% e 2,7%, respectivamente. Esses dois segmentos são representativos na pauta de importação e respondem por uma fatia de 18,3% dos desembarques totais da indústria de transformação.

A queda está relacionada, diz Almeida, à redução de preços das commodities, que são insumos preponderantes para esses segmentos. Foi a mesma redução que contribui bastante para o menor valor desembarcado de produtos primários agrícolas, minerais e energéticos. De acordo com o levantamento do Iedi, o desembarque de produtos energéticos caiu 4,4% de janeiro a setembro deste ano. O de produtos primários minerais teve queda de 13,9%.

O que chama a atenção, diz o professor da Unicamp, é, em sentido inverso, a elevação da importação na indústria intensiva em mão de obra. Isso indica que apesar das medidas do governo e do câmbio mais desfavorável às importações, a indústria intensiva em trabalho continua sofrendo forte competição dos importados.

Na divisão feita pelo Iedi por fatores de produção, a indústria intensiva em trabalho foi a que mais sofreu com elevação de importação de janeiro a setembro deste ano, com aumento de 3,3% na comparação com os mesmos meses do ano passado. O comportamento foi inverso não só à evolução dos desembarques da indústria de transformação como também às importações totais do país, que na mesma comparação caíram 1,2%.

Ao mesmo tempo em que sofrem com a concorrência dos importados, os segmentos industriais intensivos em trabalho, aponta Almeida, ainda seguem com dificuldades para exportar. A pesquisa do Iedi mostra que a indústria intensiva em mão de obra exportou no acumulado até setembro um total de US$ 8,2 bilhões, o que significa redução de 7% em relação ao mesmo período do ano anterior. A indústria intensiva em escala exportou no mesmo período US$ 25,2 bilhões, com queda de 7,7% na mesma comparação.

Tanto a indústria intensiva em trabalho como a intensiva em escala tiveram desempenho pior que o total da indústria de transformação, que também apresentou decréscimo na exportação, mas em nível menor, de 3,7%. A redução média do total exportado pelo Brasil no período foi de 4,9%, incluindo os produtos não industrializados. Os setores da indústria intensivos em trabalho e em escala são responsáveis por cerca de 20% do total embarcado no país.

Entre os principais setores da indústria intensiva em trabalho estão calçados, vestuário, têxtil brinquedos e material gráfico, entre outros. A queda expressiva na exportação dessas áreas, diz Almeida, mostra que as medidas do governo para reduzir custos de produção e aumentar exportação ainda não fizeram tanta diferença. Pesa ainda, explica, a dificuldade para aumentar a exportação em um momento de desaceleração da demanda internacional.

No caso da indústria intensiva em escala, diz Almeida, há ainda um problema mais localizado nas economias latino-americanas, que costumam ser destino dos produtos dessa área. Entre os segmentos mais importantes dos intensivos em escala estão o setor automobilístico, de autopeças, a indústria siderúrgica, de ferramentaria, de televisores, de cal e cimento e de artigos de borracha.

Apenas setores pontuais, como a indústria intensiva em pesquisa e desenvolvimento (P&D), tiveram maior êxito na exportação. Esse segmento embarcou até setembro US$ 9,1 bilhões, com alta de 11,7% em relação ao mesmo período de 2011. Mas o que fez diferença nos intensivos em P&D, diz Almeida, foi a fabricação de aeronaves, embora esse setor inclua também a indústria de instrumentos médicos e ópticos, a farmacêutica, de produtos químicos e de semicondutores, entre outros.

Para Almeida, três fatores influenciaram a falta de reação da indústria na exportação. Segundo o professor, há ainda um problema de desestruturação em alguns segmentos industriais que precisam ser resolvidos ao longo do tempo. Num prazo menor, as medidas do governo ainda não deram resultado total. A desoneração de folha ainda não surtiu todo o efeito e algumas medidas deverão entrar em vigor somente no ano que vem, como a redução da tarifa de energia elétrica. Além disso, diz o economista, alguns instrumentos precisam ser refinados. O Reintegra, que concede crédito tributário equivalente a 3% do valor exportado, é um deles. "Um benefício com prazo curto não é embutido pelas empresas na formação do preço."

A redução da exportação e seus efeitos na balança comercial total do Brasil, diz Almeida, não está restrita ao setor industrial. Na verdade, foram os produtos primários minerais - como o minério de ferro, principalmente -, que mais contribuíram para a queda das exportações.

De janeiro a setembro deste ano, os embarques de produtos primários minerais somaram US$ 27 bilhões, o que representa decréscimo de 23,4% em relação ao mesmo período do ano passado.

 


 



Compartilhe:

<< Voltar

Nós usamos cookies em nosso site para oferecer a melhor experiência possível. Ao continuar a navegar no site, você concorda com esse uso. Para mais informações sobre como usamos cookies, veja nossa Política de Cookies.

Continuar