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Ulrich Kuhn: ‘O momento mais conturbado já passou’

Veículo: Folha de Blumenau
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Ulrich Kuhn: ‘O momento mais conturbado já passou’
Matéria publicada na edição 459, no dia 03-06-2011
   


(Jean Laurindo)


Maio é tradicionalmente um mês de intensa atividade e exposição para as indústrias têxteis da região de Blumenau. Ano passado, por exemplo, além da fase de plena produção com o início das vendas de inverno, as empresas aproveitavam a oportunidade para expor coleções em encontros como a 11ª Texfair, a 4ª Expofair Fashion e outras feiras do segmento que atraíam visitantes especializados de passagem pela cidade.

Em 2011, porém, com a divisão da maior feira têxtil da América Latina e a retração sentida por algumas empresas em função da alta nos materiais necessários à produção, o mercado experimentou um mês mais calmo do que o habitual. Em entrevista exclusiva à Folha, o presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex), Ulrich Kuhn, lembrou que o cenário atual do setor envolve vários fenômenos e apresentou um prognóstico positivo a partir do próximo semestre.


Folha de Blumenau: Qual a realidade atual enfrentada pelos personagens do mercado têxtil?

Ulrich Kuhn: Primeiramente, depois da recuperação da crise financeira internacional, que teve seus impactos, tivemos a alta do algodão. O quilo da fibra, que custava entre R$ 2 e R$ 2,50, passou a custar R$ 8. Quase quatro vezes mais. Quem tinha potencial de estoque, sentiu os efeitos mais tarde. Mas foi preciso cortar gastos. As empresas não tinham como repassar um aumento nessa proporção aos consumidores. Então não podiam manter o mesmo nível de produção. Diminuíram número de funcionários, ritmo de produção, vendas. Mas eu não gosto da palavra crise. São oscilações naturais de mercado. O ápice desse fenômeno do algodão, uma commodity regulada mundialmente, foi no começo desse ano, quando as empresas mais sentiram.



Folha: E qual é o cenário hoje?

Ulrich: O algodão não apresenta aqueles preços altíssimos de meses atrás. Já se observa uma curva descendente. No Brasil, aliás, esse fenômeno está até mais visível. Mas a indexação do mercado ainda prejudica os resultados. Quer dizer: o algodão hoje está mais barato, mas os produtos que a indústria fabricou foram feitos com aquele algodão na casa dos R$ 8. Só que o revendedor quer redução no preço. Alega que o algodão já baixou. De certa forma, acaba-se criando um espiral de repetição dos prejuízos financeiros. A maior parte dos analistas acredita que o setor vá demorar pelo menos dois anos para se recuperar totalmente. Isso se não houver nenhuma adversidade nesse período. Mas acredito que a partir desse segundo semestre a gente já comece a ver uma movimentação diferente no mercado. O período mais conturbado já passou e agora as empresas devem ter recuperação mais intensa. Com mais liquidez no mercado e com a coleção de verão, os têxteis devem pegar carona nesse crescimento.



Folha: Se o algodão já está numa faixa de preço menor, porque a recuperação deve se estender tanto?

Ulrich: Mesmo com essa redução no preço, é consenso entre os analistas de que o preço não vai voltar àqueles R$ 2. Acima disso, é preciso lembrar que as dificuldades não foram criadas só pela alta nos insumos. Estamos com uma política financeira de reduzir o crescimento. É comum no Brasil. Quando se tem o conjunto de fatores propícios para o crescimento, coloca-se o pé no freio. Carga inflacionária alta, impostos, diminuição de crédito disponível. Há todo um esforço para frear o consumo. Além da própria população, que parece estar mais receosa na hora de comprar. Outro fator importante foi a chegada tardia do inverno. Não somos grandes produtores de peças pesadas, mas é uma fatia importante. E o comportamento do consumidor é mais ou menos esse: ‘eu compro se der frio. Se não der frio, eu não compro’.



Folha: Tem confecções de menor porte começando a fazer inverno agora...

Ulrich: Claro. Porque até agora não tinha muita saída pra essas peças. Quer dizer, é todo um contexto que contribui para uma movimentação menor. Quer outro agravante? A concorrência das importações. Hoje os produtos de fora do país, sobretudo da Ásia, conseguem competir em preço e qualidade com as indústrias nacionais. O que fazer? Barrar as importações? Não tem como. Somos uma economia aberta. Cabe a nós fortalecer nossos processos industriais, ampliar a infraestrutura para conseguir disputar a confiança do consumidor de igual pra igual. Em outros setores, as exportações brasileiras também levam vantagem sobre outros países e não gostaríamos de sofrer sanções nesses lugares.



Folha: Então o senhor vê com naturalidade a concorrência do mercado chinês, por exemplo, tão criticada por alguns empresários?

Ulrich: Sim. Não dá pra querer impedir, restringir. Há pouco tempo o governo aumentou a alíquota sobre sapatos da Ásia, por causa do alto índice de importação, aquela coisa toda. Em questão de semanas, começou a vir sapato do Uruguai, do Paraguai. Eles vão buscar outro caminho. É melhor voltarmos os esforços à melhoria de nossos processos para ter um mercado equiparado.



Folha: O adiamento da Texfair Fashion se deve a esse momento conturbado do setor?

Ulrich: Não, não. De forma alguma. O que houve foi algo que já prevíamos. Nas últimas edições, já sabíamos que maio não era a data certa. Os próprios expositores falavam isso. E depois da Texfair Home, no início desse ano, percebeu-se que seria mais adequado transferir essa primeira edição. Mas não por dificuldade das empresas, nada disso. Às vezes, mesmo com um momento de menor produção, as empresas querem expor as coleções, gerar negócios. O adiamento da Texfair foi algo pontual nesse processo. Acredito que vai ser um evento de muito sucesso no próximo ano.



Folha: A divisão das feiras também foi um fenômeno independente disso, então?

Ulrich: Sim, certamente. A divisão foi por uma questão estrutural. A cidade não comportava mais uma feira como a Texfair. Temos dificuldades viárias, hoteleiras... Os visitantes também se queixavam por não conseguir acompanhar todos os expositores. Então fizemos uma divisão, que se mostrou acertada no início desse ano, com o absoluto sucesso da Texfair Home.



Folha: Maio costumava receber movimentação dos têxteis em eventos como Expofair Fashion, Delamip, em Ilhota, além da própria Texfair. A região saiu perdendo em geração de negócios?

Ulrich: Talvez num primeiro momento possamos pensar que estamos com menor movimentação no setor, porque nos outros anos realmente tínhamos esses eventos que funcionavam como satélites da Texfair e estimulavam negócios. A própria Expofair Fashion, praticamente ao lado da Texfair, ajudava a dar essa sensação. Mas isso é temporário. Acredito que na próxima edição da feira, esses encontros setoriais vão voltar ainda com mais força, já que o mercado deve estar recuperado. Não diria que existe uma perda. É algo momentâneo. Com o setor mais forte, essas marcas certamente serão recuperadas. Se todas essas feiras caminharem juntas, a cidade só tem a ganhar.


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