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Comércio em moeda local pode sair caro, diz OMC

Veículo: O Estado de S. Paulo
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Jamil Chade

A Organização Mundial do Comércio (OMC) teme que a existência de várias moedas nos fluxos de bens internacionais pode encarecer as transações e aumentar as incertezas para exportadores e importadores. O assunto foi tratado em documento distribuído há poucos dias aos governos. Nele, a OMC quebra um de seus dogmas ao tratar do impacto do câmbio no comércio.

Legalmente, a OMC não tem direito de se intrometer nas questões cambiais, ainda que haja a possibilidade de os tribunais da entidade serem usados caso um país esteja prejudicando os demais ao manipular sua moeda. Pascal Lamy, diretor-geral da OMC, insiste que o câmbio deve permanecer como um assunto do Fundo Monetário Internacional (FMI). Nem a China e nem os Estados Unidos querem ver o tema desembarcando na OMC.

Mas, sutilmente, a entidade deu sua opinião sobre o fenômeno de eventuais novas moedas. A avaliação faz parte de um anexo ao seu relatório anual. No documento, a OMC admite que há uma tendência à perda de força do dólar como a principal moeda internacional. Mas ressalta que a erosão de credibilidade e de seu uso não ocorrerá de um dia para o outro e não há perspectiva de uma substituição. Não haveria nenhuma garantia de que a moeda americana vá perder seu papel de moeda internacional.

Já um relatório preparado pelo economista Joseph Stiglitz a pedido da Organizações Unidas (ONU) sugeriu que a prática adotada por Brasil e China ganhe terreno. A recomendação é permitir que os países usem moedas locais para fechar seus contratos de exportação e importação. Dessa forma, evitariam prejuízos com a variação do dólar ou com a falta da moeda americana em algum momento. Para Stiglitz, isso deve fazer parte de uma reforma do sistema financeiro internacional.

Mas o projeto enfrenta grandes problemas. O primeiro é a competitividade. Setores industriais no Brasil temem que os chineses se aproveitem do acordo de comércio na moeda local para incrementar ainda mais suas vendas ao mercado nacional. Nos últimos anos, o Brasil vem adotando uma série de medidas de restrição às importações chinesas.

Outro problema é o impacto que acordos de substituição do dólar teriam para o próprio valor da moeda americana. Os Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) contam com reservas internacionais no valor de US$ 2,7 trilhões. Uma perda de credibilidade do dólar afetaria suas reservas.

Enquanto as análises se proliferam em relação ao futuro do dólar, a realidade é que nunca na história do sistema financeiro a moeda americana sofreu uma queda tão grande como moeda de referência como no segundo trimestre. Dados da Barclays Capital indicam que 63% das novas reservas obtidas por bancos centrais e comerciais foram em euros ou iene. No trimestre, o dólar representou apenas 37% das reservas adquiridas. No fim do anos 90, quando o euro era criado, o dólar sozinho representava 65% das novas reservas.

Em termos de estoque, o dólar ainda é majoritário. Mas nunca a taxa foi tão baixa como agora. A moeda americana representa 62% das reservas de Banco Centrais pelo mundo, calculada em US$ 4,2 trilhões. A taxa é a menor já compilada pelo FMI. No ano 2000, o dólar representava 71% dos estoques de reservas mundiais, de US$ 1,4 trilhão.

A recessão nos Estados Unidos, o déficit americano e a tentativa do banco central americano de inundar mercado com dólares para relançar a economia seriam alguns dos fatores que pesaram para a mudança.


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