Notícias

O futuro é horizontal

Veículo: O Estado de São Paulo
Seção: Economia
Página:

O futuro é horizontal

Como se sabe, os negócios já foram muito mais verticalizados do que hoje. E há razões para essa evolução. No cenário atual, a especialização exige dois caminhos das empresas: ou relegam suas atividades não estratégicas a parceiros que possuam experiência nessas áreas ou não se preocupam em ter um pé em uma cadeia de fornecimento já livre de monopólio. Exemplos dessa mudança não faltam.

Há 100 anos, empreendedores faziam história explorando o motor a combustão interna. Mais que todos, Henry Ford. Dois fatores caracterizaram seu império. O primeiro foi o sistema de produção em massa. O segundo, a total verticalização da produção. Ford geria florestas e serrarias em Michigan, siderúrgicas para fugir do monopólio de Carnegie, minas de carvão, fundição, trens, locomotivas e navios. Chegou a erguer um colossal complexo seringueiro no Pará, para escapar do monopólio do látex.

Claro, nem a Ford, nem qualquer montadora opera assim hoje. Vale a horizontalização da cadeia de insumos como chapas, vidros, plásticos, motores, câmbio e, em alguns casos, módulos completos. E também de processos como fundição, usinagem, estamparia e injeção plástica. Todos terceirizados nas mãos de fornecedores que fazem cada uma dessas atividades com mais conhecimento, eficiência e escala. O melhor exemplo é a fábrica de caminhões da Volkswagen em Resende, onde os fornecedores se instalaram dentro da linha de produção.

A mesma lógica se aplicou no Brasil. Equivalente ao império Ford, tivemos as Indústrias Matarazzo. Nos tempos de glória, Francisco Matarazzo produzia até as embalagens de seus produtos. Hoje em dia é inconcebível uma empresa de alimentos ou higiene pessoal e doméstica produzir embalagens, já que há outras empresas, competentes e sofisticadas, dedicadas a embalagens de papel, plástico, aço, madeira e alumínio.

Em exemplos mais recentes, na década de 70, a São Paulo Alpargatas fabricava jeans na Mooca, em São Paulo. Comprava o algodão, produzia o fio e o tingia para depois produzir o tecido, cortá-lo e costurá-lo em forma de calças US TOP. Tudo no mesmo prédio. Hoje funciona ali uma faculdade. E a Alpargatas saiu do negócio de jeans. Quem prospera hoje nesse segmento apenas concebe marcas, estilos e modelos, terceirizando o corte e a costura, a partir de uma matéria-prima proveniente do Oriente.

Por fim, existem casos típicos bem atuais: restaurantes corporativos geridos (muito mal) pela própria empresa e depois terceirizados; áreas de expedição com frota de caminhões que se tornam compradoras de logística; e a terceirização de serviços de informática, contabilidade e compras. Todos esses exemplos de horizontalização se justificam, seja pela ótica da especialização, seja pela da alocação eficiente de capital. Em geral, por ambas.

Vale frisar também um caso de inevitável horizontalização. Trata-se da gestão de frotas - um problema nada trivial. Um laboratório farmacêutico e seus representantes, uma empresa de eletricidade e seus técnicos, uma mineradora e seus engenheiros ou uma mera padaria e seu furgão de entregas: as empresas quase sempre se deslocam sobre quatro rodas para funcionar.

Propriedade. No Brasil, apesar do capital mais escasso e de nossa carência de profissionais, os carros têm sido propriedade das empresas, que colocam seu precioso capital depreciando em seus ativos e tentam fazer alguma gestão sobre ele. Cada uma à sua maneira e em geral com pouco conhecimento no assunto.

Há casos por aqui de empresas com mais de mil automóveis em seus ativos, cerca de R$ 30 milhões. E não falo de montadoras e concessionárias. Além de qualquer discussão financeira, há uma questão de foco no negócio. Carro é também uma paixão, um objeto de desejo, vira assunto e perde-se tempo importante com isso. Uma frota de carros gera questões como manutenção, sinistros, fraudes, seguros, gestão do consumo, multas, impostos, documentação, mau uso, direção defensiva, depreciação, revenda, impacto ambiental e monitoramento.

Enfim, uma empresa que não seja do ramo de carros não pode pretender exercer uma boa gestão sobre todos esses fatores. Se fizer, estará desviando os recursos humanos de sua atividade principal. Grandes companhias como Accenture, Leroy Merlin, AES Eletropaulo, Shell, Light, Sky, Grupo Edson Queiroz, entre outras, optaram pela terceirização na gestão de suas frotas. Eis uma área com oportunidade significativa de ganho de produtividade para o ambiente de negócios do País. Diferentemente da Europa, a maior parte da frota corporativa brasileira ainda está estacionada na coluna de ativos de suas empresas.



Compartilhe:

<< Voltar

Nós usamos cookies em nosso site para oferecer a melhor experiência possível. Ao continuar a navegar no site, você concorda com esse uso. Para mais informações sobre como usamos cookies, veja nossa Política de Cookies.

Continuar