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Pa?s camuflou eleva??o de tarifa

Veículo: Estado de S?o Paulo
Seção: Economia
Página: B5

 
De maneira sinuosa e camuflada, o governo brasileiro pediu ao Mercosul a elevação da Tarifa Externa Comum (TEC) para tecidos, e tapetes, em junho passado, e não apenas para confecções e calçados, como havia sido anunciado à imprensa. O “gato” foi embutido na solicitação formal do Brasil ao Grupo Mercado Comum( GMC),que  se reuniu dia 19 de junho, em Assunção, a pedido da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). Mas, para a opinião pública, o governo alegou que a iniciativa atendia a um pedido da Argentina. Fontes do governo admitiram que convinha, na ocasião, escamotear a iniciativa brasileira. Primeiro, porque indicaria uma tendência protecionista mais ampla do Brasil, no momento em que o País enfrentava uma negociação crucial da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Potsdam, na Alemanha. Depois, o segmento de confecções não estava ainda ciente que o pedido envolveria também o aumento de suas despesas com a importação de tecidos. A questão veio à tona com a divulgação da ata do GMC. Além de revelar a iniciativa do Brasil, o documento deixou claro que a Argentina apoiara o pedido, mas defender a uma tarifa de importação de 26% – mais baixa que a de 30% requerida pela delegação brasileira. Em maio passado, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) anunciou sua aprovação à elevação da TEC de calçados e confecções, de 20% para 35%,como meio de compensar esses setores intensivos em mão-de-obra do impacto negativo da valorização cambial e da forte concorrência asiática. A medida só precisava do aval do Mercosul. Naquele momento, a imprensa foi alertada que a decisão não incluía o restante da cadeia têxtil. Mas, no dia 19 de junho, a Camex aprovou o que informou ser um “pleito do governo argentino” de elevação da TEC para tecidos e tapetes. No mesmo dia, em Assunção, a delegação brasileira já registrava esse pedido como seu no GMC. Fontes argentinas assegurar ama o Estado que em nenhum momento Buenos Aires formulou tal pedido. Nos dias 28 e 29 de junho, durante a reunião de Cúpula do Mercosul, as autoridades argentinas e paraguaias demonstravam nada saber sobre o pedido “argentino” relativo aos tecidos e tapetes ao serem indagadas pela imprensa. Na reunião, o Paraguai e o Uruguai abortaram qualquer decisão naquele momento sobre toda a lista apresentada pelo Brasil – tecidos, tapetes, confecções e calçados. Ao Estado, o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Ivan Ramalho, disse estranhar que, na mesma ata do GMC, a Argentina tenha contrariado a alíquota defendida pelo Brasil e pedido a alteração para 26%. Ramalho afirmou que o pedido argentino havia sido apresentado na última reunião da Comissão Bilateral Brasil-Argentina, nos dias 14 e 15 de junho, e foi prontamente acatado. Representantes da Abit e da Federação das Indústrias Têxteis Argentinas (Tifa) presentes a essa reunião aproveitaram “para trabalhar a lista de produtos”. “O processo é todo brasileiro. Mas atende também ao pedido do setor privado argentino”, assegurou. “O argumento foi que a grande capacidade de produção na Ásia e o volume de suas exportações para o Brasil justificavam a proteção ao setor brasileiro”, completou.
ACERTO
Em sua versão, a Abit reconhece que participou de um “acerto” com a Tifa sobre o assunto, junto com as delegações oficiais dos dois países, em Buenos Aires. Mas, pela primeira vez, o diretor-superintendente da Abit, Fernando Pimentel, admitiu que a entidade pretendia obter a proteção tarifária para toda a cadeia têxtil – dos fios à confecção, passando pela tecelagem. Esse havia sido seu pedido original ao MDIC, em maio, como comprova a lista de bens enviada pela entidade ao ministério na ocasião. “Deixamos claro ao governo que, se não fosse possível aumentar a TEC para toda a cadeia, que pelo menos protegesse o segmento de confecção. Esse era o nosso foco, porque a confecção agrega valor ao produto, é intensiva em mão-de-obra e está submetida a condições desleais de concorrência como importado”, defendeu Pimentel. “Queríamos que a atual escalada de tarifas na cadeia têxtil fosse transferida para um patamar mais elevado”. Principal prejudicada pela medida, caso ela seja aprovada pelo Mercosul, a Associação Brasileira dos Importadores de Matérias-Primas Têxteis (Abitex) disse que não estará sozinha. O segmento de confecção terá custos de produção maiores com a aplicação de tarifas 67% maiores que as atuais sobre os tecidos. Uma parcela significativa dos tecidos importados, sobretudo os sintéticos, não tem similar nacional. “A alíquota de 30% sobre tecidos pode impedir a aquisição de insumos pela confecção brasileira”, afirmou José Marcos Oliveira, presidente da Abitex, que reclamou da falta de abertura do governo no debate sobre a proposta da Abit e enviou um pedido ao ministro Miguel Jorge, do MDIC, para que a medida de proteção não seja aplicada. Com a elevação da atual tarifa de 18% para 30% – ou 26%, como quer a Argentina – a saída para as confecções será o repasse dos custos ao consumidor final, alerta a Abitex.


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