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Pacote ou embrulho?

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Roberto Giannetti da Fonseca

 

 

Num evento ocorrido no final de 2009, diante de 200 dos maiores exportadores do País, o presidente Lula declarou em alto e bom som no seu discurso de improviso que em princípios de 2010 promoveria uma série de medidas no sentido de resgatar a combalida competitividade das exportações brasileiras, vitimada principalmente pela carga tributária incidente sobre as exportações, situação que persiste há décadas apesar da declarada imunidade tributária referida na Constituição Brasileira de 1988.

Mesmo duvidando da existência de Papai Noel, chegamos a imaginar que conseguiríamos finalmente convencer as autoridades fazendárias de que tributar as exportações é não apenas uma idiotice econômica, mas também uma violação de preceito constitucional.

Aguardamos confiantes pela promessa do presidente Lula de um conjunto de medidas de estímulo às exportações, mas o que vimos agora anunciado pelo ministro Guido Mantega nos causou grande desaponto. É fato que algumas das medidas anunciadas são positivas, tais como a criação da Agência de Financiamento às Exportações, o Exim Brasil; a exclusão da receita de exportações para enquadramento no Simples; e a criação do mecanismo drawback isenção para insumos nacionais. A decepção ficou por conta da anunciada medida de ressarcimento acelerado dos créditos tributários derivados da atividade exportadora. Trata-se, em primeiro lugar, não de um favor governamental às exportações, mas de um direito líquido e certo de devolução de tributos excedentes recolhidos na cadeia produtiva exportadora, que oneram os custos das exportações, e que se acumulam nas mãos das empresas sem possibilidade de compensação ou de ressarcimento pela Fazenda. Atualmente existe um estoque acumulado pelos exportadores de créditos de PIS/Cofins e de IPI de mais de R$ 10 bilhões, e que demoram em média de quatro a cinco anos para serem ressarcidos.

E o que diz o Ministério da Fazenda nesse anunciado pacote? Nenhuma palavra sequer sobre o pagamento desse monumental estoque de créditos tributários, que equivale a uma apropriação indébita dos recursos financeiros dos exportadores para financiamento sem correção nem juros do caixa do Tesouro Nacional. Ora, para isso existem os instrumentos de dívida pública e o mercado de capitais!!! Essa forma espúria de financiamento público compulsório sobre as exportações brasileiras é um absurdo jurídico e econômico.

Quanto ao fluxo futuro promete-se a devolução automática no prazo de 30 dias de apenas 50% dos créditos tributários acumulados, o que é melhor do que nada, mas permanece a incerteza sobre o prazo e a forma de devolução do saldo remanescente. Tendo por base a presunção de desonestidade dos empresários exportadores, certamente as autoridades fazendárias alegam ser esse limite uma "reserva técnica" de segurança contábil. Ou ainda alegam a dificuldade de controle do sistema de informática da Receita Federal sobre a utilização imediata pelos exportadores de tais créditos tributários. Ambas premissas são falsas, pois a verdadeira intenção parece mesmo ser a utilização desses recursos a custo zero pelo Tesouro por quatro ou cinco anos seguidos. Em seguida limita-se esse "benefício" a empresas exportadoras que tenham pelo menos quatro anos de existência e no mínimo 30% de coeficiente exportador sobre o faturamento dos últimos dois anos. Pretende-se aqui evitar o eventual surgimento de fraudadores de plantão. De fato, sempre existe algum risco de fraude fiscal em qualquer país do mundo. Mas como ficam as empresas exportadoras honestas com três anos ou menos de existência? E aquelas com 29% ou menos de coeficiente de exportação? Pode o governo discriminar através de tratamento tributário diverso entre empresas concorrentes do mesmo setor de atividade sem violar o princípio constitucional de isonomia entre contribuintes? E quanto a exclusão de empresas exportadoras que tiveram nos últimos dois anos 15% ou mais de pedidos de créditos tributários indeferidos pela fiscalização fazendária? Será que os fiscais têm sempre razão e boa-fé? E os empresários estão sempre equivocados ou suspeitos de má-fé? Seria essa a lógica implícita nesse arbitrário filtro empresarial? Por que não aguardar o julgamento do Conselho de Contribuintes ou da Justiça para impor penalidades àqueles que realmente fraudaram a Receita Federal?

Parece que esse pacote foi de fato mais uma tentativa de embrulhar os contribuintes exportadores, uma raça em extinção neste país, que não lhes reconhece direitos e muito menos mérito na geração de renda, divisas externas e emprego.

ECONOMISTA E EMPRESÁRIO. É DIRETOR TITULAR DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS E DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP



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