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Saindo mais cedo da crise

Veículo: Valor Econômico
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Cristiano Romero

O Banco Central (BC) sinalizou que, depois de reduzir a taxa básica de juros (Selic) em cinco pontos percentuais, não há mais espaço para novos cortes no curtíssimo prazo. O BC está de olho no movimento de retomada da economia, que parece estar escapando da crise mundial mais cedo do que a maioria dos países. A boa notícia é que as expectativas de inflação seguem melhorando, o que poderá criar adiante espaço para mais uma rodada de alívio monetário.

O mercado, segundo o último boletim Focus, diminuiu as projeções de inflação para 2009 e 2010 - 4,37% 4,3%, respectivamente. Ambas estão, dessa forma, abaixo da meta oficial perseguida pelo BC - 4,5%. Um possível corte de juros não é automático. Cabe à autoridade monetária avaliar uma série de variáveis para se certificar de que não há, no horizonte previsível, pressão inflacionária se formando.

A Selic vem diminuindo desde 2003. Em alguns momentos, subiu, mas o importante é que a média histórica vem caindo de forma consistente. No governo, avalia-se que a queda ocorrida ao longo do ano, que derrubou a taxa nominal abaixo de dois dígitos, é estrutural, ou seja, veio para ficar.

A história recente mostrou que, antes da crise mundial, a economia brasileira podia crescer em torno de 5%, sem descontrole inflacionário. O que possibilitou elevar o crescimento potencial, que, antes de 2003, estava em torno de 2,5%, 3% ao ano, foi a adoção de uma política econômica amparada no tripé superávit primário-metas para inflação-câmbio flutuante e administrada com austeridade e persistência. Essa política deu previsibilidade aos agentes econômicos, estimulando os empresários a investir.

Nunca é demais lembrar que, no terceiro trimestre de 2008, antes da fase aguda da crise mundial, o Brasil crescia a quase 7% na margem, com a taxa de investimento avançando cerca de 18% ao ano. A crise abortou aquele momento, mas não aleijou o país. Economistas do governo acreditam que o Brasil chegará ao fim do ano crescendo, em termos anualizados, cerca de 4%. E aumentará o ritmo ao longo de 2010. As empresas estão voltando a investir.

Se o momento é alvissareiro, por que tanta preocupação com a valorização do real frente ao dólar? Os críticos alegam que a apreciação do real está matando os exportadores e anunciando desindustrialização - processo que, no mundo real, até agora não aconteceu.

Há uma correlação grande, na economia brasileira, entre câmbio e preços de commodities exportadas. Outras correlações verificadas são entre câmbio e aversão a risco e, a longo prazo, entre câmbio e balanço de pagamentos - se o déficit em conta corrente cresce, o ajuste das contas externas é feito mediante a desvalorização do real. Há relação também entre câmbio e juros, mas tudo indica que ela é baixa no caso brasileiro - ao longo dos últimos anos, como se viu, os juros caíram ao menor patamar da história. No mesmo período, o real apreciou.

Na semana passada, durante reunião do Grupo de Acompanhamento da Crise, no Ministério da Fazenda, empresários de vários setores se queixaram do câmbio, mas, na hora de propor soluções, em vez de falar dos juros, apontaram a necessidade de redução de tributos incidentes sobre as exportações. Jorge Gerdau deu a senha ao defender a adoção de medidas para aumentar a competitividade que não passam nem por juros nem por câmbio. Ele lembrou que o governo aprendeu, na crise, que desonerar funciona.

Meirelles rejeita rótulo contra diretores do BC

Quando assumiu o comando do BC, em janeiro de 2003, Henrique Meirelles encontrou um ambiente carregado, em que os diretores oriundos do mercado - ou da academia - eram acusados de defender interesses da banca privada. Esta é uma acusação recorrente, cujo objetivo é avilanar esses profissionais e, assim, desqualificar o trabalho do BC.

Meirelles fez com que toda a diretoria do BC enviasse carta a um jornal contestando ilações feitas contra os diretores que não eram funcionários de carreira. O ambiente melhorou nos anos seguintes, mas a crítica, fácil e desonesta, reaparece aqui e ali quando o objetivo é atacar a política monetária.

Nos momentos mais tensos de 2003, disseminou-se a ideia de que os diretores da casa têm uma visão profissional e técnica. Mais recentemente, surgiu, dentro do próprio governo, no entanto, a visão de que esses diretores são mais flexíveis do ponto de vista político. Meirelles rejeita com veemência essa caracterização.

Em conversa com amigos, lembrou que, dos oito integrantes da diretoria colegiada do BC, apenas três vieram do mercado. É essa diretoria, com maioria da casa, que é acusada de ser conservadora na condução da política de juros. Se esses funcionários seguissem orientação política, os resultados do Copom seriam outros.

Há quase sete anos no posto, Meirelles pode deixar o BC em março para disputar cargo eletivo. Corre em Brasília que o mais cotado para substituí-lo é um funcionário de carreira (Alexandre Tombini, diretor de Normas). Não há nenhum problema nisso. Em 2003, assim como combateu o preconceito aos diretores do mercado, Meirelles impediu o aparelhamento político BC.

Cristiano Romero é repórter especial e escreve às quartas-feiras.



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