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Estoque e fluxo

Veículo: Brasil Econômico
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O tema é econômico, mas a solução é política. Essa é uma decorrência da natureza da crise, tal como se apresenta nos EUA e na Europa. É uma crise da riqueza acumulada nas duas últimas décadas que agora tem seu valor questionado.

Como Keynes advertira e Minsky reafirmou, toda formação de novos ativos deixa um rastro de dívidas que financiou a acumulação da riqueza. A economia ortodoxa quer fazer crer que os impasses atuais decorrem do super endividamento dos setores públicos dos países desenvolvidos, mas nada é mais falso.

A dívida soberana não foi causa, mas, sim, avolumou-se a partir da crise da riqueza privada, através da estatização da dívida que se seguiu às necessárias políticas de gasto público de 2008 e 2009 para evitar uma depressão e, ainda, derivam das operações de salvamento dos bancos.

Estes estão no epicentro da crise, seja porque a nova riqueza formada é também representada por capital fictício (títulos das instituições financeiras), seja porque, como observado, foram os bancos os financiadores da riqueza que os agentes privados imaginavam estar acumulando.

Sendo uma crise de ativos e de dívidas, sua solução escapa da alçada das corriqueiras ações cíclicas de política econômica, vale dizer, do manejo na margem das políticas fiscal e monetária.

Isto se deve ao fato de que a queima de ativos e dívidas, que a esta altura é inevitável como condição para superação da crise mundial, não será obtida, como já havia mostrado John Hicks, por sucessivos ajustes de fluxo, dada a magnitude excepcional da acumulação de ativos e dívidas podres.

Em outras palavras, as avaliações sobre a capacidade de um país como, por exemplo, Grécia (ou outro país europeu), honrar seus compromissos não depende de qualquer sacrifício a que sua economia e sua população sejam submetidas. Crises de estoque têm solução com cancelamentos de ativos e dívidas que só uma depressão à la Fié é capaz de promover.

A alternativa é uma dificílima distribuição de perdas entre os agentes envolvidos - governos, público e bancos -, o que significa dizer que a solução do problema sai da esfera econômica para a política.

É esse o estágio atual da situação: ou é deflagrada uma depressão acompanha de deflação que varra os valores de ativos e dívidas, em um processo que pode ser incontrolável e extremamente doloroso, tal como ameaçou apresentar-se em setembro de 2008; ou uma solução negociada cancela e prolonga os compromissos (e ativos correspondentes), que nunca a regulação financeira deveria ter permitido que fossem formados.

O presente nervosismo dos mercados de valores e as oscilações bruscas das cotações das moedas nada mais são do que reflexo da enorme dúvida sobre os desdobramentos da crise.

No Brasil, os críticos pedem coerência à política econômica, sem se darem conta de que as intensas alternâncias de situações são, antes, próprias do momento vívido pela economia mundial, e não fruto de autônomas decisões dos condutores da economia que a elas reagem.

Foram corretas as ações no câmbio para conter os excessos de valorização da nossa moeda, em função de movimentos de capitais e antecipações anteriormente ao agravamento da crise, assim como cada vez mais se revela procedente a medida de redução da taxa de juros pelo Banco Central, que já está sendo seguida por outros países.



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