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Eleição eleva temor de protecionismo

Veículo: Valor Econômico
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Assis Moreira | De Genebra
04/11/2010

O ambiente de guerra cambial está aumentando seriamente os riscos de mais protecionismo e de fragilizar a já combalida recuperação econômica global. É basicamente a mensagem que a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) deve dar hoje junto com a Organização Mundial do Comércio (OMC), em relatório para os líderes do G-20 que se reúnem na semana que vem em Seul, na Coreia do Sul.

As "intervenções compensatórias" no câmbio criam em definitivo um risco de reações protecionistas, que seriam particularmente devastadoras, disse ontem o diretor-geral da OCDE, Angel Gurria, antecipando a mensagem das organizações internacionais.

O diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, tem alertado por onde passa, e visivelmente em direção de congressistas americanos, que o foco na moeda chinesa não resolve o problema do déficit comercial americano, sinalizando que a dificuldade pode ser mesmo de competitividade mais estrutural.

Na cena comercial, em Genebra, em todo caso, a conquista da Câmara dos Representantes pelos republicanos nos EUA não traz preocupação adicional. Importantes negociadores acham que o tema de comércio tem pouco a ver com as ideologias dos partidos nos EUA, e mais com os lobbies bilionários entrincheirados há décadas em Washington, que financiam as campanhas de parlamentares.

Na situação atual, são os lobbies mais protecionistas que dão o tom no Congresso. A agricultura americana é viciada em subsídios. O setor industrial é cada vez mais ineficaz e não consegue competir com a China, os asiáticos em geral, e nem com o Brasil no setor siderúrgico, por exemplo. A exceção é o setor de serviços.

"A postura dos lobbies é de preservar o mercado americano, ainda mais no contexto atual de pouco dinamismo", afirma um alto negociador.

A administração de Barack Obama deflagrou o plano de duplicar as exportações americanas em cinco anos. E isso só pode ocorrer por duas maneiras. Primeiro, dando mais subsídios, porque não dá para aumentar a eficiência da economia da noite para o dia. E segundo, forçar abertura unilateral dos mercados mais dinâmicos dos emergentes, como o Brasil, um cenário difícil de ocorrer.

Assim, espera-se forte pressão dos EUA, na discussão sobre câmbio no G-20, para se arranjar meios de reduzir seu déficit comercial.

Gurria, da OCDE, deu indicações do que pode estar por vir. Insistiu ontem que a valorização de moedas de países emergentes mais dinâmicos deverá continuar e é uma "condição necessária para o reequilíbrio da economia mundial".

Para o chefe dessa espécie de clube dos países ricos, "os ajustes de taxa de câmbio não deverão, porém, ir muito longe, sob o risco de afetar certos países de maneira desproporcional".

A configuração da atividade econômica mundial e das políticas monetárias favorece um fluxo de capital que aprecia também os preços nos mercados imobiliários e nas bolsas dos países destinatários. E alerta para a possibilidade de uma inversão futura dos fluxos de capitais.

A OCDE insiste que os emergentes mais dinâmicos da Ásia deveriam gastar suas economias, poupanças acumuladas através do comércio, em programas para suas próprias populações, ao invés de acumular títulos e ações dos países ocidentais.

A entidade defende um quadro "eficaz e reforma do sistema monetário internacional, que poderiam se reforçar mutuamente". Esse quadro poderia fornecer instrumentos de ajuste de médio prazo, enquanto a reforma do sistema monetário asseguraria a transição para regimes cambiais "mais flexíveis de maneira coordenada e regulada, evitando uma instabilidade excessiva".

Os dois mecanismos poderiam oferecer também "dispositivos de segurança financeira apropriados contra uma volatilidade inoportuna de fluxos de capitais no nível multilateral e regional, reduzindo por aí a necessidade de medidas estritamente nacionais, como acumulação de reservas excessivas". Para Gurria, esse amplo acordo permitiria a manutenção do crescimento econômico evitando o surgimento de "desequilíbrios exagerados".

Numa ilustração de como os americanos estão tão protecionistas hoje, basta ver que recusam duramente a proposta da Coreia do Sul de aprovar com antecipação, no G-20 da semana que vem, um plano de isenção total de tarifas para as importações dos países mais pobres do mundo.

Washington só aceita isso na Rodada Doha desde que tenha algo em retorno, e mesmo assim excluído 3% das linhas tarifárias, não por coincidência tudo no setor têxtil, reduzindo fortemente a vantagem para os mais pobres.

Mas fontes em Washington veem exageros sobre protecionismo, notando que os republicanos Dave Camp, do Michigan, deverá liderar a Comissão de Ways and Means, e Kevin Brady, do Texas, a subcomissão de comércio, ambos favoráveis à liberalização comercial.



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