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Os juros numa conjuntura volátil

Veículo: O Globo
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Antes da reunião do Copom no dia 31 de agosto, quando a taxa básica de juros (Selic) foi cortada em meio ponto percentual, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, participou do encontro anual do Fed, o BC americano, tradicionalmente realizado em Jackson Hole, no Wyoming. Teria voltado pessimista com os cenários traçados a portas fechadas para a economia mundial, justificativa para os juros brasileiros serem logo depois fixados em 12%, para surpresa quase generalizada.

Há pouco, Tombini e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, estiveram em Washington para a reunião anual do Fundo Monetário (FMI) e Banco Mundial (Bird). Consta que o encontro reforçou a preocupação do presidente do BC com o futuro da economia mundial. Logo, com a brasileira. Coincidência ou não, começaram apostas de que no próximo Copom, 18 e 19 de outubro, poderá ser executado um corte ainda mais vigoroso nos juros. O governo está decidido a não repetir o comportamento do BC de Henrique Meirelles, no final de 2008, quando, diante da quebra do Lehman Brothers, teria demorado a afrouxar a política monetária. Preocupação louvável, pois ninguém gosta de juros elevados. A dificuldade é decidir algo numa conjuntura volátil, e cujo acerto ou erro será auferido algum tempo depois. Ontem, por exemplo, os mercados mundiais recuperaram parte das perdas dos últimos dias. Varreu o planeta um sopro de esperança em que os políticos europeus darão sinal verde à ampliação e reformatação do fundo de estabilização criado em 2010. Todos esperam a decisão do Parlamento alemão, amanhã. A chanceler Angela Merkel estaria conseguindo convencê-lo de que a Alemanha e a União Europeia têm um futuro comum. Se a mais forte economia da região participar da nova tentativa de salvamento da Grécia, sem moratória, e der lastro ao reforço do fundo para conter qualquer deterioração da confiança, já baixa, em outros países (Portugal, Espanha etc.), é possível que Tombini tenha de rever as expectativas mais pessimistas. Faz sentido, diante da possibilidade de grave crise mundial — há mesmo o risco do “segundo mergulho” —, ser feita uma política anticíclica monetária (juros) e fiscal (gastos). Mas agora cortam-se os juros antes da confirmação do cenário. Na questão fiscal, em 2008/9, o que se viu foi a expansão perigosa de gastos em custeio, quando deveriam ter sido impulsionados os investimentos, que podem ser contidos na fase de aquecimento. Foi executado o contrário, e parte do choque inflacionário atual deriva do uso excessivo do mecanismo errado.

Por não ter capacidade gerencial de administrar os investimentos, é provável que o governo vá pelo mesmo caminho. Pelo menos até este mês, como mostrou O GLOBO, os investimentos continuavam anêmicos, talvez porque, também mais uma vez, o governo faça ajuste fiscal com eles. Enquanto isso, a precária infraestrutura do país continua a contribuir para manter o Custo Brasil nas nuvens.

Se o controle fiscal já é condição-chave em qualquer conjuntura, no momento em que se decide cortar juros sem a definição segura do que está à frente do mundo, a contenção dos gastos em custeio se torna vital. E neste ponto continua a desconfiança na capacidade de Brasília cumprir a tarefa.



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