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Empres?rios reivindicam acesso livre ? Argentina

Veículo: Valor Econômico
Seção: Especial
Página: A16

Descontentes com as dificuldades para aumentar a participação no mercado da Argentina, empresários dos setores de calçados e fabricantes de refrigeradores e máquinas de lavar pressionam os governos brasileiro e argentino para eliminar restrições impostas às exportações para o mercado vizinho. Exportadores e analistas de comércio reconhecem que, apesar das restrições, as vendas têm crescido, e são unânimes em considerar um êxito a iniciativa brasileira de 'comissões de monitoramento de comércio', para eliminar atritos comerciais com parceiros no continente. Apesar disso, dizem que é hora de pedir mais à Argentina. O governo brasileiro tenta um acordo com a Argentina para garantir o livre comércio desses produtos a partir de 2008. Segundo autoridades argentinas, os 'fatores políticos' que envolvem a sucessão presidencial no país vizinho impedem esse compromisso, mas estão previstas novas rodadas de negociações. 'Não estamos dispostos a continuar submetidos a restrições de importação', afirma a coordenadora de comércio exterior da Eletros, Maria Teresa Bustamante, que apresentará essa posição na reunião marcada para hoje, em São Paulo, da comissão de monitoramento de comércio Brasil-Argentina. 'Se não excluírem nossos produtos do regime de licença não-automática de importação, o Brasil não terá como evitar uma denúncia contra a Argentina no tribunal arbitral do Mercosul', anuncia a executiva da Eletros, associação dos produtores de eletroeletrônicos. A insatisfação em relação aos limites impostos pelo governo argentino também será levada à reunião pelos representantes do setor de calçados, outro submetido, desde o ano passado, ao regime de licenças não-automáticas - que permite às alfândegas da Argentina reter lotes de mercadorias vendidos ao país. 'Estamos perdendo um potencial de mercado de 5 milhões de pares anuais', calcula o diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein. 'Estamos já no terceiro ano seguido de contingenciamento das vendas à Argentina, esperamos que seja o último.' Embora não haja um acordo explícito, os argentinos têm monitorado as vendas de calçados de todas as procedências e operado as licenças para manter a participação das vendas do Brasil em 70% a 75% das importações do mercado local. Apesar das queixas, mesmo os setores que se consideram prejudicados pelas restrições argentinas comemoram o êxito das comissões de monitoramento, que acabaram com as 'guerras' movidas na Argentina contra importações brasileiras. Em 2005, a decisão de impor licenças não-automáticas provocou a retenção de mais de 700 mil pares de calçados na fronteira com a Argentina. Em 1999, lembra Klein, as retenções foram ainda maiores, em meio a uma verdadeira guerra comercial com a Argentina - que na época ameaçou até confiscar parte das exportações dos calçadistas. 'Antes era muito conflituoso, foi positiva a experiência das comissões de monitoramento', atesta o executivo da Abicalçados. As negociações na comissão de comércio, comandadas pelo então secretário da Indústria, Miguel Peirano (recém-nomeado ministro da Economia da Argentina) e o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, retiraram da vitrine as disputas comerciais, como a que ficou conhecida como a 'guerra das geladeiras', em que os argentinos bloquearam vendas de eletrodomésticos brasileiros alegando danos aos produtores locais. 'Antes era muito conflituoso, foi positiva a experiência das comissões de monitoramento', atesta o executivo da Abicalçados. As negociações na comissão de comércio, comandadas pelo então secretário da Indústria, Miguel Peirano (recém-nomeado ministro da Economia da Argentina) e o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, retiraram da vitrine as disputas comerciais, como a que ficou conhecida como a 'guerra das geladeiras', em que os argentinos bloquearam vendas de eletrodomésticos brasileiros alegando danos aos produtores locais. 'O diálogo tem sido mantido, graças aos esforços do Ivan Ramalho', atesta Maria Teresa, . 'mas estamos limitados ao nosso desempenho de 2006, enquanto o Chile, o México e a Turquia aumentam a participação no mercado argentino', queixa-se ela. 'A indústria argentina já teve tempo de crescer, se recuperar, investir em equipamentos', afirma. O Brasil ainda é o fornecedor estrangeiro com maior fatia do mercado de eletrodomésticos na Argentina, embora essa participação tenha diminuído - os refrigeradores brasileiros, que já ocuparam metade do mercado argentino, hoje têm cerca de 38%. Um em cada quatro fogões vendidos nas lojas argentinas é fabricado no Brasil, e 28% das máquinas de lavar roupa também são exportações brasileiras. A forte recuperação da economia argentina, que, desde 2004, tem registrado aumento nos investimentos produtivos e deve crescer 7,5% neste ano, de acordo com previsão da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), permitiu aos produtores de calçados brasileiros aumentar em 31% as vendas ao mercado vizinho. As vendas de refrigeradores, apesar do licenciamento compulsório, cresceram 22%. Esse desempenho foi possível, mesmo em condições negativas, graças à grande valorização da moeda brasileira em relação ao dólar e, em menor medida, também na comparação com o peso argentino. 'O licenciamento não-automático é justificado na Argentina como uma maneira de monitorar o crescimento das vendas de fornecedores de países asiáticos, mas restrições às vendas brasileiras não se justificam mais', concorda Ivan Ramalho. O diálogo com os argentinos, que, segundo Ramalho, tornou-se 'excelente' com Miguel Peirano como interlocutor, agora passa por uma fase de incerteza, com a nomeação do secretário para o Ministério de Economia, em substituição a Felicia Miceli, demitida em um escândalo de corrupção. Na reunião de hoje, como chefe da delegação argentina estará a substituta interina de Peirano, Leila Nasser. Em maio, na reunião da comissão de monitoramento, Peirano havia aceitado discutir no encontro de hoje a situação das exportações de calçados e eletrodomésticos brasileiros à Argentina. Ficou claro para os interlocutores brasileiros que a campanha eleitoral no país vizinho impede, porém, um compromisso firme dos argentinos. O ótimo clima de relacionamento entre os dois países é atestado pelo diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Carlos Cavalcanti, para quem Brasil e Argentina vivem uma 'quase lua de mel', com a redução das tensões, facilitada, segundo acredita ele, pela boa conjuntura econômica do país vizinho. 'Países com volume alto de comércio sempre terão atrito', comenta, para justificar o 'quase'. Com outros países, alguns conflitos têm sido resolvido tão rapidamente que nem chegam a ter divulgação, afirma o executivo.

Comissões de monitoramento ajudam a amenizar atritos entre Brasil e parceiros

Criadas no auge da crise comercial entre Brasil e Argentina, as comissões de monitoramento bilateral de comércio entre o Brasil e seus parceiros no continente conseguiram amenizar os atritos em setores tão distintos quanto o têxtil, o vinícola e o de fabricantes de aerossóis e atraem outros países interessados em aprofundar as relações com o Brasil. A criação de uma comissão de monitoramento Brasil-México é um dos principais pontos incluídos pelos mexicanos na agenda da visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao país, na próxima semana. 'Pensávamos que talvez não fosse necessária uma comissão de monitoramento com o México, mas eles foram os primeiros a sugerir a idéia', revela o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, que coordena as delegações brasileiras nas reuniões das comissões. A comissão, explica Ivan, é uma maneira de contornar eventuais atritos comerciais que possam surgir com o esforço que os governos brasileiros e mexicano pretendem fazer para duplicar a balança comercial bilateral, de pouco mais de US$ 5 bilhões para US$ 10 bilhões anuais, até 2010. Na semana passada, o Paraguai pôde comemorar um resultado das reuniões da comissão que mantém com o Brasil: a Receita Federal, em atendimento a uma antiga queixa paraguaia, informou o envio de um projeto de lei ao Congresso para eliminar a cobrança, sobre caminhoneiros paraguaios, de Imposto de Renda (não cobrado de caminhoneiros brasileiros) nos fretes para o Brasil. Comemoração limitada, já que o Paraguai esperava uma medida provisória, para acabar sem mais demora com a discriminação, contrária às regras da união aduaneira. A medida da Receita, ainda que não atenda integralmente aos pedidos dos paraguaios, é um dos resultados das comissões de monitoramento bilateral, que, apesar das frustrações, são elogiadas pelo governo do Paraguai. No caso do Chile, permitiu esclarecer importadores brasileiros sobre como obter as vantagens tarifárias concedidas aos chilenos (e que vinham sendo negadas por ignorância dos importadores, que estavam preenchendo as guias eletrônicas de importação sem indicar os benefícios a que têm direito). O Brasil, por meio dessas comissões, contornou uma disputa de mercado entre produtores de aerossóis do Brasil e da Argentina, acabou com importações de vinho argentino de baixa qualidade e obteve também compromisso dos argentinos de corrigir o tratamento alfandegário para os tecidos denim, que prejudicava produtores brasileiros em relação a fornecedores de outros países. Além das comissões com a Argentina, Chile e Paraguai, o Brasil tem esse instrumento de negociação com o Uruguai, a Bolívia, o Equador e o Peru. Essas comissões são formadas por representantes de todos os órgãos públicos com influência no comércio exterior, como o BNDES e as agências de fiscalização sanitária. Com a maioria dos países andinos, que exportam pouco ao Brasil, elas têm funcionado principalmente com orientações para cumprimento de requisitos técnicos e entrada no mercado brasileiro. Com as reuniões, o governo brasileiro obtém informações sobre as expectativas dos parceiros com quem o Brasil mantém grandes e constantes superávits comerciais - que podem transformar-se em foco de conflitos se não aumentar a demanda no mercado brasileiro para importações desses países. Os bolivianos, por exemplo, procuram parceiros para investimentos complementares na indústria têxtil, os equatorianos se ressentem do baixo volume de importações por parte do Brasil e sondam possibilidades de financiamento a vendas do país para o Brasil. As comissões registram, até agora, apenas um caso explícito de fracasso: não foram suficientes para impedir que a Argentina abrisse uma disputa contra o Brasil na Organização Mundial de Comércio, contra as barreiras brasileiras à vendas de resinas PET, matéria-prima para garrafas de refrigerantes. Uma das medidas que contribuíram para estreitar as relações entre governos levanta críticas, porém, dos empresários. Os fabricantes de eletroeletrônicos não aceitam a decisão da Receita Federal de criar um sistema simplificado de tributação para os sacoleiros que compram mercadorias no Paraguai. 'Essa medida vai facilitar o contrabando e é o único pesadelo que temos, nesse momento', diz Maria Teresa Bustamante, coordenadora de comércio exterior da Eletros, que representa o setor de eletroeletrônicos brasileiro. 'Talvez a comissão não resolva bem problemas como esse, do Paraguai, mas tem sido um excelente fórum para reduzir conflitos', ressalva ela. A Eletros tem aproveitado a comissão com o Chile para defender a abertura do mercado chileno aos produtos fabricados na Zona Franca de Manaus, atualmente excluídos do acordo de livre comércio do país com o Mercosul.

Superávit com vizinho deve ter redução de US$ 2 bilhões

Em julho, pelo segundo mês seguido, as vendas de produtos do Brasil à Argentina crescerão menos do que as vendas dos argentinos ao mercado brasileiro, o que contribuirá para reduzir ainda mais o grande superávit acumulado pelos brasileiros no comércio com o país vizinho, que chegou a US$ 3,7 bilhões em 2006. Neste ano, à exceção de abril, os superávits comerciais do Brasil com os vizinhos têm sido, mês a mês, repetidamente inferiores aos registrados em 2006, e somaram, no primeiro semestre, um total inferior em US$ 200 milhões aos resultados no mesmo semestre do ano passado. A Argentina deve diminuir o déficit em até US$ 2 bilhões, em 12 meses', prevê o diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp, Carlos Cavalcanti, que comemora o fato. A redução do superávit com a Argentina não se dá com queda nas vendas do Brasil ao país, mas com o aumento das exportações de ambos os parceiros, em um ritmo maior para os argentinos que para os brasileiros, o que, de acordo com avaliação dos técnicos do Ministério do Desenvolvimento, contribui para 'desafogar' as relações comerciais bilaterais. Especialistas que acompanham os resultados do comércio em julho informam que a tendência de redução do superávit e aumento das vendas argentinas se manteve neste mês, embora poucos compartilhem do otimismo do executivo da Fiesp. Extra-oficialmente, acredita-se no governo que o superávit com o país vizinho pode ficar um pouco abaixo de U$ 3 bilhões neste ano. O maior aumento nas vendas do Brasil ao vizinho ocorre entre os produtos da indústria automobilística, como partes e peças, que registraram crescimento de 30% nas vendas do primeiro semestre. A exportação de automóveis aumentou 25%. A alta mais expressiva, em termos relativos, é o das vendas de tubos de ferro ou aço, que aumentaram quase 300% (e saíram de inexpressivos US$ 7 milhões para quase US$ 27 milhões). Dos 13 principais produtos de exportação brasileira à Argentina, com vendas superiores a US$ 80 milhões no primeiro semestre, apenas o minério de ferro teve queda (12%) nas exportações. As vendas de óxidos e hidróxidos de alumínio cresceram 107%, papel kraft e cartão, 46%, e produtos de perfumaria, 27%. O crescimento nas importações de produtos argentinos feitas pelo Brasil é mais impressionante, em termos relativos, porque é concentrado em menos produtos. As importações de automóveis argentinos cresceram notáveis 80% no primeiro semestre, chassis e carrocerias, mais de 240%. Entre os produtos cujas vendas mais aumentaram ao Brasil estão o trigo (72%), fraldas descartáveis (115%), alhos e inseticidas (mais de 60%, ambos ). A farinha de trigo, alvo de queixas dos produtores brasileiros que está sob análise na comissão de monitoramento de comércio, teve o mais espetacular crescimento: mais de 98 mil por cento, de US$ 63 mil para US$ 62 milhões. 'A Argentina voltou a ver a importância do mercado brasileiro para a indústria deles, e é importantíssima como mercado para a indústria brasileira', diz Cavalcanti. Na pauta de vendas brasileiras ao vizinho, 96% são de produtos industrializados. 'Apesar das críticas, o Mercosul é um sucesso comercial', afirma ele.


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