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Trajetória preocupa alguns analistas

Veículo: Valor Econômico
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A estratégia de crescimento com déficits mais elevados em conta corrente desagrada vários analistas heterodoxos. Há o temor de que o país repita a experiência de períodos como os anos 90, quando o país teve rombos elevados e sofreu crises cambiais.

O professor Ricardo Carneiro, da Unicamp, acha que um déficit na casa de 1,5% a 2% do PIB é financiável. Já números acima disso - como os 2,9% do PIB previstos pelo Itaú Unibanco já para 2010 - são arriscados. Segundo ele, o país tem de evitar uma valorização excessiva do câmbio, para que as exportações possam crescer a um ritmo mais forte, de modo que o país não incorra em rombos muito elevados nas contas externas. Carneiro acha razoável um dólar entre R$ 2 e R$ 2,20, o que impediria uma rápida piora da conta corrente.

A adoção de algum controle da entrada de capitais de curto prazo seria importante, afirma. A medida evitaria que o país recebesse capitais ariscos, sem afugentar os investimentos produtivos.

Carneiro diz também que, com um setor exportador mais lucrativo, o país teria uma poupança doméstica maior. Segundo ele, é verdade que a grande poupança doméstica chinesa permite ao país crescer com força e com superávits em conta corrente, como dizem analistas como o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore. "A questão é que boa parte dessa poupança é formada pelos lucros retidos das empresas, muitas delas exportadoras."

O professor José Luis Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB), considera improvável que o país tenha em 2010 um déficit em conta corrente de 2,9% do PIB, ou US$ 55,2 bilhões. Para ele, deve haver um aumento do rombo no ano que vem, mas que dificilmente vai superar US$ 35 bilhões. Oreiro acredita que, devido às perspectivas ruins para a economia global, o Brasil não deve crescer mais que 3,5% em 2010. Além disso, ele acha que, se houver um fluxo muito forte de dólares para o Brasil, serão adotadas medidas para impedir uma valorização exagerada do câmbio, como a adoção de controle de capitais ou compras mais fortes da moeda americana pelo BC.

Para ele, um déficit de US$ 35 bilhões no ano que vem não é preocupante porque o país deve receber um volume expressivo de investimentos estrangeiros diretos, suficientes para financiar esse buraco. "A curto e médio prazo, isso não é um problema, porque o Brasil tem mais de US$ 200 bilhões de reservas e é atraente para os capitais externos. Mas não pode ser algo sistemático, que faça o país ter déficits em conta corrente de 3% a 4% do PIB por vários anos."

Segundo ele, tentar crescer com poupança externa não dá certo. Ela leva à valorização excessiva do câmbio, a grandes déficits em conta corrente e ao endividamento externo exagerado, uma combinação que desemboca em crises cambiais, com consequências funestas para a atividade econômica, diz Oreiro. O câmbio valorizado demais, avalia, induz a uma "reprimarização" da pauta exportadora, que tende a se concentrar em commodities. "Para o Brasil crescer mais que o resto do mundo sem incorrer em déficit em conta corrente, é necessário mudar a estrutura produtiva, reindustrializando o país e a pauta exportadora."

Oreiro diz que, "historicamente, o déficit em conta corrente financia o consumo no Brasil, e não o investimento". O desempenho dos últimos anos seria uma exceção. Entre 2006 e 2008, a taxa de investimento cresceu de 16,4% para 19% do PIB, período em que o país passou de um superávit em conta corrente de 1,3% do PIB para um déficit de 1,8% do PIB. Na segunda metade dos anos 90 e começo dos anos 2000, o país teve rombos que chegaram a superar 4% do PIB, mas a taxa de investimento patinou. Dos 18,3% do PIB de 1995, caiu para 15,7% em 1999, ano em que o déficit atingiu 4,3% do PIB. (SL)



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