Notícias

Novas barreiras ao comércio

Veículo: O Estado de S. Paulo
Seção:
Página:

 
Editorial

Os governos dos Estados Unidos e de outros países do mundo rico não estão dispostos a fixar metas ambientais obrigatórias, na cúpula de Copenhague, mas podem muito bem ampliar o protecionismo em nome de princípios ecológicos. Dos dois lados do Atlântico estão em debate novas barreiras comerciais. Se forem adotadas, o Brasil e outros países emergentes serão prejudicados. O protecionismo ambiental é apenas uma das novas ameaças ao comércio. Restrições baseadas em critérios trabalhistas e de segurança também poderão diminuir ou anular o poder de competição das economias em desenvolvimento, como informou reportagem publicada no Estado nessa segunda-feira.

Fazendeiros, industriais e sindicalistas americanos têm pressionado as autoridades federais, há anos, pela adoção de barreiras baseadas em critérios ambientais. Segundo os lobistas, quem produz nos Estados Unidos tem de seguir padrões ecológicos muito mais severos que aqueles observados no mundo em desenvolvimento. Disso decorre uma ampla diferença de custos, com desvantagem para os americanos, de acordo com o argumento.

A alegação é obviamente discutível, até porque as políticas ambientalistas foram relaxadas, nos Estados Unidos, durante os oito anos de governo de George W. Bush. Além disso, o agronegócio americano continua desfrutando de elevados subsídios, alguns deles mantidos mesmo depois de condenados pela OMC.

Nos EUA, esse tipo de pressão surgiu muito antes de se marcar a reunião de cúpula de Copenhague sobre mudança climática. O projeto em exame no Congresso poderá ser aprovado mesmo sem a fixação de metas obrigatórias nessa reunião. Mas, se houver compromisso com obrigações diferenciadas para países desenvolvidos e em desenvolvimento, os grupos de lobby deverão pressionar mais fortemente em busca de compensações. Um dos projetos em exame no Congresso poderá obrigar os importadores a comprar licenças de emissão de carbono, aumentando seus custos. O efeito será transferido, naturalmente, para os exportadores, encarecendo suas operações.

A ameaça é especialmente grave porque a Rodada Doha de negociações comerciais continua emperrada. Se fosse concluída, parte das barreiras e dos subsídios atualmente em vigor seria eliminada. Além disso, os negociadores ainda poderiam tentar estabelecer alguma disciplina para o uso de barreiras ambientais. Sem o avanço da Rodada, a aprovação das leis em estudo no mundo rico resultará simplesmente em mais entraves num comércio já sujeito a um excesso de distorções.

Segundo cálculo da Fiesp, as barreiras em discussão nos Estados Unidos poderão afetar 15,4% das exportações brasileiras para o mercado americano - algo em torno de US$ 5 bilhões anuais.

O governo brasileiro acertou ao fixar um objetivo de combate ao aquecimento. Isso pode ser politicamente útil, no debate internacional. De toda a forma, a adoção de metas ambientais mais claras e mais severas atende ao interesse brasileiro - se o compromisso for levado a sério em Brasília. Mas é preciso adicionar à discussão sobre o aquecimento global a questão do protecionismo. O presidente Lula poderia aproveitar a próxima reunião de cúpula para incluir o tema na agenda internacional.

Segurança e direitos sociais podem motivar a adoção de mais barreiras protecionistas, proximamente. A questão da segurança é especialmente importante para os americanos, empenhados no combate ao terrorismo dentro e fora de suas fronteiras. Mais perigosa é a pressão, nos países mais avançados, pela implantação de barreiras contra a importação de mercadorias produzidas com trabalho escravo e trabalho infantil. A legislação trabalhista no Brasil é mais minuciosa que a de muitos países desenvolvidos, mas é preciso avançar no combate ao trabalho ilegal. O próprio setor privado tem procurado agir por meio de acordos entre fornecedores e compradores de insumos. O problema é grave, economicamente, porque meia dúzia de bandidos pode prejudicar a imagem de todo o País. Mas é preciso ir além - e não só para atender a exigências internacionais. Aplicar a lei de forma exemplar pode ser muito mais eficiente que as políticas adotadas até agora.



Compartilhe:

<< Voltar

Nós usamos cookies em nosso site para oferecer a melhor experiência possível. Ao continuar a navegar no site, você concorda com esse uso. Para mais informações sobre como usamos cookies, veja nossa Política de Cookies.

Continuar