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Exportadores usam 'novo' câmbio para recuperar margem

Eduardo Zappia/Valor / Eduardo Zappia/Valor
 
Marcello Stewers, vice-presidente da Teka: com o preço atual do dólar, o mercado externo começa a ficar mais atrativo.

As empresas exportadoras aproveitaram a mudança de patamar do câmbio para aumentar a margem de lucro nas vendas ao mercado externo. Esse ganho veio da desvalorização da moeda brasileira que, em termos reais, sofreu uma desvalorização de 14% em relação a uma cesta de moedas e de quase 19% em relação ao dólar desde fevereiro. Apesar deste ganho, ainda há certa cautela entre algumas empresas consultadas pelo Valor. Para adotar políticas mais agressivas para o mercado internacional - como redução do preço em dólar ou reforço das equipes de venda - os exportadores aguardam sinais mais evidentes de que a taxa de câmbio ficará nesse patamar, ou acima dele, por um longo período.

Poucas empresas relatam que já aproveitaram o novo câmbio para reduzir seus preços em dólar, como é o caso da Döhler, do setor de cama, mesa e banho. Segundo Carlos Alexandre Döhler, diretor comercial, uma parte do ganho com a depreciação cambial foi repassada aos preços, que em dólar caíram entre 10% e 12%, segundo o executivo. Com isso, explica, foi possível aumentar o volume físico de exportações no segundo trimestre, em relação a igual período do ano passado, apesar dos problemas enfrentados com as barreiras ao comércio com a Argentina. Hoje, cerca de 10% da produção da companhia é destinada à exportação, mas o objetivo é elevar essa parcela para algo mais próximo de 15% nos próximos cinco anos.

Segundo Döhler, além da mudança de patamar da taxa de câmbio, a desoneração da folha de pagamentos em troca da alíquota sobre o faturamento também elevou a competitividade da empresa e permitiu que as vendas externas sejam realizadas com margens mais elevadas do que as domésticas, relação que se alterou entre março e abril, diz o empresário.

Fabricante de componentes para o setor automotivo, a Tupy tem nas vendas ao exterior metade do faturamento do ano. Só em 2011, elas renderam cerca de US$ 600 milhões à empresa, segundo o vice-presidente Fernando Cestari de Rizzo. É política da empresa fazer um "colchão" contra a variação cambial. Por contrato, o comprador externo arca com parte da desvalorização ou apreciação do real. Mesmo não recebendo a rentabilidade inteira que o dólar mais caro proporcionou, a Tupy comemora a desvalorização do real.

A competitividade que o câmbio a R$ 2 trouxe permite à Tupy recuperar espaço em um mercado que havia perdido. "Estamos aumentando a carteira de exportação, principalmente em produtos mais simples, que haviam perdido competitividade." Nos últimos anos, a empresa focou a exportação nos produtos de maior valor agregado como estratégia para compensar a valorização do real.

Como na Tupy as importações não são muito significativas, o custo de produção não foi impactado pelo dólar mais valorizado. O ganho geral deve ir para a margem de lucro da empresa, que ainda assim não deve aumentar muito em relação ao ano passado. "O mesmo fenômeno que causou a desvalorização também diminuiu a demanda: a economia mundial está desacelerando, o que torna mais difícil exportar", diz Rizzo.

Na temporada de balanços do segundo trimestre, o efeito da desvalorização do real também foi sentido por empresas em que a participação das receitas com vendas externas é significativa. A WEG, fabricante de equipamentos eletroeletrônicos, vendeu R$ 799 milhões no mercado externo no segundo trimestre deste ano, 44,3% a mais do que em igual período do ano passado. O câmbio teve participação relevante neste aumento - como medida de comparação, as vendas em dólares subiram bem menos no período, com alta de 17%. O movimento levou a uma virada inédita para a companhia, em que o mercado externo passou a representar a maioria das vendas, 52%.

A Grendene, líder na exportação de calçados brasileiros, também enfatizou em seu balanço a perda recente de valor do real como um aspecto positivo no segundo trimestre. De acordo com a companhia, a receita bruta de exportação subiu 43,1% antes de considerar o efeito cambial e 76,1% quando a desvalorização do câmbio é levada em conta, sempre na comparação com o mesmo trimestre de 2011.

A desvalorização do real deve ajudar a Teka, que fabrica produtos de cama, mesa e banho, a manter o mesmo nível de faturamento do ano passado. Segundo o vice-presidente da empresa, Marcello Stewers, o dólar mais caro diminuiu a atratividade dos importados e ajudou as vendas ao exterior a se manterem no mesmo nível de 2011. As exportações, que representam 7% da receita da companhia, ficaram mais rentáveis desde o começo do ano, ganho que deve ir direto para o caixa.

Como os contratos de compra e venda duram em média seis meses, a Teka está esperando o dólar se estabilizar no novo patamar para começar a adotar uma tática mais agressiva para as exportações. "Ficamos felizes com a desvalorização, mas tem que esperar para ver até onde isso vai. Não adianta fechar contrato agora se no fim do ano, na hora em que fecha o câmbio, o dólar estiver mais barato novamente. Com esse preço atual, o mercado externo começa a ficar mais atrativo", afirma Stewers.

No mercado interno, no entanto, os efeitos são menos perceptíveis. A Leppel, também do setor de cama, mesa e banho, exporta uma parcela ínfima de sua produção, por isso o novo câmbio não afeta seu resultado. Osmair Rossi, diretor-financeiro da empresa, acredita que nos próximos meses, à medida que os revendedores de produtos importados se desfaçam de seus estoques, os desembarques do exterior terão que ser vendidos a preços mais elevados, por causa da desvalorização do real. Esse movimento pode abrir espaço para a empresa recompor preços e margens no Brasil.

A estabilização do dólar na faixa do R$ 2 permitiu à Digicon, de Gravataí, no Rio Grande do Sul, recuperar nos últimos meses parte das margens perdidas ao longo de pelo menos três anos sem reajustes dos preços em dólar e euro dos produtos exportados. Segundo o diretor de operações Peter Elbling, as tabelas não foram alteradas em função da variação cambial e agora os ganhos com as vendas externas já se aproximam dos obtidos no mercado interno.

A Digicon exporta principalmente peças para a indústria aeronáutica e controladores de acesso (catracas) para cerca de 30 países. Conforme Elbling, o câmbio mais favorável também deve elevar de 15% para 18% a participação das vendas externas sobre o faturamento da empresa neste ano, que tem estimativa de expansão de 20% sobre a receita bruta de R$ 51 milhões apurada em 2011.

A América Latina absorve a maior parte das exportações da empresa, mas a Europa, que fica com uma fatia de 5% a 6%, também está comprando mais apesar da crise na região, afirmou o executivo. A alta no primeiro semestre chegou a aproximadamente 5% ante igual período de 2011, favorecida principalmente pela abertura de um centro de distribuição na Alemanha, no fim do ano passado.

Paulo Eduardo Pinto, diretor da Trading Transaex, diz que também está aproveitando a desvalorização do real para aumentar sua margem, visto que as exportações da empresa caíram 30% em valor na comparação de 2011 com o ano anterior. Segundo ele, a empresa pretende aproveitar o câmbio depreciado para terminar 2012 com estabilidade nas exportações e criar um cenário favorável para que os embarques aumentem fortemente no próximo ano.

Veículo: Valor Econômico
Seção: Brasil


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