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Supremo define que crédito-prêmio de IPI foi extinto em 1990

Veículo: Jornal Valor Econômico
Seção: Brasil
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Decisão unânime tomada pelo STF representa derrota para empresas exportadoras

Ricardo Lewandowski, relator do caso: proposta de súmula vinculante para que os demais tribunais sigam a posição

As empresas exportadoras sofreram uma derrota brutal, ontem, no Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiu, por unanimidade, que o crédito-prêmio de IPI foi extinto em 5 de outubro de 1990. O julgamento deverá influenciar diretamente na decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que está analisando um possível veto à emenda aprovada pelo Congresso que ampliou esse benefício até 31 de dezembro de 2002.

"A nossa decisão não vincula o presidente da República, mas, evidentemente, nós estabelecemos balizas", afirmou o ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso no STF, após o julgamento. Para o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luis Inácio Adams, o presidente não deve sancionar a emenda, pois "não poderia desrespeitar regra constitucional".

Caso o presidente Lula confirme a expectativa de veto, a Fazenda poderá requerer de volta R$ 50 bilhões que teriam sido utilizados pelas empresas a título de crédito-prêmio, entre 1990 e 2002. Esse valor foi calculado pela Fiesp. Segundo a Receita, se todas as empresas exportadoras tivessem requerido o crédito, a conta, neste período, chegaria a R$ 181 bilhões.

A emenda que ampliou o crédito de IPI foi aprovada dentro da medida provisória que instituiu o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. Por esse motivo, ficou conhecida como uma "emenda contrabando" - que não tem relação com o assunto principal da MP. O texto contou com o apoio da bancada do PT na Câmara e no Senado, mas foi rechaçado pela Fazenda que, logo após a aprovação, na semana passada, passou a anunciar que defenderia o veto junto ao presidente.

A decisão que sepultou o crédito-prêmio após 1990 foi a maior vitória fiscal do governo no STF nos últimos anos. Ela foi tomada num plenário lotado pelos advogados tributaristas mais renomados do Brasil, como André Martins de Andrade e Nabor Bulhões. Ambos fizeram a defesa oral das empresas perante o tribunal, ao lado de Carlos Velloso, ex-ministro da corte. Além deles, estavam no STF os advogados Luiz Carlos Bettiol, Antonio Carlos de Almeida Castro, José Eduardo Alckmin e a tributarista Fernanda Hernandez. "Aqui está todo o PIB da advocacia", resumiu um procurador da Fazenda.

Do outro lado, a defesa do governo ficou a cargo do procurador-adjunto Fabrício Da Soller, que fez uma solitária sustentação oral contra o benefício fiscal. Adams e o advogado-geral da União, ministro José Antonio Dias Toffoli, preferiram deixar a defesa oral com Da Soller, que milita há 15 anos na causa do crédito-prêmio de IPI e é um técnico no assunto. "Sou procurador desde a década de 90 e o crédito-prêmio sempre foi para nós a maior causa em termos de valores", comemorou Da Soller. A estimativa da Receita era de que o crédito poderia gerar rombo de R$ 288 bilhões, caso todas as empresas obtivessem a requisição.

Após o julgamento, o procurador-adjunto recomendou às empresas que ingressem em programas de parcelamento para devolver os créditos de IPI obtidos após 1990. Ele advertiu que as companhias exportadoras que conseguiram o benefício por decisões judiciais terão essas decisões cassadas com base no julgamento de ontem. Com isso, terão 30 dias para pagar os valores, sem a incidência de multa. A alternativa para evitar o pagamento em 30 dias seria renunciar às ações na Justiça e pagar em 180 meses, com a dispensa de juros e multa. "É um parcelamento generosíssimo", diz Da Soller.

Os tributaristas ficaram inconformados com a decisão e ainda acreditam em novos recursos. Bulhões evitou falar sobre a devolução de créditos. Afirmou que possui outros processos que podem ser levados ao STF sobre o assunto na tentativa de reverter ou minimizar os efeitos da derrota.

Porém, será muito difícil o STF mudar o seu entendimento. A decisão foi tomada no julgamento de apenas três recursos propostos por três empresas que queriam utilizar esses créditos equivalentes a 15% do valor exportado. Como o STF decidiu dar repercussão geral a esse julgamento, a decisão nesses recursos será aplicada a todos os casos semelhantes no tribunal. Lewandowski ressaltou ainda que pretende propor que o STF edite súmula vinculante para que todos os tribunais do país sigam a posição do Supremo neste assunto.

Tudo somado, as empresas não apenas perderam o direito ao crédito no STF, como serão acionadas pela Fazenda para devolver o que receberam após 5 de outubro de 1990. Essa data foi estipulada porque o artigo 41 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determinou a revogação, após dois anos da data da promulgação da Constituição, dos incentivos de natureza setorial que não fossem confirmados por lei. Como não houve lei tratando do assunto nos dois anos seguintes a 5 de outubro de 1988 (dia da promulgação da Constituição), o crédito de IPI teria sido extinto após esse período.

Os tributaristas tentaram convencer o STF que o crédito de IPI é um benefício geral a todas as empresas, e não setorial. Mas a tese foi rechaçada por unanimidade. "Esse benefício tem natureza setorial", afirmou o ministro Carlos Ayres Britto. Segundo ele, a "Constituição faz oposição entre setorial, o regional e o nacional em várias passagens". No caso do crédito de IPI, o setor seria o de exportação.

"Não vejo como deixar de concluir que configura típico incentivo fiscal de natureza fiscal visto que influencia as atividades industriais", afirmou Lewandowski. Para o ministro, o crédito de IPI foi instituído "para aperfeiçoar as exportações de produtos manufaturados". Assim, seria setorial, e não geral.

Outros ministros chegaram a ironizar a tese dos tributaristas de que o crédito seria geral. Cezar Peluso disse que o adjetivo setorial "não é palavra ambígua". Marco Aurélio Mello, que costuma votar a favor das empresas, afirmou que "o vocábulo setor não é sinonímia de subsetor" e foi contrário aos tributaristas neste caso. Eros Grau falou que o caso foi um dos "mais simples" que já julgou. "É um mero debate em torno do significado de uma palavra que tem que ser entendida num contexto", resumiu Grau. "É um incentivo que não é regional", disse, ressaltando que a conclusão do STF foi óbvia.


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